AVALIAÇÃO

Guerra comercial de Trump abala pilares do sistema financeiro, alerta FMI

Conflitos geopolíticos e tensões tarifárias pressionam mercados, enquanto organização pede cautela a bancos e reguladores

Dólar - AFP

A guerra comercial do presidente Donald Trump está ameaçando a estabilidade financeira global que protegeu bancos e seguradoras desde a crise de 2008, alertou o Fundo Monetário Internacional ( FMI), que solicitou aos formuladores de políticas que fortaleçam as defesas de seus setores.

O mundo testemunhou uma forte reprecificação de alguns ativos e maior volatilidade nos mercados de ações, câmbio e títulos em resposta aos recentes anúncios de tarifas, escreveu o FMI, sediado em Washington, em um relatório publicado nesta terça-feira. Mais ajustes podem estar por vir se a perspectiva econômica se deteriorar.

"Os riscos à estabilidade financeira global aumentaram significativamente", disse a organização, alertando que algumas instituições financeiras — especialmente as altamente alavancadas — podem enfrentar pressão.

Para o FMI, um dos principais gatilhos para novas vendas pode ser o "risco geopolítico".

E não faltam riscos. As implicações da guerra comercial de retaliação entre Trump e a China vão muito além dessas duas economias, afetando também países que sofrem com a incerteza sobre suas próprias relações comerciais com os EUA.

O Banco da Inglaterra alertou no início deste mês que o conflito comercial "poderia prejudicar a estabilidade financeira ao frear o crescimento".

Ao mesmo tempo, a invasão russa da Ucrânia continua sem um acordo de paz à vista, e os combates em Gaza também persistem.

Apesar dos alertas contundentes do FMI, não há motivo para pânico, segundo Tobias Adrian, diretor do departamento de Mercados Monetários e de Capitais da instituição.

— É verdade que a magnitude e a velocidade do ajuste do mercado após os anúncios de tarifas em 2 de abril foram bastante abruptas — disse ele em entrevista em Washington. — Mas não foram desordenadas.

Turbulência do mercado
Adrian afirmou que não houve falências institucionais, a economia global não está caminhando para uma recessão, e é importante lembrar que "partimos de um cenário de avaliações bastante esticadas", afirmou.

— Então, de certa forma, isso é mais uma normalização — acrescentou.

Adrian disse que o FMI está analisando se a turbulência do mercado desencadeou um "desenrolar forçado ou desordenado" em uma aposta popular de alta alavancagem conhecida como "basis trade", que busca explorar pequenos desajustes de preço em títulos do governo americano. Segundo ele, provavelmente houve algum grau de "desalavancagem", mas está bastante contido.

— Se as coisas piorarem muito no front das negociações tarifárias, podemos acabar em uma situação preocupante do ponto de vista da estabilidade financeira — disse ele. — Mas também há a possibilidade de que essas tensões sejam resolvidas.

O FMI, que realiza suas reuniões de primavera em Washington esta semana com o Banco Mundial, ainda assim pede vigilância.

"As autoridades devem se preparar para lidar com instabilidade financeira, garantindo que as instituições financeiras estejam prontas para acessar linhas de liquidez dos bancos centrais e estando preparadas para intervir em casos de estresse severo de liquidez ou funcionamento do mercado", escreveram os autores do relatório.

Eles acrescentaram que níveis adequados de capital e liquidez no setor bancário continuam sendo uma âncora para a estabilidade financeira global, considerando especialmente os altos níveis de alavancagem e a crescente interconexão entre bancos e não bancos — um amplo espectro de instituições financeiras que inclui desde seguradoras até fundos de hedge e crédito privado.

Também pediram a implementação completa e oportuna do pacote final de reformas pós-crise, conhecido como Basileia III, acordado em 2017 para proteger o sistema bancário de futuras calamidades.