AFCP: cooperativismo moderno
A Associação dos Fornecedores de Cana de Pernambuco celebra o sucesso do modelo de gestão implantado a partir da reabertura da antiga Usina Cruangi
A Associação dos Fornecedores de Cana de Pernambuco (AFCP) deu, ainda em 2015, o primeiro passo de uma estratégia fundamental para o fortalecimento do setor sucroenergético após um período de crise acentuada. Por meio de sua cooperativa, a Coaf (Cooperativa do Agronegócio dos Fornecedores de Cana), a entidade reabriu a antiga Usina Cruangi, em Timbaúba, na Zona da Mata Norte, primeira no estado a ser gerida no modelo de cooperativismo.
Anteriormente, a indústria funcionava como negócio familiar e já estava fechada havia três anos, enfrentando sérias dificuldades. Modernizada e reativada com outro nome, a unidade foi transformada em empreendimento coletivo, voltando a ser produtiva e rentável, além de devolver à região postos de trabalho que haviam sido perdidos.
“Quando uma usina fecha, é uma calamidade para aquela cidade onde ela está localizada”, aponta Alexandre Andrade Lima, presidente da AFCP e da Coaf. Ele lembra que, ao saber que a unidade seria reaberta, os moradores da região chegaram a fazer até uma procissão. “No ano passado, celebramos lá a nossa 10ª missa, quando um funcionário pediu para falar, emocionado, agradecendo a todos, pois durante três anos ele e os filhos haviam passado fome naquele lugar e, agora, isso não acontece mais. Essas usinas funcionando trazem distribuição de renda para a região e dignidade para as pessoas”, diz.
Idealizador da cooperativa, Alexandre conta que a proposta enfrentou alguma resistência no início, mas logo provou ser uma saída positiva para os canavieiros. Prova disso é que, na safra passada, a usina apresentou moagem de 880 mil toneladas, superando a safra anterior em 10%. Formado por 700 cooperados, o grupo produz açúcar, etanol e aguardente.
MODELO
Na presidência da AFCP há 16 anos, Alexandre propôs a criação da Coaf no seu primeiro mandato. No começo, a entidade visava comercializar insumos e demais materiais para os canaviais a preços diferenciados, barateando seu valor para o cooperado. Há lojas no Recife, Timbaúba e Bayeux, na Paraíba. Uma nova unidade está sendo preparada em Palmares, na Zona da Mata Sul de Pernambuco, e deve ser inaugurada em breve. Além disso, a cooperativa tem planos de chegar também a Maceió, em Alagoas.
Em Pernambuco, ainda há outras duas usinas administradas por cooperativas de produtores de cana-de-açúcar atualmente. A Usina Estreliana, localizada em Ribeirão, Zona da Mata Sul do Estado, foi arrendada pela Cooperativa Agroindustrial de Fornecedores de Cana (Cooafsul) e voltou a funcionar em 2020, após seis anos sem atividades. No ano passado, a Cooperativa do Vale (CoafVale) assumiu o controle da antiga Usina Pumaty, com sede na cidade de Joaquim Nabuco, também na Mata Sul. Antes disso, a unidade passou 10 anos sendo comandada por outra cooperativa, a Agrocan.
Para Alexandre, que integra o conselho da Organização das Cooperativas do Brasil em Pernambuco (OCB/PE), a região Nordeste ainda pode evoluir muito no que diz respeito à absorção do modelo de gestão no setor sucroalcooleiro. “É algo que ainda precisa ser melhor disseminado e nós temos trabalhado muito nesse sentido, porque não vejo viabilidade econômica na nossa região se não for com o cooperativismo”, declara.
De acordo com o presidente, para que dê certo e gere resultados, o sistema administrativo cooperativista exige apoio mútuo entre os integrantes e aperfeiçoamento constante. “A primeira safra sempre é muito difícil. A gente ainda está se adequando às condições, aprendendo. Como produtores rurais, nós estamos mais acostumados a tratar da parte agrícola e, agora, passamos a ter que cuidar do industrial também. Então, esse processo precisa ser o mais profissionalizado possível”, comenta Alexandre.
CLIMA
A AFCP avalia como positiva a última safra da cana-de-açúcar, mesmo enfrentando o problema da estiagem. Segundo a Associação dos Produtores de Açúcar, Etanol e Bioenergia (NovaBio), a moagem no Norte e Nordeste atingiu 56,96 milhões de toneladas até o final da primeira quinzena de abril. Os dados revelam uma redução de 4,1% em relação ao levantamento feito na mesma data do ano passado, mas não chegam a alarmar os produtores.
“Passamos por um período um pouco seco, dificultando a brotação do canavial, já que é preciso umidade para isso acontecer. Tivemos algumas perdas de socaria - que é a cana quando rebrota -, mas foi uma safra bem remunerada para o nosso fornecedor de cana. Há alguns anos, os preços internacionais do açúcar têm se mantido relativamente bons”, afirma Alexandre, salientando que o valor comercial da matéria-prima depende diretamente do preço final dos produtos vendidos pelas usinas.
O fator climático foi o principal obstáculo enfrentado pelos canavieiros na última safra. A falta de chuvas regulares afetou a produção dos canaviais. A AFCP aponta a necessidade urgente de uma reestruturação hídrica, demandando ao Governo do Estado a aplicação do projeto Águas do Norte, idealizado pelo consultor Gregório Maranhão, que prevê pequenas barragens na Zona da Mata Norte, com o objetivo de acumular água durante o período de maior volume pluviométrico.
“É uma solução que pode dar sustentabilidade hídrica não só aos produtores de cana, mas a toda a população da região. Chove bem na Mata Norte, mas concentrado em um período do ano. Depois, passam meses sem cair um pingo d’água. Isso é muito ruim para a agricultura, de uma forma geral”, observa Alexandre.
TAXAÇÃO
A associação estima que a próxima safra tenha um resultado semelhante à anterior. No entanto, para além da questão hídrica, outra preocupação dos canavieiros tem a ver com o mercado externo. Os produtores temem o impacto da sobretaxa de 50% imposta por Donald Trump aos produtos brasileiros que entram nos Estados Unidos. Com base na Lei nº 9.362, de 1996, as regiões Norte e Nordeste têm prioridade garantida nas cotas de açúcar brasileiro destinadas aos Estados Unidos.
“Da forma que foi colocada pelo governo Trump, não haverá vantagem nenhuma em levar nosso açúcar ao mercado norte-americano. Esperamos que o calor político baixe e que venha a ser consolidada uma negociação”, defende Alexandre.