CRÍTICA

"O Agente Secreto" mistura suspense e sátira política em um filme com potencial para Oscar

Novo filme do recifense Kleber Mendonça Filho teve as primeiras sessões oficiais de pré-estreia no Recife

Wagner moutra em ''O Agente Secreto'' - Cinemascópio/Divulgação

A ótima fase do cinema brasileiro, com a conquista de um Oscar este ano por “Ainda Estou Aqui”, parece estar longe de arrefecer. Assim como a temática da ditadura militar segue sendo o marco central para roteiros de sucesso, como o “O Agente Secreto”, de Kleber Mendonça Filho.

Mas enquanto o longa de Walter Salles ganhou notoriedade internacional falando sobre a ditadura militar brasileira sem exibir explicitamente a violência do regime, o novo trabalho de KMF não hesita em mostrar o outro lado do sistema.

Com première no Festival de Cannes em 18 de maio (onde conquistou quatro prêmios) e estreia oficial nos cinemas brasileiros em 6 de novembro, Mendonça agraciou o Recife com duas sessões de pré-estreia na última quarta-feira (10), no Teatro do Parque e Cinema São Luiz, espaços culturais icônicos da cidade. 

A trama mistura suspense com uma sátira política bem-humorada e conta a história do professor e pesquisador universitário Marcelo (Wagner Moura), que volta para a cidade onde nasceu, o Recife, durante o Carnaval de 1977 para se reunir com seu filho e se refugiar de uma perseguição política.

Mas ele rapidamente descobre que a Capital pernambucana está longe de ser imune aos males do autoritarismo. Maria Fernanda Candido, Gabriel Leone, Alice Carvalho, Udo Kier e Thomas Aquino são alguns dos atores que também integram o elenco. 


Ao longo das 2h40 de filme, é possível encontrar vários temas recorrentes da filmografia do seu criador, como a ode aos cinemas de rua, homenagens ao cinema clássico e, claro, referências à sua cidade natal, Recife.
 
Entre as alusões estão a lenda da perna cabeluda, a La Ursa, o frevo, os ataques de tubarão, Miró de Muribeca, a Praça Chora Menino, entre outros. Inclusive, cenas do longa foram gravadas no parque gráfico da Folha de Pernambuco, por suas características preservadas e pleno funcionamento. 

Apesar de muitas vezes entendido como bairrista, o diretor enaltece a cultura local não apenas por orgulho.
 
Ele vai além e transforma a Cidade em um personagem vivo dentro do enredo e convida o espectador a conhecê-la.
 
Claro que qualquer indivíduo de fora consegue assistir, entender e gostar das suas narrativas, mas ele se recusa a se render a ideia de fazer um filme “para gringo ver”.

Além do Recife, a película traz temas como identidade, trauma, resistência, opressão, folclore e, acima de tudo, sobre memória.
 
O suspense fala sobre como é fácil esquecer de pessoas, acontecimentos e dores, mas, mesmo que o passado não volte mais, ele serve como lição para não deixarmos a história se repetir. 

Oscar
Neste ano, uma produção brasileira ganhou, pela primeira vez, um Oscar da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Mas a estatueta deixou um gosto de quero mais.
 
Assim, as expectativas caíram no colo de Kleber Mendonça Filho. Um cineasta reconhecido mundialmente que, há anos, chega perto de entrar na disputa da premiação mais prestigiada da indústria cinematográfica, mas bate na trave. 

Desta vez, com sua nova obra já na lista de possíveis candidatos para serem considerados como o filme que vai representar o Brasil neste ano, uma pergunta não quer calar: "O Agente Secreto” vai ganhar o Oscar? A resposta é que não importa. 

O longa está além da premiação. Ele representa um país, uma cultura e uma história de resistência que, constantemente, tentam apagar. E, enquanto existirem filmes como esse, jamais serão esquecidos.