Chamas de até 1.500 graus celsius no acidente da Air India dificulta identificação de corpos
Até a noite de domingo, apenas 35 corpos haviam sido entregues às famílias, de um total oficial de 270 mortos entre os que estavam dentro do avião e no solo
A intensidade das chamas do acidente com o voo 171 da Air India tornou a identificação dos restos mortais dos passageiros uma tarefa gigantesca, disseram autoridades médicas indianas neste domingo, enquanto parentes de mais de 200 vítimas esperavam do lado de fora de um necrotério pelo terceiro dia consecutivo.
O Boeing 787-8 Dreamliner transportava 125.000 litros — ou mais de 33.000 galões — de combustível quando caiu na quinta-feira, carga completa para um voo de quase 10 horas partindo de Ahmedabad, na Índia, com destino ao Aeroporto de Gatwick, próximo a Londres.
Altos funcionários da saúde em Ahmedabad disseram a uma delegação visitante no sábado que as primeiras análises indicavam que as temperaturas no local do acidente atingiram 1.500 graus Celsius segundo duas pessoas que participaram da reunião. Tais temperaturas são mais que suficientes para incinerar corpos.
H.P. Sanghvi, diretor do laboratório forense para onde a maioria das amostras de DNA está sendo enviada, disse à imprensa indiana que os danos aos corpos dificultam a coleta e os testes. — Essas altas temperaturas afetam o DNA presente em várias partes do corpo. Esse processo é muito complexo — disse Sanghvi.
Até a noite de domingo, apenas 35 corpos haviam sido entregues às famílias, de um total oficial de 270 mortos — entre os que estavam dentro do avião e no solo.
Oito dos corpos, em sua maioria de pessoas que estavam no campus da escola de medicina onde o avião caiu, foram identificados e liberados na sexta-feira. Outros começaram a ser entregues aos familiares na noite de sábado, quando os primeiros resultados de DNA começaram a chegar.
Entre as vítimas identificadas por testes de DNA até a tarde de domingo estava Vijay Rupani, que foi o principal representante eleito do estado de Gujarat até 2021, segundo Harsh Sanghavi, ministro do Interior do estado, cuja capital é Ahmedabad.
Rajnish Patel, funcionário do Hospital Civil de Ahmedabad, onde a maioria dos corpos está no necrotério, disse que centenas de amostras de DNA coletadas de parentes precisavam ser comparadas uma a uma com os restos mortais armazenados.
Como sinal do estado degradado dos corpos, os restos entregues às famílias no domingo foram liberados sob forte esquema de segurança. Alguns parentes relataram que as autoridades disseram que eles não podiam abrir os caixões, e que deveriam proceder rapidamente com os funerais e cremações.
Um sobrevivente
Apenas um passageiro entre os 242 a bordo sobreviveu, escapando de forma milagrosa. Embora os parentes dos outros 241 já tenham sido oficialmente notificados de que seus entes queridos morreram, o fechamento emocional tem sido dificultado pelo fato de que muitos familiares ainda vagam pelos corredores do necrotério, incertos sobre quando — ou se — poderão receber qualquer resto que possa ser recuperado.
Para as famílias das dezenas de vítimas que foram atingidas no solo, a busca é ainda mais complicada. Elas estão simplesmente listadas como desaparecidas. Entre elas estão Sarla Ben Thakur, de 52 anos, e Adhya, de 2 anos, mãe e filha de Ravi Thakur.
A família ganhava a vida cozinhando e entregando refeições no campus da escola de medicina. Ravi e sua esposa deixavam Adhya e o irmão mais velho, Madhav, de 5 anos, na cozinha com a avó, que fazia a comida. Um pequeno balanço havia sido instalado para Adhya em um canto do espaço de trabalho.
Ravi Thakur, de 32 anos, disse que Madhav havia saído para brincar pouco antes de o avião atingir o prédio, onde estavam sua esposa e filha. Ele não encontrou nenhum vestígio de nenhuma das duas.
— Procurei minha esposa e minha filha por toda parte — em hospitais próximos, delegacias de polícia. Enquanto eu perguntava, alguns médicos me disseram para ir dar minha amostra de DNA. E ontem também registrei um boletim de desaparecimento com a polícia — contou ele. Thakur disse que os médicos lhe disseram que receberia uma ligação caso seu DNA correspondesse a algum dos restos no necrotério.
Também em busca de pistas está a família Patni, que administrava uma barraca de chá no campus médico. Enquanto a mãe, Sitaben Patni, está sendo tratada por ferimentos e queimaduras em um centro de trauma, a família ainda não conseguiu encontrar seu filho Akash, de 14 anos. A irmã de Akash, Kajal, e o irmão, Kalpesh, têm passado seus dias do lado de fora do necrotério.
— Como posso comer, sabendo que meu irmão está lá dentro? Essa é minha casa até que me entreguem meu irmão. Está quente, estamos com fome, mas quero meu irmão — disse Kalpesh.