Após Kikito em Gramado, Xamã planeja fazer faculdade de cinema e abrir produtora
'Quero continuar atuando, abrir minha produtora', diz rapper após prêmio em seu primeiro filme como ator
“Já era, é incurável.” É como Xamã descreve sua nova e intensa relação com o cinema. Após o sucesso como rapper e trabalhos como ator na novela “ Renascer”, na série “Justiça” e no filme para streaming “Maníaco do parque”, o cantor de hits como “Leão” e “Malvadão 3” faz sua estreia na tela grande no drama de ação “Cinco tipos de medo”, de Bruno Bini. E que estreia: o longa deixou o Festival de Cinema de Gramado, na semana passada, com quatro Kikitos, incluindo melhor filme e melhor ator coadjuvante para Xamã.
— Este prêmio é um marco na minha carreira. Sempre sonhei em fazer cinema. Ia sempre na locadora da tia Ivonete, em Sepetiba (Zona Oeste do Rio). Eu tinha zerado os filmes dela, tinha visto todos, sem rebobinar nenhum (risos). Realizei este sonho de trabalhar com cinema num filme premiado em Gramado, que é nosso Oscar brasileiro, estou muito feliz — comemora Xamã, de 35 anos.
As ruas e a violência urbana
O artista conversou com o Globo sobre a paixão pelo cinema e o novo filme, no qual interpreta o traficante Sapinho. Ao descobrir que sua namorada, a enfermeira Marlene ( Bella Campos), pensa em deixá-lo por uma nova paixão (João Vitor Silva), ele vai atrás de vingança numa trama de muitas reviravoltas. Rui Ricardo Diaz e Bárbara Colen completam o quinteto de personagens centrais.
— Nos meus clipes, sempre tentava roubar alguma coisa de fotografia, pensar um roteiro diferente, num storytelling — diz, reforçando sua ligação com o cinema. — Estava a vida inteira esperando por um personagem grande como o Sapinho, que me deu a oportunidade de falar das ruas, da violência urbana, de algo próximo a minha realidade — conta o artista.
Inspirado no título do filme, Xamã cita o medo como importante motivador:
— Eu gosto do frio na barriga. Subo no palco para sentir aquela adrenalina de montanha-russa. Gosto de sair da minha bolha, da minha zona de conforto. Quando comecei a trabalhar neste filme, ainda não tinha rolado a novela ou os outros projetos, então senti que era o instante em que apresentaria para o mundo o meu trabalho como ator.
Quando começou a trabalhar como ator, ouviu um recorrente e bem-humorado conselho: “Cuidado para não ser picado pelo bichinho do audiovisual, porque depois não tem mais jeito.”
— Quando me falaram isso, eu perguntei: o que está tentando dizer? Mas agora entendo. Já era, é incurável. Quero continuar atuando, quero abrir minha produtora, quero aprender o máximo. Penso em fazer uma faculdade de cinema, pegar as ideias da minha cabeça e colocar no papel — afirma o carioca. — Na música, eu escrevo, gravo amanhã, subo o clipe e de repente você tem um hit. No cinema, você pode ser o Marlon Brando, mas você não faz sozinho. É uma arte em equipe. São apenas dois anos nessa trajetória no audiovisual, mas já estou aprendendo muito. Eu procuro anotar o nome das lentes, a função de cada pessoa, a luz, o equipamento. Em breve, vocês vão ver mais filmes do Xamãzinho na pista.
Xamã se diverte ao contar que até hoje é chamado de Damião nas ruas, por causa do personagem que fez na novela das 21h da TV Globo “Renascer”. Ele observa que muitos fãs nem sabem que ele canta. Aliás, a paixão pela atuação não significa, reforça, um abandono da música:
— Tem sido um grande balé conciliar. Durante a semana, a gente faz as produções audiovisuais e, sexta, sábado e domingo, faz os shows. Fico equilibrando. E pego coisas do cinema para a música e vice-versa, dá sempre certo.
Experiência com Marília
Parceria entre Xamã e Marília Mendonça (1995-2021), “Leão” é o maior hit brasileiro da era das plataformas digitais e a música mais ouvida no Brasil na última década, segundo o Spotify. A faixa foi lançada no álbum “Zodíaco”, de Xamã, em 2020, com um dueto entre ele e Marília. A cantora gostou tanto da música que, em 2021, passou a apresentar uma versão mais próxima do sertanejo, que entrou no álbum póstumo “Decretos reais”, lançado em 2023.
— Fiquei assustado com a notícia (de “Leão” ser a canção mais ouvida da década). É o fator Marília. A potência e a interpretação dela são incríveis. A Marília vestiu a música, não só interpretou. Era uma música meio melancólica e ela virou meio que um brega sertanejo — afirma. — É incrível presenciar tudo isso, mas queria que ela estivesse aqui para ver. Ela era a voz do Brasil e foi um furacão que passou pela nossa vida. Tudo que ela tocava virava ouro.
O músico conta que ficou quase dois anos sem apresentar “Leão” em seus shows após a morte da amiga, em novembro de 2021.
— Voltei a cantar a música no fim de 2023, não conseguia antes. Eu ficava muito emocionado quando cantava, ficava triste, atrapalhava quando ia cantar as outras músicas. Tentava continuar o show animado, mas não tinha como. Só com o tempo eu fui ritualizando isso, me curando aos poucos, para transformar a música numa parada alegre — diz.