Após invadir a orla do Rio, ressaca continua nesta quarta, mas tende a perder intensidade; veja
Na terça-feira, a força da água chegou a danificar o portão de um dos prédios, arrastou caçambas de lixo e deslocou até carros e equipamentos de ginástica na orla do Leblon
Após empurrar o mar para vias da orla carioca e de outros municípios do litoral fluminense na terça-feira (29), a previsão é que a ressaca continue nesta quarta-feira (30) e perca intensidade a partir de quinta-feira (30). De acordo com a Marinha, o alerta é valido até as 21h de quinta. Com ondas que passaram de quatro metros, a correnteza atingiu as praias da Zona Sul do Rio. Os transtornos e estragos foram maiores no Leblon, na Zona Sul, onde a força da água chegou a danificar o portão de um dos prédios, arrastou caçambas de lixo e deslocou até carros e equipamentos de ginástica à beira-mar, uma cena que não era vista há pelo menos dez anos, segundo especialistas.
Às 15h, a Avenida Delfim Moreira foi interditada e ainda permanecia fechada às 22h, por causa do risco de novas ondas e para que os garis retirassem a areia das pistas.
Quiosques no Leblon tiveram que fechar para evitar perdas maiores. Um dos mais atingidos foi o Pato com Laranja, no Posto 11, que diante do alerta de ressacas emitido pela Marinha sequer abriu ontem. O proprietário, Pedro Tinoco, disse que decidiu se preparar para não ter prejuízos, como aconteceu em 2023.
— Retiramos cadeiras, mesas e guarda-sóis, desarmamos os disjuntores, para evitar curto-circuito e remanejamos o estoque para outras unidades — contou.
Na noite de ontem, 30 garis, com o apoio de pá mecânica e caminhão basculante, ainda trabalhavam na remoção da areia que era devolvida à praia.
A mudança de tempo, também marcada por ventos fortes, levou ao fechamento da Ciclovia Tim Maia, no trecho entre São Conrado e Vidigial, na Avenida Niemeyer, ainda na noite de segunda-feira. A pista continuou bloqueada durante todo o dia de ontem para evitar que ciclistas fossem atingidos por ondas. Um aviso sonoro foi acionado para alertar os usuários. Apenas o trajeto entre o Vidigal e o Leblon, construído nos anos 1990, em que as pistas são mais afastadas do mar, permaneceu liberado ao público.
Segundo a meteorologia, a ressaca foi causada por um ciclone extratropical que atingiu o Rio com a chegada de uma frente fria. Ontem a máxima foi a 27ºC durante a madrugada e a mínima de 12ºC à noite. Hoje os termômetros não passam de 22ºC. Já o alerta de ressaca, emitido pela Marinha, vale até as 21h de amanhã.
— Uma ressaca assim costuma acontecer em um intervalo de cada dez anos. Mas alguns fatores colaboraram para que não fosse tão intensa. Não estamos em período da Lua Nova, quando a maré costuma ser mais alta — avaliou o professor da área de Engenharia Costeira e Oceanográfica da Coppe/UFRJ, Paulo Cesar Rosman.
Rosman descartou que o fenômeno seja reflexo das mudanças climáticas. Ele explicou que o problema é provocado porque Ipanema e Leblon perderam toneladas de areia entre 1940 e 1990. Segundo ele, por estratégias erradas adotadas pelo poder público por décadas que não repunha na orla a areia retirada do canal do Jardim de Alah, para manter aberta a passagem entre o mar e a Lagoa Rodrigo de Freitas.
— A solução exigiria engordar as praias com pelo menos dois milhões de metros cúbicos de areia de um tipo semelhante à que já existe lá para que ficasse na altura do calçadão — acrescentou Rosman.
Para Flávia Lins de Barros, geógrafa marinha e professora do Departamento de Geografia da UFRJ e que produz estudos sobre erosão costeira, cita o aumento dos eventos climáticos extremos, mas diz que os efeitos da ressaca no Leblon são consequência da urbanização.
— Em toda a orla, este fenômeno de ressaca forte provoca o avanço do mar, mas os efeitos são mais sentidos em alguns pontos, como o Leblon, por algumas razões. Uma delas é o fato de que, no Leblon, não temos mais a proteção natural das dunas frontais e restingas. Além disso, nas últimas décadas, os quiosques e até o calçadão avançaram para a faixa de areia. Ou seja, a praia está sendo espremida, tornando a orla mais vulnerável — pontua. — Se não revertermos o tipo de ocupação da orla da cidade, se insistirmos em destruir as restingas e dunas e retirar a proteção natural, o problema tende a se agravar.
Outras áreas atingidas
Outras áreas da orla do Rio foram atingidas. Em Barra de Guaratiba, vídeos compartilhados nas redes sociais mostram as ondas alcançando o calçadão e atingindo de forma violenta quiosques, uma mureta e dois ônibus. De acordo com testemunhas, a força das ondas chegou a deslocar pelo menos um dos coletivos.
Em Niterói, na Praia de Itacoatiara, pelo menos doze pessoas que praticavam canoa havaiana foram arrastadas pela ventania durante manhã e precisaram ser resgatadas pelos bombeiros. Em Maricá, a Defesa Civil interditou o mirante da Galeta da Ponta Negra, devido à intensidade das ondas.