Israel parece pronto para atacar o Irã, dizem autoridades dos EUA e da Europa
Medida pode inflamar ainda mais o Oriente Médio
Israel parece estar se preparando para lançar em breve um ataque contra o Irã, segundo autoridades dos Estados Unidos e da Europa ouvidos pelo The Times. A medida pode inflamar ainda mais o Oriente Médio e comprometer, ou ao menos atrasar, os esforços do governo do presidente americano, Donald Trump, para mediar um acordo que impeça Teerã de construir uma bomba nuclear.
A preocupação com um possível ataque israelense e com a perspectiva de retaliação por parte do Irã levou os Estados Unidos, na quarta-feira, a autorizar a retirada de diplomatas do Iraque, além da saída voluntária de familiares de militares americanos do Oriente Médio.
O Departamento de Estado não especificou quantos funcionários serão retirados, mas, segundo a Associated Press, a expectativa é que seja removido de Bagdá o pessoal considerado não essencial.
Ainda não se sabe qual seria a extensão do ataque que Israel estaria planejando. Mas as tensões aumentaram após meses de pressão do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, sobre Trump para que ambos aproveitassem o que Israel vê como um momento de vulnerabilidade do Irã para agir.
Trump já havia rejeitado, meses atrás, um plano de Israel para atacar o Irã, insistindo que queria tentar primeiro um acordo com Teerã que impedisse a produção de combustível nuclear para armamento. Há duas semanas, Trump disse ter advertido Netanyahu contra a realização de qualquer ataque enquanto os EUA estivessem negociando.
Não está claro até que ponto Trump tentou conter Netanyahu desta vez, mas o republicano se mostrou menos otimista nos últimos dias quanto a uma solução diplomática com o Irã. Na semana passada, o líder supremo iraniano rejeitou uma proposta dos EUA que eliminaria gradualmente a capacidade de Teerã de enriquecer urânio em seu próprio território.
A decisão dos EUA de retirar pessoal da região, somada ao alerta do Reino Unido sobre novas ameaças à navegação comercial no Oriente Médio, veio poucas horas após Trump declarar, em um podcast do New York Post divulgado na quarta-feira, que estava se sentindo “menos confiante” quanto às chances de um acordo com o Irã que limitasse sua capacidade de desenvolver armas nucleares.
Negociadores americanos e iranianos planejam se reunir no domingo para mais uma rodada de conversas, embora Trump tenha dito na segunda-feira que a postura adotada por Teerã era “inaceitável”. Até quarta, o enviado de Trump para as negociações, Steve Witkoff, ainda planejava participar das negociações em Omã, disseram autoridades.
Trump conversou por telefone com Netanyahu na segunda-feira, mas a Casa Branca não divulgou detalhes sobre o conteúdo da ligação. No domingo à noite, o presidente havia se reunido em Camp David com sua equipe de segurança nacional. Questionado sobre o motivo da retirada de pessoal americano da região, Trump disse a repórteres na quarta-feira:
— Bem, vocês vão ter que descobrir isso sozinhos.
O alerta britânico veio de uma agência de comércio marítimo que monitora a navegação no Oriente Médio. Ela disse ter sido “informada sobre o aumento das tensões na região que podem levar a uma escalada de atividade militar com impacto direto para os navegadores”. O aviso recomendava que navios comerciais que transitam pelo Golfo Pérsico, o Golfo de Omã e o Estreito de Ormuz adotassem cautela redobrada.
Plano de resposta iraniano
Autoridades militares e do governo iraniano já se reuniram para discutir uma possível resposta a um ataque israelense, segundo uma fonte iraniana.
De acordo com ela, Teerã elaborou um plano que prevê uma contraofensiva imediata, com o lançamento de centenas de mísseis balísticos contra Israel. Em 2024, uma ofensiva semelhante, ligada à guerra em Gaza, causou danos limitados ao Estado judeu, em parte devido à assistência dos EUA na interceptação dos mísseis.
O alarme também foi anunciado publicamente pelo Irã. Em pronunciamento na quarta-feira, o ministro da Defesa iraniano, general Aziz Nasirzadeh, afirmou que, caso as conversas com os EUA fracassem e um conflito militar seja imposto ao país, Teerã atacará diretamente bases americanas instaladas em nações vizinhas.
