CINEMA

"Manas", de Marianna Brennand, aborda abuso sexual na Ilha do Marajó de forma sensível e realista

Filme estreia nos cinemas nesta quinta-feira (15), após trajetória de sucesso em festivais

"Manas" - Divulgação

Primeira incursão da diretora Marianna Brennand na ficção, “Manas” estreia nesta quinta-feira (15) nos cinemas brasileiros. Essa é mais uma etapa na bem-sucedida trajetória do filme, que acumula mais de 20 prêmios desde o seu lançamento no Festival de Veneza, em agosto do ano passado, quando conquistou a honraria máxima da mostra Giornate Degli Autori.



“Neste oito meses percorrendo diversos países e muitas cidades brasileiras, nos festivais, pude ter a dimensão de como o filme vem ecoando no coração do público. Com a estreia no circuito comercial, espero que ele possa ser, de fato, um instrumento de transformação”, afirmou a diretora, em entrevista à Folha de Pernambuco.

Exploração sexual
“Manas” trata de um tema urgente e delicado: a exploração sexual infantil na Ilha do Marajó, no Pará. Documentarista experiente, com filmes rodados em Pernambuco, Marianna compreendeu que a única forma de falar sobre o assunto sem submeter as vítimas a uma nova violência seria recorrendo à ficção.


A obra conta a história de Marcielle (Jamilli Correa), uma ribeirinha de 13 anos que vive uma realidade de abusos dentro e fora de casa. Vivendo com o pai, a mãe e três irmãos, ela idealiza a figura da irmã mais velha, que partiu para longe com um homem que conheceu nas balsas que atravessam o rio Tajapuru.

Ficcional
Embora seja uma história fictícia, o drama vivido pela personagem foi inspirado em histórias reais ouvidas durante a pesquisa conduzida por Marianna e sua equipe de roteiristas. Para a diretora, a experiência documental a acompanhou no seu “compromisso em buscar construir uma narrativa respeitosa”.

“Gosto muito de filmes que te dão a sensação de que você está vendo a vida acontecer na sua frente. Busquei essa impressão de que eu estava filmando um documentário, diante da potência das atuações na cena e da naturalidade construída”, apontou a cineasta, que optou por não reproduzir na tela os atos de violência sofridos pelas meninas paraenses.

Trama densa
A veracidade constatada em cena também é fruto do trabalho de atores como Dira Paes, Fátima Macedo, Rômulo Braga, Clébia Souza, Nena Inoue e Rodrigo Garcia, além do elenco infantil montado a partir de testes com centenas de crianças moradoras da Região Metropolitana e de ilhas próximas a Belém. No papel principal, Jamilli Correa surge como grande revelação.

“Foi um mergulho de coragem para o elenco entrar em contato com essas dores e com a escuridão da condição humana. A Jamilli, em especial, é uma força da natureza. Tivemos uma conexão imediata na primeira vez que eu a vi. Ela é muito magnética, tem um rosto cinematográfico e uma densidade que é rara até para um ator mais experiente, mesmo nunca tendo atuado antes. Foi muito especial vê-la desabrochando como atriz na frente das câmeras”, comentou.

Marianna começou a pensar no filme ainda em 2013, quando ficou sabendo da existência de garotas exploradas nas balsas do Marajó. Mais de dez anos depois, os casos viraram alvo de disputas políticas e estopim para a disseminação de notícias falsas nas redes sociais. De maneira sensível e impactante, “Manas” chega para jogar luz em meio à desinformação.

“O filme mostra o que acontece de maneira honesta e com um cuidado ético muito grande. A gente sabe que a exploração sexual e o abuso intrafamiliar é uma questão gravíssima no Marajó, mas que acontece no Brasil inteiro. A potência do ‘Manas’ está em abordar essa realidade sem sensacionalismo, mostrando a sua complexidade, abrindo espaço para o diálogo e para que a gente busque políticas públicas que protejam as crianças naquela região”, defendeu.