opinião

Rio, apoteose do caos

Estarrecido com o episódio no Rio de Janeiro, que dispensa qualquer comentário de cunho civilizatório, percebemos que a chamada “cidade maravilhosa” disputa com “Gaza” o troféu da barbárie global, exportando a pior imagem que se possa imaginar para um país que se diz em processo de desenvolvimento. 

A tragédia carioca com protagonismo de agentes públicos e privados, que se desenrola em acelerada evolução ao longo de mais de cinquenta anos, revela a completa e absoluta incapacidade da gestão governamental, seja no plano Federal ou Estadual para o enfrentamento civilizado de tão complexo problema, que reúne aspectos econômicos, políticos e sociais desde os seus primórdios até o ápice alcançado nos dias de hoje.

Fica evidente, numa análise mais profunda e racional da questão, que na raiz do processo, se misturam com todas as suas consequências, a fome, a miséria, a ausência de educação elementar, o desemprego crônico, a desigualdade social, bem como os confetes e holofotes do poder político, neste ano de COP 30. 

Mais importante do que o fuzil, a metralhadora, as bombas, no enfrentamento da gravíssima situação que se apresenta, é a educação, da infância até no mínimo a adolescência, o emprego cujo provento permita o acesso à alimentação básica, a saúde, a moradia, ao lazer.

Vale lembrar mais uma vez como um detalhe no conjunto da tragédia, o registro da importância do tradicional Setor Sucroalcooleiro no Norte Fluminense, em municípios como Campos, Macaé, Quissamã e outros que já tiveram 22 unidades produtoras de açúcar e etanol, que empregavam direta e indiretamente mais de cem mil trabalhadores, e que hoje está reduzida a apenas três usinas, em virtude da interrupção de projeto de irrigação para suprir o crescente déficit hídrico das últimas décadas na região atingida por forte comprometimento no índice pluviométrico, bem como pela extinção do IAA — Instituto do Açúcar e do Álcool, agência reguladora setorial, e com ele o mecanismo de equalização dos custos de produção, que também vigorava no Nordeste Canavieiro, resultado, parte substancial dessa imensa massa de trabalhadores migrou da baixada Campista para a baixada Fluminense, trocando o trabalho na cana pelo trabalho na droga. 

Durante mais de trinta anos o jogo do bicho gerenciou o delicado e criminoso processo bicho/droga, até a prisão em 1993 dos principais bicheiros cariocas por iniciativa da Juíza Denise Frossard, combatendo a contravenção, desde então a situação agravou-se ainda mais, liderada pelos narcotraficantes e pelas milícias, servindo como um alerta, não apenas para a cidade outrora maravilhosa, como também para todos os quadrantes do país, quando a gestão pública esquece do ocorrido no passado para planejar o futuro incerto que nos aguarda.

O Rio de Janeiro, do Pão de Açúcar, do Cristo Redentor e do Samba, transformou-se com suas virtudes e mazelas num grande laboratório do bem e do mal, a chamar atenção da Nação, que tem se preocupado mais com os movimentos políticos, pontuados pela clássica polarização na queda de braço entre direita e esquerda, do que com a paz social, que a sociedade tanto carece no plano do bem comum, civilizado, apartidário, de todos os credos e cores, doutra forma só nos restará como alvos das balas perdidas, pedir perdão a Deus, rezando contritos pelo milagre da salvação.
 



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