Governo tenta ter 'armas' contra tarifaço de Trump, mas não vê atuação imediata
Governo Lula também também mira investigação de práticas comerciais do Brasil pelos EUA
Ao autorizar o início de consultas e medidas para aplicar a Lei da Reciprocidade Econômica contra os Estados Unidos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mira não apenas o tarifaço do presidente Donald Trump, que tributou parte das exportações brasileiras em 50%.
Lula também está de olho na investigação de práticas comerciais do Brasil pelos americanos, com base na Seção 301 da Lei de Comércio dos EUA.
O governo brasileiro quer estar preparado para, se necessário, tomar medidas contra os EUA em resposta a eventuais sanções econômico-financeiras justificadas por práticas consideradas ilegais pela Casa Branca.
Não há canal aberto para negociar o tarifaço com os americanos, mas Brasília já enviou a Washington esclarecimentos sobre temas como corrupção, desmatamento, patentes, PIX e até a 25 de março, no processo de investigação em curso.
A elevação de tarifas sobre bens americanos poderia ser um caminho adotado em caráter emergencial, sem ter de esperar o parecer da Câmera de Comércio Exterior (Camex). Contudo, o setor privado brasileiro pede prudência, alarmado com a possibilidade de aumento de alíquotas de importação, o que causaria elevação de custos.
Segundo interlocutores do governo Lula, mais na frente, se o Brasil resolver impor sobretaxas a importados dos EUA, será de forma "pontual de simbólica", para que as indústrias nacionais que dependem de produtos americanos, como peças e insumos, não sejam prejudicadas. Artigos de luxo, como joias, seriam um exemplo.
O mais provável seria cassar patentes e taxar plataformas americanas de streaming, usadas para a exibição de filmes, séries, músicas ou outros conteúdos audiovisuais, entre outros caminhos.
Mas não há qualquer decisão a respeito, pois a Camex terá 30 dias para avaliar se o caso se enquadra ou não na Lei da Reciprocidade antes que sejam aplicadas quaisquer contramedidas.
O governo trabalha com prazos. A investigação dos EUA com base na 301 deve levar um ano. Já o processo de consultas com os americanos pela Lei da Reciprocidade seria concluído em até sete meses. Se houver alguma retaliação dos EUA contra o Brasil, o governo brasileiro precisa de armas para se preparar e, ao mesmo tempo, conquistar legitimidade para reagir.
Hoje, o governo Lula atua em várias frentes. Na primeira tenta, sem sucesso, iniciar uma negociação com os EUA que retire produtos sobretaxados em 50%, como bens de capital, carnes e café. Na segunda, lançou um pacote de medidas para mitigar os efeitos do tarifaço sobre empresas brasileiras.
Outra frente é a busca de novos mercados. Nesta semana, o vice-presidente Geraldo Alckmin e os ministros do Planejamento (Simone Tebet) e da Agricultura (Carlos Fávaro) foram ao México conversar sobre ampliação do comércio e dos investimentos bilaterais. Além disso, existe a expectativa de o Mercosul a União Europeia assinarem um acordo de livre comércio até o fim deste ano e há novas negociações à vista, incluindo Canadá e Emirados Árabes Unidos.
A Lei da Reciprocidade é a frente de batalha mais recente. Paralelamente, o Brasil iniciou um ciclo de consultas na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra o tarifaço. Mas esse processo pode demorar anos para ser concluído.
Os EUA fecharam os canais de negociação com o Brasil sobre o tarifaço. Em 9 de julho último, ao anunciar que iria sobretaxar produtos brasileiros em 50%, Donald Trump citou nominalmente o ex-presidente Jair Bolsonaro. Para o mandatário americano, Bolsonaro está sendo perseguido pelo Judiciário brasileiro e isso tem de parar "imediatamente".
O governo brasileiro se recusa a discutir a situação do ex-presidente, que está em prisão domiciliar e começará a ser julgado, na próxima semana, por tentativa de golpe de Estado. Em represália, a Casa Branca determinou a suspensão de vistos para entrar nos EUA de várias autoridades brasileira, e aplicou sanções econômicas contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.
Na avaliação de integrantes do governo Lula, os EUA poderão retomar os ataques ao Brasil, se Bolsonaro for condenado à prisão. Novas sanções são esperadas.