Sebastião Salgado: genialidade e olhar único na fotografia
Fotógrafo Sebastião Salgado morreu nesta sexta (23), aos 81 anos
Já no apagar das luzes do mês de maio, um olhar único se despediu do universo da fotografia. Morreu aos 81 anos na última sexta-feira (23), na França, o brasileiro Sebastião Salgado, considerado um dos mais importantes fotógrafos do mundo na atualidade, deixando um legado singular construído durante 50 anos de carreira.
Salgado enfrentava problemas de saúde decorrentes de malária, doença que adquiriu na década de 1990.
Genialidade
Mineiro de Aimorés, formado em Economia, Salgado se notabilizou pela genialidade em retratar, sobretudo em preto e branco, a crueza de populações exploradas, seres humanos vivendo em condições sub-humanas, refugiados, comunidades indígenas à beira do esquecimento, enfim, seu trabalho denunciou as mazelas da sociedade em mais de 40 países e chamou a atenção para a importância da justiça social e da preservação do meio ambiente.
A paixão
Mestre em Economia pela Universidade de São Paulo e doutor pela Universidade de Paris, ele trabalhava na Organização Internacional do Café, em Londres, quando iniciou o desejo de fotografar. Viajava muito a trabalho para a África e Salgado documentava o que via.
Em 1974, fez seu primeiro trabalho como fotógrafo freelancer. Rapidamente se destacou. No final de 1979, Salgado passou a integrar a Magnum, cooperativa que revolucionou a fotografia documental no século 20, fundada por Henri Cartier-Bresson e Robert Capa.
Na década de 1980, o fotógrafo já havia se estabelecido o suficiente para financiar projetos pessoais. No livro "Outras Américas", de 1986, ele registrou povos indígena de toda a América Latina.
Já com a série "Trabalhadores", de 1997, documentou o trabalho manual e penoso de indivíduos ao redor do mundo, de minas de enxofre na Indonésia à pesca de atum na Sicília. Em 1994, Salgado fundou a agência Amazonas Images, dedicada ao seu trabalho.
Sebastião Salgado foi reconhecido com alguns dos principais prêmios mundiais: o Eugene Smith de Fotografia Humanitária, dois Prêmios ICP Infinity de Jornalismo, o Prêmio Erna e Victor Hasselblad e o prêmio de melhor livro de fotografia do ano do Festival Internacional de Arles por Workers, por "Trabalhadores".
Ele morava em Paris com a mulher, Lélia Wanick Salgado, e deixou dois filhos, Juliano, que nasceu em 1974, e Rodrigo, de 1979. Juliano é cineasta e lançou em 2015, ao lado do diretor Wim Wenders, o documentário "O Sal da Terra", que conta a trajetória de seu pai. O longa foi indicado ao Oscar de Melhor Documentário e recebeu o prêmio César, principal premiação do cinema francês.
Em 2024, o fotógrafo havia anunciado sua aposentadoria do trabalho de campo em entrevista ao jornal britânico The Guardian. À época, ele destacou motivos de saúde que o levaram à decisão e afirmou que seguiria com projetos em exposições.
Salgado no Recife
Uma excelente oportunidade para ver de perto o acervo do fotógrafo é a exposição “Gold - Mina de Ouro Serra Pelada", na Caixa Cultural Recife, no Bairro do Recife, em cartaz até o dia 29 de junho, reunindo 54 imagens produzidas na mina de ouro Serra Pelada, localizada em Curionópolis, no estado do Pará.
Na mostra, Salgado retrata a vida dos garimpeiros e a dureza do trabalho, mostrando os trilhos da cratera, a luta contra o cansaço e o êxtase ao encontrar ouro, revelando o cotidiano da mina de onde foram extraídas toneladas de ouro, em mais de uma década de exploração, e a dimensão por trás deste capítulo importante da história nacional.
Uma das imagens da série, a obra "Mina de Ouro de Serra Pelada" foi eleita pelo jornal New York Times como uma das 25 imagens que definem a modernidade. O acesso à mostra é gratuito.
Meio-ambiente
ao lado da esposa
O olhar humanista sobre as mazelas sociais, a exploração do trabalho, o êxodo de populações e a vida dos povos menos privilegiados do planeta, que lhe rendeu prêmios e notoriedade, também esteve atento às questões ambientais e foi responsável por grandes realizações de preservação da natureza.
Sebastião Salgado se dedicou ao desenvolvimento ambiental em projetos para o uso sustentável da terra, que impactaram a qualidade de vida das comunidades locais na Bacia do Rio Doce, que fica entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo.
Fundação Terra
Uma dessas contribuições foi a fundação, em 1998, de uma organização não-governamental (ONG), o Instituto Terra, ao lado de sua esposa, Lélia.
O projeto promoveu uma grande ação de reflorestamento, que mudou a paisagem da antiga fazenda de seus pais, no município de Aimorés, interior de Minas Gerais.
O maior trabalho da ONG foi atuar na recuperação de ecossistemas degradados. Ao todo, 600 hectares da fazenda desmatada e degradada se transformou em uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), após o plantio de dois milhões de mudas de árvores nativas da Mata Atlântica.
Por meio do reflorestamento, as nascentes, a fauna, a flora local e a biodiversidade da fazenda e seu entorno foram recuperadas.
Educação
A Fundação também passou a promover ações educativas e de sensibilização sobre a importância da sustentabilidade, com programas e visitas para apresentar os resultados da recuperação da floresta.
“Estamos perdendo biodiversidade a uma velocidade terrível. Temos que fazer algo porque senão, daqui a alguns dias, vai ser complicado. As plantas não têm polinização porque não têm insetos.
A Alemanha, nos últimos 40 anos, perdeu 70% de sua biodiversidade", disse Salgado à agência de notícias AFP. "É preciso levar a informação. Não é que as pessoas sejam más, é que falta informação correta e conscientização", opinou o fotógrafo à agência francesa.
Desde 2023, graças aos resultados de suas ações, a Fundação Terra passou a receber investimentos da Alemanha, por meio do Instituto de Crédito para a Reconstrução (KFW).
O engajamento nato nas questões sociais e ambientais, que permeou a sua carreira na fotografia, também se transformou em publicações icônicas e premiadas, como "Terra" e "Êxodos".
Confira publicações notórias de Sebastião Salgado
“Outras Américas” (1986)
“Homem em Pânico" (1986)
"Trabalhadores" (1996)
"Terra" (1997)
"Serra Pelada" (1999)
"Outras Américas" (1999)
"Retratos de Crianças do Êxodo" (2000)
"Êxodos" (2000)
"O Fim do Pólio" (2003)
"Um Incerto Estado de Graça" (2004)
"O Berço da Desigualdade" (2005)
"África" (2007)
"Gênesis" (2013)
"Perfume de Sonho" (2015)