Tarifas

Tarifaço do México ameaça 14,7% das exportações do Brasil, 5º país mais afetado

Medida que está em discussão no Congresso mexicano deve atingir 232 produtos brasileiros

Tarifaço do México ameaça 14,7% das exportações do Brasil - Pexels

A proposta do governo mexicano de elevar tarifas de importação sobre 983 bens de 19 setores coloca o Brasil entre os países mais afetados, segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) encaminhado ao governo. Em tramitação no Congresso mexicano, a medida deve atingir 232 produtos brasileiros, somando US$ 1,7 bilhão em exportações em 2024 — o equivalente a 14,7% dos US$ 11,7 bilhões vendidos ao México no período.

Pelo levantamento, o impacto é expressivo, porque 67,6% do valor atingido corresponde a bens intermediários utilizados pelo próprio parque produtivo mexicano. Uma tarifa mais alta sobre esses insumos tende a elevar custos de manufatura no país e reduzir a competitividade das exportações brasileiras em setores como veículos automotores, químicos, metalurgia, borracha e plásticos.

A previsão é que o Brasil deverá ser o quinto país mais impactado pelo pacote tarifário. A lista é liderada pela China (US$ 34,2 bilhões), seguida por Coreia do Sul (US$ 5,8 bilhões), Índia (US$ 3,1 bilhões) e Tailândia (US$ 1,8 bilhão). Depois do Brasil, aparecem Indonésia e Taiwan — todos expostos por não contarem com preferências tarifárias que os protejam do tarifaço.

No grupo de países isentos, por já possuírem acordos de livre comércio com o México, estão Estados Unidos, União Europeia, Japão, Canadá e Vietnã.

A iniciativa integra a nova política industrial da presidente Claudia Sheinbaum, o Programa de Protección para las Industrias Estratégicas. Ainda em análise no Legislativo, a medida pode afetar US$ 52 bilhões em importações mexicanas.

O plano prevê elevar a tarifa média de 16,1% para 33,8%, podendo chegar a 50% em alguns códigos tarifários. Segundo a Secretaria de Economia do México, a proposta respeita os limites consolidados na Organização Mundial do Comércio (OMC) e não altera condições de acordos comerciais vigentes. Na prática, porém, o encarecimento das importações deve afetar diretamente setores da indústria brasileira que abastecem o mercado mexicano.

O documento — encaminhado ao governo pela CNI — aponta que a fragilidade dos acordos comerciais entre Brasil e México amplia o risco para a indústria. O ACE 55, que regula o setor automotivo, é o instrumento mais relevante: concede livre comércio apenas para esse segmento e oferece 100% de preferência tarifária a 59,8% do valor que seria afetado, cerca de US$ 1,0 bilhão. Sua cobertura, no entanto, limita-se aos veículos e a alguns itens associados, como partes de borracha, plásticos e máquinas e equipamentos.

O anúncio ocorre no momento em que Brasil e México negociam a modernização de seus instrumentos comerciais. Em agosto, Sheinbaum e o vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), firmaram um plano de trabalho para atualizar os acordos existentes e concluir um novo pacto em 2026.

O MDIC informou, em nota, que acompanha com atenção a discussão em andamento no governo mexicano sobre possíveis alterações tarifárias. A pasta observou que, embora não se trate de uma medida direcionada especificamente contra o Brasil, o potencial impacto sobre as exportações brasileiras preocupa.

Essa preocupação foi transmitida recentemente a representantes do governo mexicano. O órgão defendeu a importância de promover os vínculos entre os países e de assegurar que eventuais medidas não prejudiquem o comércio bilateral que se deseja ampliar. "Nesse sentido, o MDIC permanece engajado em um diálogo construtivo com o governo mexicano".

"O MDIC avalia o tema dentro no contexto do diálogo entre os dois países, intensificado após a visita do vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin ao México, em agosto. Na ocasião, Brasil e México decidiram iniciar, ainda em 2025, o processo de revisão e atualização dos Acordos de Complementação Econômica nº 53 e nº 55 – trabalho que já está em andamento e cuja conclusão está prevista para 2026, com foco em modernização regulatória, previsibilidade e ampliação das oportunidades de comércio e investimentos", diz a nota.

Segundo a CNI, a proposta mexicana contrasta com esse ambiente de cooperação e reforça a necessidade de acelerar as negociações.

Ainda conforme a entidade, um acordo mais abrangente poderia acrescentar US$ 13,8 bilhões ao PIB conjunto, ampliar em US$ 3,2 bilhões o comércio bilateral e atrair cerca de US$ 8 bilhões em investimentos.

A gerente de Comércio e Integração Internacional da CNI, Constanza Negri, afirmou que o tarifaço proposto pelo México afeta um segmento que, embora pareça pequeno, tem impacto significativo sobre a indústria brasileira. Segundo ela, a medida pode frear avanços na relação bilateral num momento em que o Brasil busca diversificar mercados e parceiros.

— É uma pauta que tem relevância para a indústria. Você está vendo um segmento que pode parecer pequeno, mas tem um efeito multiplicado significativo, porque estamos falando de setores industriais — disse.

Negri destacou que o México sempre foi prioritário para a indústria e que, recentemente, houve sinais de avanço na modernização dos acordos comerciais. Disse que há uma discussão sobre como aprofundar o acordo e o arcabouço normativo existente com o México.

— Nossa preocupação é que isso não se transforme em um retrocesso, na contramão do que está progredindo — afirmou.

Sobre a tramitação da proposta no Congresso mexicano, ela disse que o setor privado brasileiro acompanha o processo.

— Estamos monitorando de perto. A proposta foi apresentada e está em discussão. Nosso olhar é estratégico, tempestivo e de antecipação, para evitar dificuldades de acesso ao mercado — afirmou, acrescentando que o levantamento técnico preparado pela CNI foi enviado ao governo brasileiro para sensibilizar autoridades mexicanas sobre os impactos ao Brasil.

— Nossa proposta ao governo é que o Brasil não seja afetado no meio de uma discussão de modernização dos acordos. Não faz sentido que medidas de aumento tarifário sejam aplicadas enquanto se discute ampliar um acordo comercial — disse.

A CNI defende duas frentes: acelerar a revisão dos acordos e conduzir negociações setoriais para evitar prejuízos imediatos. A entidade busca garantir que o Brasil seja tratado como país com acordo em vigor ou em modernização, o que, na avaliação da indústria, é amparado pela própria normativa mexicana.

Negri afirmou que, apesar da preocupação, vê espaço para negociação.

— Estamos confiantes. Trata-se de uma medida associada à política industrial doméstica do México, mas acreditamos que o Brasil tem todos os argumentos para ser enquadrado entre os países preservados dos impactos — disse.