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Fraternidade é o nome verdadeiro da paz

Há encontros que vão além da formalidade de um evento acadêmico. São momentos que mexem com a gente e fazem pensar sobre como estamos vivendo juntos, sobre o que precisamos mudar para que haja mais respeito e menos conflito. Foi essa a sensação na conferência do filósofo e teólogo iraniano Dr. Mohammad Ali Shomali, na Universidade Católica de Pernambuco. Ao dizer que “o diálogo é o mínimo, o objetivo é a unidade”, ele deixou claro que não basta tolerar quem pensa diferente. É preciso enxergar no outro a mesma dignidade que a gente exige para nós.

O Dr. Shomali não fala de teoria distante. Ele tem trajetória sólida, formado nos seminários islâmicos de Qom, doutor em Filosofia pela Universidade de Manchester, ex-diretor do Centro Islâmico da Inglaterra e hoje à frente do Risalat International Institute, no Irã. O encontro foi promovido pelo Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife, junto com a Cátedra Chiara Lubich em Fraternidade e Humanismo e o Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Unicap, sob mediação do professor Dr. Gilbraz Aragão, referência no diálogo inter-religioso.

O que o Dr. Shomali disse soou simples, mas foi profundo. Lembrou que no Alcorão Deus pede a Moisés que fale com brandura até mesmo com o faraó. Se até diante da tirania a ordem é falar com calma e respeito, por que não fazemos o mesmo com quem acredita em algo diferente? Relembrou também que Maomé foi criticado por escutar demais e transformou essa crítica em virtude. Para o Dr. Shomali, saber ouvir é liderança. Em tempos de intolerância e redes sociais agressivas, escutar é essencial.

O momento mais marcante foi quando o Dr. Shomali disse que um cristão devoto pode estar mais próximo dele do que um muçulmano que só pensa em dinheiro e poder. Essa frase quebra preconceitos e mostra que a fé verdadeira não é sobre rótulos, mas sobre sinceridade diante de Deus. É aí que pode morar a fraternidade e a sociedade parece não enxergar.

Quando o assunto chegou às guerras atuais, o Dr. Shomali foi direto. Não são guerras religiosas, mas crimes e interesses políticos que usam a religião como desculpa. Citou o Alcorão, quem mata um inocente mata toda a humanidade, quem salva uma vida salva toda a humanidade. Essa é uma lição que atravessa fronteiras. Quem mata em nome de Deus não é religioso, é assassino.

O impacto de um encontro como esse vai além do auditório. Em um Brasil que convive com ataques a terreiros e intolerância contra minorias religiosas, a Unicap mostrou que pode ser espaço de pontes. Esses momentos não são apenas inspiradores. São urgentes. Eles ensinam que o diálogo não é fim em si mesmo, é ponto de partida para viver diferente. Como disse o Dr. Shomali, unidade não é barganha, é competição de amor.

É disso que precisamos. De gestos que provem que o outro não é ameaça, mas parte da mesma humanidade. De encontros em que a diversidade não seja conflito, mas aprendizado. O que aconteceu na Unicap foi um lembrete, só haverá paz se tivermos coragem de ouvir, respeitar e caminhar juntos.



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