OPINIÃO

A Saga do Estudante de Direito e o Desafio da Escolha Profissional

Durante muitos anos, escolher um curso superior no Brasil parecia uma decisão relativamente simples. Os caminhos mais tradicionais orbitavam entre três grandes áreas: medicina, engenharia e advocacia, profissões consideradas seguras, com mercado garantido e prestígio social consolidado. Era quase um consenso entre famílias e educadores que, ao seguir por qualquer uma dessas trilhas, o sucesso profissional seria apenas uma questão de tempo, a carreira era muitas vezes definida pela tradição profissional que passava de pais para filhos, numa linhagem sucessória, ou por aquela vocação docente inspiradas nas escolas de formação de professores. No entanto, com o avanço tecnológico e com as mudanças paradigmáticas das propostas pedagógicas da formação curricular e profissional, o cenário atual recebeu novos contornos. 

O mercado de trabalho se diversificou, as exigências mudaram, o perfil do profissional necessitou de adequações, as possibilidades de atuação se multiplicaram e, em alguns casos, paradoxalmente, as vagas no mercado reduziram. No caso específico do curso de Direito, essa transformação é ainda mais evidente. O estudante que hoje se aproxima da conclusão da graduação se vê diante de um verdadeiro labirinto de oportunidades e, ao mesmo tempo, de incertezas. Outrora, os hoje experientes profissionais cursaram Direito com o horizonte bem mais delimitado. As opções mais comuns se concentravam nas carreiras da Advocacia Privada, na Magistratura e no Ministério Público. Era esse o universo mais comentado nos bancos das faculdades, mencionadas nos livros e reforçadas pelos professores como os caminhos “naturais” do bacharel em Direito. 

Hodiernamente, contudo, o panorama é outro. As novas gerações têm acesso a uma quantidade muito maior de informações sobre as diversas possibilidades de atuação jurídica: advocacia privada, advocacia pública, consultoria empresarial, compliance, formas consensuais de resolução de conflitos, como a mediação e a arbitragem, assessoria legislativa e parlamentar, carreiras policiais, defensoria pública, magistratura, ministério público, e até áreas interdisciplinares, como Direito Digital e Proteção de Dados. Esse leque ampliado e, ao mesmo tempo, caracterizador de um privilégio e um desafio. Diante das múltiplas possibilidades, a indecisão é compreensível. Afinal, trata-se de uma escolha que pode definir não apenas o rumo profissional, mas também o bem-estar emocional e a realização pessoal do futuro jurista. Por isso, é essencial que os estudantes recebam orientação adequada durante a graduação. Testes de aptidão, programas de estágios diversificados, mentorias, palestras com profissionais de diferentes áreas e o contato direto com o dia a dia forense são ferramentas valiosas para ajudar nessa tomada de decisão. 

Destaque-se, nesse contexto, que as Instituições devem se reconectar e se reaproximar da academia. É igualmente importante que o discente tenha a oportunidade de vivenciar, ainda na faculdade, a prática da advocacia, pública ou privada. Essa experiência é fundamental, pois a advocacia continua sendo o principal campo de absorção dos operadores do Direito. O contato com o cliente, com os processos e com as dinâmicas do sistema judicial contribui para a formação de profissionais mais conscientes de sua vocação e preparados para os desafios reais da profissão. Vale lembrar ainda, que todas as carreiras jurídicas são, igualmente, nobres e indispensáveis à sociedade. O advogado privado, o advogado público, o promotor de justiça, o procurador do estado, o defensor público, o magistrado, cada um desempenha um papel essencial na construção de um Sistema de Justiça equilibrado, dentro de uma Ordem Constitucional Jurídica Justa. Um exemplo recente ilustra bem o prestígio e o interesse crescente por certas carreiras públicas: o último certame da Defensoria Pública de Pernambuco registrou mais de sete mil inscritos. 

Isso demonstra não apenas o atrativo da estabilidade e das condições oferecidas, mas também a valorização da função jurídica, com viés social, exercida pela Defensoria Pública, que exige, além de conhecimento técnico, uma profunda vocação para servir àqueles que mais precisam de amparo jurídico. A militância diária nos fóruns e o atendimento interminável das partes não são obstáculos a essa escolha, mas um profundo estímulo. Que possamos, portanto, fomentar entre nossos estudantes de Direito não apenas o desejo de aprovação em concursos ou de sucesso financeiro, mas, sobretudo, a busca pela realização pessoal e pelo compromisso ético com a sociedade. Que cada um encontre o caminho que melhor corresponda à sua vocação, e que as instituições de ensino continuem empenhadas em oferecer as ferramentas necessárias para uma escolha consciente, serena e feliz. O futuro do Direito e, em grande medida, da própria Justiça, depende disso.

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