Gravado no Recife e produzido por Kleber Mendonça: filme "Dormir de Olhos Abertos" entra em cartaz
O longa é produzido por Kleber Mendonça Filho e Emilie Lesclaux
Ao entrar para a história com o primeiro longa não falado em inglês a ganhar um Oscar, o diretor de “Parasita” Bong Joon-ho discursou: “Quando vocês superarem a barreira de um centímetro que são as legendas, vocês serão introduzidos a mais tantos filmes incríveis”.
“Dormir de Olhos Abertos”, filme da diretora alemã Nele Wohlatz, com estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (11), exemplifica perfeitamente o que o cineasta coreano quis dizer. Com diálogos falados em português, mandarim, alemão, espanhol e inglês, sem o auxílio da tradução, poucas pessoas conseguiriam entendê-lo.
A farofa internacional começa quando Lim (Liao Kai Ro) chega no Recife de Taiwan para passar as férias. Um ar-condicionado quebrado faz com que ela entre por acaso na loja onde Fu Ang (Wang Shin-Hong) vende guarda-chuvas. Eles poderiam se tornar amigos, mas a chuva não vem e ele - e sua loja - somem do mapa. Na procura por Fu Ang, ela conhece um grupo de trabalhadores chineses morando nas “Torres Gêmeas”, os edifícios residenciais de luxo Píer Maurício de Nassau e Pier Duarte Coelho, localizados no Cais de Santa Rita, região central da capital pernambucana, e se sente misteriosamente conectada com a história deles.
O enredo passeia pelos personagens capturando o sentimento de não pertencimento deles e suas dificuldades em se adaptar a uma cultura tão diferente. “Às vezes a gente não se entende nem mesmo quando nascemos na mesma língua”, a protagonista admite. E é através dessa dificuldade de se comunicar que a história nos lembra que, às vezes, a forma mais universal de comunicação é o silêncio, que se faz muito presente durante os seus 97 minutos.
Como uma verdadeira Torre de Babel em forma de cinema, o lançamento da Sessão Vitrine Petrobras é dirigido por uma mulher alemã, com atores argentinos, taiwaneses e chineses, e contou com a produção do brasileiro Kleber Mendonça Filho e sua esposa, a francesa Emilie Lesclaux.
“Tudo começou em Viena. Eu estava num jantar de cineastas e na minha frente estava Nele. A gente começou a conversar sobre o filme dela ['Futuro Perfeito'] e eu comentei sobre a comunidade chinesa no Recife, mais especificamente uns trabalhadores chineses que estavam ocupando apartamentos nas Torres Gêmeas. Ela achou incrível, e, um ano depois, veio para cá”, relembra Mendonça, em entrevista exclusiva para a Folha de Pernambuco.
“Além de tudo, tinha uma conexão pessoal porque eu sou estrangeira no Brasil e ela morava na Argentina. Então, a gente se conectou fácil assim. Compartilhando desse sentimento de você já não saber muito bem de qual lugar você pertence depois de um tempo. É um filme com uma percepção estrangeira sobre o Brasil. Isso dá uma visão para o Recife que eu acho que é inédita e muito diferente, a maneira como ela filmou a cidade”, continua Lesclaux.
“É muito inédito numa cidade que, felizmente, tem sido muito filmada, né? Eu cresci numa cidade que não era muito filmada. Cresci vendo mais o Rio de Janeiro e São Paulo do que o Recife nos cinemas. Eu acho muito forte e mexe comigo porque ele [“Dormir de Olhos Abertos”] é um pouco aquela sensação, não sei se você teve essa sensação, mas sabe quando tem um grupo de pessoas que tá falando de você e eles não sabem que você está ouvindo?”, indaga Mendonça.