Líderes avaliam como equivocada estratégia do 'nós contra eles' e preveem prejuízo a outras pautas
Parlamentares de centro e até petistas dizem que é necessário distensionar
Líderes da Câmara e do Senado avaliam que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está caminhando em uma direção equivocada e perigosa ao adotar a narrativa do “nós contra eles”. Eles lembram que um ambiente belicoso pode prejudicar o próprio governo, que ainda precisará do Congresso para aprovação de pautas importantes, como a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, a proposta que pretende cortes benefícios tributárias a empresas e a PEC da Segurança.
O clima de instabilidade entre Planalto e Congresso chegou ao ápice na quarta-feira, quando os parlamentares derrubaram o decreto do governo que aumentava do IOF.
Para as lideranças, ir para o enfrentamento, tanto com a judicialização do decreto do IOF, quanto com narrativas de “elite x pobres” poderia inviabilizar a gestão de Lula, com o trancamento do diálogo e respingando na reeleição petista.
— O governo, infelizmente, vem a cada dia tentando desmoralizar o regime democrático de direito ao não respeitar as decisões do Congresso. (Não dá para) imaginar que uma decisão das duas casas, com maioria superior a quórum de PEC (383 votos), não deve ser respeitada — afirmou o líder Doutor Luizinho (PP-RJ).
Petistas com interlocução maior com partidos de centro compartilham a visão dos líderes de centro e dizem que, se for nessa direção, Lula vai “colecionar derrotas”. Eles afirmam que o governo precisaria, ao contrário de enfrentar, correr atrás de, pelo menos, mais 32 deputados fiéis a base para somar 130 votos garantidos em qualquer matéria na Câmara. Ou seja, partir de um apoio de, ao menos, 25% dos deputados. Na derrota do IOF, apenas 98 deputados permaneceram ao lado de Lula.
Aliados de Lula, que tem um diálogo mais aberto com o Centrão, falam ainda em “desorganização total” na articulação do governo. Além da baixa entrega de emendas, eles pontuam para a necessidade de mudança nos atuais ministros de cada legenda que ocupam cadeiras na Esplanada. Para eles, os atuais ocupantes não se esforçam para conquistas votos.
— Acho que é a hora do bom senso e do distensionamento dos dois lados, sob pena de imobilizar o país. Dois bicudos não se beijam — disse o líder do PDT, que deixou a base governistas recentemente, Mario Heringer (PDT-MG).
Na sexta-feira, a Câmara dos Deputados incluiu na pauta da próxima semana um requerimento de urgência para um projeto de lei que prevê cortes de benefícios tributários, de autoria do senador Espiridião Amin (PP-SC). O mesmo tema pretende ser enviado pelo governo em nova proposta. A manobra, de acordo com líderes, indica que o Congresso pretende, neste momento, dar preferência a pautas fiscais que sejam se iniciativa parlamentar, e não do governo.
Ao definir pela votação da proposta que derrubou o IOF, parlamentares relataram que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), demonstraram uma irritação com o que consideraram ser uma tentativa do Planalto de empurrar para o Congresso o desgaste com a provável elevação das tarifas de energia.
Líderes contam que a iniciativa partiu, principalmente, de Alcolumbre, que acusou os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa, de serem os organizadores da narrativa anti-Congresso.
Além disso, Motta e Alcolumbre afirmam que integrantes do governo estavam na reunião que definiu a derrubada dos vetos do projeto de energia e concordaram com eles, mostrando uma “hipocrisia” nas críticas.
— O que se viu foi uma resposta do Congresso às medidas do governo e às críticas feitas. É hora de agir com diálogo, com uma negociação madura. Ninguém ganha com um enfrentamento dessa natureza. Não acredito em novas mensagens do tipo, mas a insatisfação ficou demonstrada — disse o senador aliado de Lula, Otto Alencar (PSD-BA).