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Djavan lembra prisão por racismo, em "condição humilhante", e conta o que ensinou aos filhos

Cantor e compositor recorda quando a polícia o confundiu com ladrão numa loja de piano

Djavan - Divulgação

Djavan lembrou sua prisão, em 1979, numa loja de piano, em São Paulo. Em entrevista à jornalista Maria Fortuna, no videocast ' Conversa vai, conversa vem', o ar no Youtube do Globo e no Spotify, o cantor e compositor de 76 anos recordou o momento em que a polícia o confundiu com um ladrão numa loja de piano ("me puxaram por aqui (mostra o pescoço), numa condição humilhante, e despejaram minha bolsa no chão").

O artista, que lança o disco 'Improviso, o 26º de sua carreira, também afirma que muito de sua timidez é consequência do preconceito, e lamenta que pouca coisa tenha mudado. Leia trecho da conversa:

Qual a diferença do letramento racial dado a você por sua mãe e o que você passou aos seus filhos?
Minha mãe queria me proteger. Para eu não ser hostilizado, maltratado... Fez o que tinha que fazer. Dizia: "Meu filho, tem que compreender que o negro não pode ir a todos os lugares". Hoje, digo diferente: O negro tem que estar em todos os lugares. Tem que brigar. Porque a vida é de todos. O negro tem direito à vida assim como o branco, o galego, o marrom.

Disse numa entrevista a Bruna Lombardi que a pessoa preta aprende a viver de maneira contida por causa do racismo. Em que medida a sua timidez está ligada a esse fato?
Não sei se está ligado ao fato de eu ser negro, mas acho que sim. Se proteger de uma situação adversa é natural. E acho que não mudou. O negro continua sendo hostilizado, preterido, não é aceito de maneira natural. Para conseguir uma posição, tem que mostrar dupla capacidade, trabalhar, estudar muito mais para chegar no mesmo lugar que o branco chegaria com naturalidade. A sociedade formatou um mundo para o branco. É o branco que governa, que domina as ações do mundo. Eles fizeram esse mundo para eles mesmos. O negro só entra se for muito raçudo, muito foda. Se não for, não tem espaço.

Ter sido preso numa loja de piano ao tentar comprar um instrumento foi o pior episódio de racismo que você sofreu?
Isso foi loucura. Estava ali para comprar um piano elétrico, um Fender Rhodes. E os caras me levaram porque acharam que o negro não podia estar numa loja como aquela para comprar um piano. No mínimo, era para assaltar... Pegaram a mim e o Tadeu (divulgador), nos levaram puxando numa condição humilhante. Pediram a carteira de trabalho, dei a músico, minha categoria.

Acharam ridículo, começaram a rir e disseram: "Vai cantar agora na prisão". Chegaram na Praça da Sé, pegaram nossas bolsas de tricô e despejaram no chão. Começou a juntar gente, alguém me reconheceu, ligaram para a Odeon, minha gravadora, que mandou um advogado. Mas fiquei cinco horas lá dentro, me levaram para a cadeia junto com os marginais ali. Cinco horas! Até chegar um advogado para me tirar.