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Correios tentam levantar R$ 5 bilhões até o fim do ano e enfrentam escalada de juros em empréstimo

Estatal busca recursos para honrar pagamentos até o fim do ano e lida com acréscimo em taxas de compromisso em curso; empresa não comenta

Os Correios registraram um prejuízo de R$ 2,6 bilhões em 2024. - Reprodução/X

Imerso em uma crise financeira, os Correios buscam levantar no mercado ao menos R$ 5 bilhões até o fim do ano para equacionar as contas de 2025, segundo interlocutores da estatal.

A nova estratégia decorre do impasse na busca por um empréstimo de R$ 20 bilhões que vinha sendo negociado, diante dos juros elevados para a captação e da dificuldade em oferecer as garantias pedidas pelos bancos.

Além disso, a empresa já enfrenta problemas para quitar as parcelas de um repasse já contratado anteriormente.

Sem esse reforço de R$ 5 bilhões no caixa até dezembro, de acordo com integrantes da empresa, não haveria condições de arcar com os salários e dívidas relacionadas ao atraso de pagamentos a fornecedores.

A estatal tem mais de 80 mil empregados. Procurada, a companhia não se manifestou.

Enquanto tenta captar mais recursos com o aval da União, os Correios lidam com o pagamento de um empréstimo anterior, de R$ 1,8 bilhão, com o BTG, Citibank e Banco ABC Brasil. Atualmente, a empresa só está quitando o montante relativo a juros. Esse custo aumentou a partir de outubro, de acordo com documentos obtidos pelo Globo. Originalmente, a taxa cobrada era CDI (que se aproxima da Selic) + 3%.

Em outubro, o adicional foi de 4% e, em novembro, de 5%, até que a empresa consiga um aporte da União ou um empréstimo com aval do Tesouro. O Citibank disse que não comentaria. As outras instituições não se manifestaram.

O aumento dos juros ocorreu por conta de um descumprimento contratual em relação ao estoque de precatórios. Por isso, os Correios tiveram de renegociar o acordo, em piores condições.

Um aditivo de R$ 40,5 milhões foi assinado para fazer os ajustes, cujo pagamento deve ser feito em duas parcelas, em 28 de novembro e 28 de dezembro. Os bancos, porém, podem reter os valores na conta garantia do contrato a partir do dia 15 de novembro, sábado.

Outro prejuízo à empresa pelo descumprimento do contrato foi a antecipação do pagamento do valor principal do empréstimo. Antes, seria em junho de 2026.

O contrato, assinado no dia 26 de maio com os bancos BTG Pactual, ABC Brasil e Citibank, previa que se o estoque de precatórios (dívidas judiciais) da empresa, "em qualquer momento", superasse R$ 900 milhões ativaria uma cláusula de "pagamento antecipado mandatório" do valor total do empréstimo, considerando também juros e correção monetária.

No fim do segundo trimestre, a conta de precatórios e Requisições de Pequeno Valor (RPVs) chegou a R$ 2,051 bilhões, o que fez os bancos notificaram a empresa.

O aditivo vale para o segundo e terceiro trimestres. A partir do quarto trimestre, os Correios voltam a ter restrições em relação ao estoque de precatórios, que não poderão ultrapassar R$ 2,5 bilhões "em qualquer momento".

Situação financeira
A empresa registrou um prejuízo acumulado de R$ 4,3 bilhões em 2025. Só no segundo trimestre, entre abril e junho, o resultado negativo atingiu R$ 2,6 bilhões, quase cinco vezes superior ao do período equivalente do ano anterior, de R$ 553,1 milhões.

Na tentativa de recuperar fôlego há uma discussão em andamento sobre um plano de reestruturação com o fechamento de cerca de mil agências e unidades operacionais e programa de desligamento voluntário (PDV). O PDV tem meta de adesão de 6.348 funcionários e de movimentação de outros dez mil trabalhadores para áreas mais críticas. A meta é economizar R$ 830 milhões.

A nova gestão dos Correios faz a aposta na redução dos custos fixos da folha de pagamento composta por cerca de 80 mil empregados, dentre os quais 77 mil estão dedicados para manter as operações concorrenciais e a universalização do atendimento e da distribuição nos 5.570 municípios do país.

Segundo interlocutores do Ministério das Comunicações, já houve várias versões do plano de reestruturação e a final ainda não teria sido apresentada.

Outra possibilidade em avaliação de socorro à estatal seria um fundo imobiliário, desenhado pela Caixa, com os ativos dos Correios — são 2.366 imóveis avaliados em R$ 5,4 bilhões. Segundo técnicos do banco, no entanto, os dados exigidos para estruturar a operação estão demorando a chegar.

Com a crise em curso, a estatal fez no início do mês a primeira troca na diretoria desde a chegada do novo presidente. Deixaram a empresa os executivos Juliana Picoli Agatte, que comandava a área de Governança e Estratégia, Getúlio Marques Ferreira, de Gestão de Pessoas, e Sérgio Kennedy Soares Freitas, que era diretor de Operações.

O executivo Luiz Cláudio Ligabue, que foi diretor de Controles Internos do Banco do Brasil, assumiu o setor de Governança e Estratégia, enquanto José Marcos Gomes, funcionário de carreira dos Correios, foi para a diretoria de Operações. A área de Gestão de Pessoas agora está a cargo de Natália Teles da Mota, ex-diretora executiva da Escola Nacional de Administração Publica (Enap).

Tesouro aponta risco
Além dos Correios, um relatório do Tesouro Nacional apontou risco de o governo aumentar a dívida pública se tiver que fazer aportes para salvar outras oito estatais. O documento identificou dificuldades de Caixa na Infraero, ENBPar e nas Companhias Docas do Ceará, Pará, Bahia, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte.

Segundo o relatório, se essas empresas não conseguirem gerar caixa suficiente, o governo pode ser obrigado a injetar dinheiro público para garantir a continuidade dos serviços — o que aumentaria os gastos e, consequentemente, a dívida pública.

A Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) — que inclui União, estados e municípios — deve chegar a 79% do PIB ao final de 2025. Isso significa que, para cada R$ 100 que o país produz, R$ 79 estarão comprometidos com dívidas do governo. A expectativa é que ela continue crescendo até 84,2% em 2028, com uma leve queda só a partir de 2029.