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Lula na ONU: quando o fracasso vira orgulho

A 80ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas acontece num mundo cada vez mais tenso em decorrência de guerras, de conflitos econômicos de alta complexidade e do avanço da IA (inteligência artificial).

Foi nesse cenário, em que líderes discutiam guerras, biotecnologia, novas fronteiras do conhecimento e os desafios para a humanidade no tempo da revolução digital, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu apresentar como grande conquista brasileira a saída do país do Mapa da Fome da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura).

Segundo o relatório SOFI (The State of Food Security and Nutrition in the World) 2025, o Brasil caiu abaixo de 2,5% na prevalência média de subalimentação no triênio 2022-2024 e, com isso, saiu do mapa da fome. Lula celebrou com orgulho. Mas o dado precisa ser relativizado.

Mesmo com a saída, ainda há cerca de 5 milhões de brasileiros em fome crônica. E no triênio anterior, o índice de insegurança alimentar grave atingia 3,4% da população. O fato de ser a segunda vez em uma década que o Brasil sai do mapa mostra que o país sequer conseguiu consolidar pequenos avanços.

Mais grave: essa conquista não resulta de aumento de produtividade, inovação ou crescimento sustentado. É, principalmente, fruto de programas de transferência de renda. Políticas necessárias, mas incapazes de oferecer um caminho duradouro para superar a miséria.

Em termos internacionais, o Brasil se encontra no grupo de países que apenas oscilam entre estar ou não no mapa da fome. Está fora do grupo que realmente importa em tempos de IA: as nações que lideram a transformação tecnológica global — Estados Unidos, Alemanha, Japão, Coreia do Sul, Israel, China.

Se Lula quisesse apresentar algo capaz de afastar para sempre o fantasma da fome, deveria ter celebrado a educação. Mas os números dos estudantes brasileiros no PISA (Programme for International Student Assessment) não permitem, pois, mostram uma realidade incômoda e persistente.

O Brasil participa do exame desde 2000. Houve algum progresso inicial até 2009 — cerca de 20 pontos em Leitura e 16 em Matemática. Mas, desde então, a curva estagnou:

Em Leitura, a média brasileira oscilou entre 407 e 413 pontos por mais de uma década, muito abaixo da média da OCDE (cerca de 490).

Em Matemática, variou entre 377 e 389 pontos — e, em 2022, ficou em 379 pontos, com 73% dos estudantes abaixo do nível básico.

Em Ciências, a estagnação é ainda mais clara: o Brasil permaneceu entre 401 e 404 pontos desde 2006, com 55% dos alunos sem alcançar o nível mínimo e apenas 1% em níveis elevados de proficiência.

Em outras palavras: o Brasil não avança há mais de uma década. Enquanto nossos vizinhos latino-americanos, como Chile e Uruguai, conseguiram melhorar gradualmente, permanecemos presos a um patamar baixo que condena gerações à baixa produtividade.

Sem salto educacional, o país continuará dependente de programas sociais para mitigar fome e desigualdade. A emancipação verdadeira exige aprendizado, não apenas transferência de renda.

No mesmo discurso, Lula destacou outra “conquista”: impedir um golpe de Estado. Disse que “há poucos dias, e pela primeira vez em 525 anos de nossa história, um ex-chefe de Estado foi condenado por atentar contra o Estado Democrático de Direito”.

No entanto, o que ele não disse é ainda mais revelador. Desde a redemocratização, em 1985, o Brasil elegeu cinco presidentes. Três foram condenados — dois por corrupção (um deles, o próprio Lula) e um por tentativa de golpe de Estado. Dois sofreram impeachment. Somente, um (Fernando Henrique) nem foi condenado, nem sofreu impeachment. É um legado de instabilidade que não pode ser celebrado, mas que ele preferiu tratar como vitória institucional. É como se estivéssemos de volta aos anos 1960.

O Brasil avança apenas para não retroceder, preso a narrativas populistas de recomposição social que se repetem. Na ONU, enquanto o mundo discute como a IA reconfigura o emprego, a biotecnologia desafia a ética e a ciência molda a geopolítica, Lula mostrou que não está em sintonia com o presente, muito menos com o futuro.

Para uma nação com a potência do Brasil, celebrar, diante do mundo, o mínimo é a mais vexatória forma de fracasso. E deveria envergonhar-nos que, em pleno 2025, o chefe de Estado brasileiro proclame como grande triunfo nacional apenas o fato de o país não passar fome e de manter um regime que se limita a parecer uma democracia.
 


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