Denúncia

Diretor artístico do Hamburg Ballet deixa cargo após 10 meses por denúncia de bailarinos

Bailarinos acusaram Demis Volpi de criar um "ambiente de trabalho tóxico" durante os meses na companhia, e cinco primeiros bailarinos pediram demissão

Demis Volpi, diretor artístico do Hamburg Ballet - AFP

Apenas 10 meses após assumir o cargo de diretor artístico do Hamburg Ballet, o coreógrafo argentino Demis Volpi deixou a companhia nesta terça-feira, após ser denunciado por bailarinos que o acusam de criar um “ambiente tóxico”.

Ele passou a liderar a casa em 2024, após 51 anos sob a direção de John Neumeier, que transformou o grupo provincial em uma companhia respeitada internacionalmente.

A Hamburg State Opera anunciou em um comunicado que seu conselho e Volpi concordaram em encerrar o contrato com o ballet quatro anos antes do previsto.

O anúncio veio após semanas de crise na companhia, depois que foi revelado que cinco primeiros bailarinos haviam se demitido e que mais da metade do corpo de baile enviou uma carta a um legislador local para reclamar de um “ambiente de trabalho tóxico” sob a direção de Volpi.

No comunicado de terça-feira, Volpi afirmou que “apesar dos esforços intensivos”, não conseguia mais realizar sua visão artística e decidiu deixar o cargo “no interesse de todos os envolvidos”.

Volpi, um coreógrafo argentino que anteriormente liderou o Ballet am Rhein, em Düsseldorf, na Alemanha, não respondeu a pedidos de entrevista, e um porta-voz do Hamburg Ballet disse que não faria mais comentários.

Não está claro, no momento, o que a saída de Volpi significará para a próxima temporada da companhia, que ele anunciou em março e que inclui a estreia de Wonderland, de Alexei Ratmansky, baseado nos romances de Lewis Carroll.

Também não se sabe como a companhia lidará com produções das obras de Volpi. Uma nova versão de Surrogate Cities, de sua autoria, está prevista para estrear em julho. Já Demian, baseado no romance de Hermann Hesse, está programado para dezembro.

A crise no Hamburg Ballet começou no início de maio, quando jornais alemães divulgaram amplamente as queixas dos bailarinos sobre a direção artística sob Volpi, além de acusações de que ele não estava suficientemente presente durante os ensaios.

Alexandr Trusch, um dos bailarinos que se demitiram, disse em entrevista à emissora NDR que tudo o que Neumeier havia construído na companhia corria o risco de “ser jogado pela janela”.

Em entrevista ao jornal Hamburger Abendblatt no mês passado, Volpi rejeitou a ideia de que não passava tempo suficiente no estúdio e se disse surpreso por os bailarinos não terem discutido suas preocupações diretamente com ele.

“O diálogo aberto e a interação respeitosa sempre foram importantes para mim”, afirmou, acrescentando que continuaria “a se dedicar com toda sua força e coração” ao trabalho.

Desde o início, as expectativas para Volpi eram altas. Seu antecessor, Neumeier — um americano que fez carreira na Alemanha desde jovem — dirigiu o ballet por mais de cinco décadas. A companhia era quase inteiramente identificada com sua coreografia e estética, com poucas vozes coreográficas além da dele.

Manuel Brug, crítico de longa data do jornal alemão Die Welt, disse em entrevista que os bailarinos que reclamaram e passaram suas carreiras trabalhando com Neumeier eram “mimados” e estavam acostumados a trabalhar de uma só maneira.

Na primeira temporada, Volpi programou uma grande variedade de obras — de Pina Bausch, Justin Peck, Aszure Barton e William Forsythe, além de seus próprios balés e de Neumeier —, talvez exigindo mais, técnica e estilisticamente, do que os bailarinos estavam acostumados. Brug disse que alguns dançarinos reclamaram das coreografias “abstratas”, apesar de “quase todas as companhias” na Europa apresentarem esse tipo de peça.

Segundo Brug, os acontecimentos prejudicaram a companhia e tornarão difícil atrair um novo líder de destaque. “Quem vai querer vir agora?”, questionou.