Disfemia (1)
Questionado, Noel Rosa contou para alguém a origem da letra da música “Gago Apaixonado”, gravada em 1931. Disse que um amigo, gago, estava muito apaixonado e pediu ao compositor uma música para tentar conquistar a amada. Não se sabe se o amigo teve sucesso ou não. Provavelmente a segunda opção é a mais indicada.
Em contrapartida, a música se transformou em sucesso e vem sendo cantada e regravada até hoje. Um dos versos diz:
“Tem tem pe-na deste mo-moribundo
Que que já virou va-va-va-va-ga-gabundo
Só só só só por ter so-so-sofri-frido
Tu tu tu tu tu tu tu tu
Tu tens um co-coração fi-fi-fingido”
Noel Rosa não era gago. Lady Gaga também não é. Aliás, ela se chama Stefani Germanotta. Quem deu o nome “gaga” à cantora foi um produtor, tomando como base a música “Rádio Ga Ga”, gravada pela banda Queen. A seguir, foi acrescentado o Lady. É a versão “oficial”.
Pois bem, a Gaga veio ao Brasil e se apresentou na Praia de Copacabana, Rio, para um público estimado de 2,1 milhões de pessoas (número questionável, quase a população de Manaus, AM) e recebeu investimento de R$ 92 mi, bancados pelo governo (R$ 15mi), prefeitura (R$ 15mi) e mais seis cotas de empresas privadas, que entraram com R$ 62mi. Quanto custou cada ingresso para o público? – Nada, segundo os organizadores. Conversa pra boi dormir. Quem pagou esse “investimento” foi o contribuinte, partindo do princípio de que não existe almoço grátis, independentemente do que andaram divulgando sobre o retorno do que foi investido.
Nada tenho – nem contra nem a favor – em relação à Lady Gaga. O que questiono é que o Brasil anda mal na saúde e na segurança; temos alta taxa de desemprego (é muito maior que o divulgado); falta escola, falta hospital, falta habitação, falta saneamento; faltam investimentos em infraestrutura. A vinda da pop star não contribuirá em nada no desenvolvimento do país e, muito menos, na melhoria do estado de coisas. Enquanto se investe essa fábula num show, o Brasil leva pau no ranking global de qualidade de educação: ficou em penúltimo lugar, entre quarenta países. Os primeiros lugares ficaram com Finlândia, Coréia do Sul e Japão; os últimos com México, Brasil e Indonésia.
Quem acha que há exagero, deve visitar uma comunidade carente em qualquer canto do país e observar as condições de vida dos seus habitantes. Visitar as cidades dos interiores que “sobrevivem” por conta das bolsas e auxílios oficiais. E para quem enganou o povo para justificar os investimentos no show, vou reproduzir o trecho final da música de Noel: - “Tu-tua falsi-si-sidade é pro-profunda/ Tu tu tu tu tu tu tu tu/ Tu vais fi-fi-ficar corcunda!”
Recado para Germanotta: volte sempre. Como turista. Se aceitar o convite, vou levá-la para conhecer Manari, que fica a 400Km da Capital de Pernambuco. O povo de lá (20 mil) vai adorar.
(1) Gagueira