— Alguns representantes do outro lado ameaçam com conflito caso as negociações não tenham sucesso. Se o conflito nos for imposto, as baixas do inimigo certamente serão maiores que as nossas, e nesse caso os EUA terão de deixar a região. Todas as bases dos EUA estão ao nosso alcance e as atacaremos sem hesitação nos países anfitriões — disse Nasirzadeh.
Autoridades iranianas também reagiram com indignação às declarações do general Michael E. Kurilla, chefe do Comando Central dos Estados Unidos. Na terça-feira, ele afirmou em audiência na Câmara que apresentou a Trump e ao secretário Pete Hegseth “uma ampla gama de opções” para um possível ataque ao Irã. Kurilla deveria voltar a depor nesta quinta no Senado, mas a audiência foi adiada sem explicação.
A missão do Irã na ONU denunciou as declarações do general Kurilla em uma publicação nas redes sociais na quarta-feira como “militarismo”, afirmando que “ameaças de força esmagadora não mudarão os fatos”. A representação também disse que o Irã “não busca uma arma nuclear, e o militarismo dos Estados Unidos apenas alimenta a instabilidade”.
Programa nuclear
As tensões se intensificam justamente na semana de reuniões do conselho de governadores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), sediado em Viena. Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha apresentaram uma resolução que censura o Irã por avançar rapidamente com seu programa nuclear e violar compromissos assumidos no acordo de 2015, firmado também com China e Rússia.
O conselho declarou nesta quinta-feira que o Irã violou suas obrigações de não proliferação proliferação pela primeira vez em quase 20 anos — e anunciou contramedidas. A declaração foi feita enquanto um funcionário iraniano disse à agência Reuters que um “país amigo” o havia alertado sobre um possível ataque israelense.
A censura pode abrir caminho para que o Conselho de Segurança da ONU restabeleça sanções econômicas contra Teerã — as chamadas sanções “automáticas” — que haviam sido suspensas com o acordo de 2015, negociado pelo governo Obama. Trump retirou os EUA do pacto unilateralmente em 2018, medida que, segundo o Irã, lhe deu liberdade para abandonar as restrições ao seu programa atômico.
Os signatários europeus, por sua vez, defendem que o acordo ainda pode ser aplicado mediante a retomada das sanções — enquanto o chanceler iraniano, Abbas Araghchi, declarou nas redes sociais que uma eventual censura “obrigará o Irã a reagir com firmeza”.
O programa nuclear iraniano avançou significativamente desde a saída americana do acordo de 2015. Analistas estimam que o Irã está perto de produzir material suficiente para abastecer até dez ogivas nucleares.
Construir um artefato funcional, se Teerã optar por essa via, pode levar mais alguns meses. Ainda assim, muitos israelenses consideram esse progresso inaceitável e têm ameaçado atacar as instalações iranianas.
Setores do governo de Israel acreditam estar diante de uma oportunidade rara para resolver um problema de décadas. Nos últimos meses, o Estado judeu enfraqueceu fortemente os grupos Hezbollah no Líbano e o Hamas em Gaza — organizações aliadas ao Irã e usadas como elemento de dissuasão. Além disso, bombardeios israelenses no ano passado comprometeram boa parte dos sistemas de defesa aérea iranianos.
Alguns analistas alertam, no entanto, que o Irã já começou a reconstruir esses sistemas, o que torna uma ação militar israelense mais arriscada. Também não está claro se Israel conseguiria impor danos decisivos ao programa nuclear iraniano sem o apoio militar direto dos EUA.
A retaliação do Irã a qualquer ataque israelense será “mais contundente e destrutiva” do que no passado, disse o comandante da Guarda Revolucionária, Hossein Salami, à mídia estatal nesta quinta-feira.
O porta-aviões americano Carl Vinson está há semanas no Mar da Arábia. A embarcação transporta mais de 60 aeronaves, incluindo caças furtivos F-35 de última geração. Segundo a autoridade da Marinha, por ora não há planos de reposicionar o Vinson em resposta à escalada. Os EUA também mantêm dezenas de caças e aviões de ataque estacionados no Oriente Médio. Essas aeronaves foram amplamente utilizadas para defender Israel dos ataques iranianos no ano passado.