Ao receber homenagem, Moraes diz que populismo extremista gera ataque "jamais visto" à democracia
Ministro do Supremo recebeu honraria do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo; em discurso, ele defendeu autonomia e independência do Poder Judiciário
Um novo tipo de “populismo extremista” tem atacado a democracia de forma “jamais vista", o que exige reações de base, afirmou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira, em evento em São Paulo. Ao tratar dos desafios da democracia brasileira, o ministro disse que a segurança institucional era um dos principais.
— Se, como vimos, as instituições garantiram a democracia desde 1988, é verdade também que a própria democracia vem sendo atacada de forma jamais vista desde a redemocratização do mundo, que é a redemocratização pós-guerra [...]. E se é verdade que vem sendo atacada por um novo populismo extremista, nós não podemos fingir que não há bases que permitam esse discurso antidemocrático florescer — afirmou o ministro do STF, que tem sido alvo de críticas do governo americano e bolsonaristas.
Moraes acrescentou que as instituições deveriam se fortalecer para atacar os problemas de base que permitiram florescer os atuais movimentos extremistas. Em cerca de 40 minutos de discurso, o ministro não citou diretamente os ataques do governo americano de Donald Trump contra ele e as decisões tomadas no Supremo. Mas afirmou que a Constituição de 1988 trouxe autonomia e independência para o Judiciário julgar “sem pressões internas, externas, ou de qualquer tipo".
— Foi uma aposta do legislador constituinte para reequilibrar esse sistema presidencial, que é o nosso regime de governo — afirmou Moraes, destacando que o sistema presidencial brasileiro, e a divisão tripartite de poderes é diferente de outros países do mundo. — Essa independência e autonomia são características fundamentais trazidas pela Constituição e permitiram avanço institucional muito grande para o Brasil.
O ministro defendeu que, apesar de instabilidades políticas, as instituições brasileiras foram capazes de reagir. Ele citou a tentativa de golpe de estado em 8 de janeiro de 2023 como um exemplo. E acrescentou que erros podem acontecer no processo:
— As instituições, elas acabam, obviamente, repetindo os erros dos seres humanos. Exatamente por isso o Judiciário é um órgão planejado para que uns corrijam os erros dos outros. Mas nós podemos realmente comemorar a independência, a autonomia dadas ao Poder Judiciário pela Constituição.
Moraes esteve na capital paulista para participar de evento no Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP), onde recebeu homenagens, como Colar do Mérito da Justiça de Contas. As honrarias reconheceram a atuação “em defesa do estado democrático de direito, da Constituição Federal e das instituições republicanas brasileiras”.
O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), foram convidados a participar da cerimônia, mas não compareceram. Na porta do TCE, sete manifestantes envoltos de bandeiras do Brasil aguardavam o ministro. Um deles segurava uma folha de papel com a mensagem “Fora Moraes”. A segurança no local havia sido reforçada, apesar de não haver expectativa de tumulto.
Durante o evento, o ministro recebeu apoio ao longo de discursos. A vice-diretora da Faculdade de Direito da USP, Ana Elisa Bechara, foi aplaudida ao citar "indevidas intromissões externas que procuram desacreditar a Justiça brasileira".
A homenagem no TCESP acontece uma semana após Moraes decretar a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, o que elevou a pressão sob o Supremo, envolto na crise diplomática inédita entre EUA e Brasil. A reação do governo americano foi quase imediata. No mesmo dia, um órgão ligado ao Departamento do Estado americano condenou a decisão e definiu o ministro como “violador de direitos humanos”.
Na decisão de prisão, Moraes define a imposição de tarifas contra o Brasil por Donald Trump como uma "atentatória à soberania nacional”. Depois de ter o visto americano revogado, em julho, o ministro foi incluído pelo governo americano na lista de sanções da Lei Magnitsky. A medida congela bens e proíbe transações financeiras nos Estados Unidos.
Ao longo da última semana, figuras como o vice-secretário do Departamento de Estado americano, Christopher Landau, voltaram criticar Moraes. Número dois de Marco Rúbio, ele afirmou em uma rede social que o ministro "destruiu a relação historicamente próxima do Brasil com os EUA". O Itamaraty classificou as críticas como um “ataque frontal à soberania brasileira”.
Nos próximos dias, também participarão do seminário do TECSP a ministra do Planejamento, Simone Tebet, e o secretário estadual da Fazenda, Samuel Kinoshita. O Colar do Mérito da Justiça de Contas é concedido ao convidado que realiza a palestra magna, que abre o evento.