MPF pede rejeição de ação de Hugo Motta por outdoors que o relacionavam à PEC da Blindagem
Órgão alega que ato foi 'legítimo exercício do direito de crítica'. Presidente da Câmara chegou a propor um 'pedido de desculpas' também por meio de painéis publicitários
O Ministério Público Federal (MPF) se manifestou pela rejeição da queixa-crime ajuizada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), contra o sindicalista José de Araújo, coordenador do Sindicato dos Trabalhadores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica da Paraíba (Sintef-PB) em Campina Grande. No final de novembro, Motta ingressou com a ação por conta da instalação de outdoors que o relacionavam à PEC da Blindagem, e chegou a propor um "pedido de desculpas" também em painéis publicitários espalhados pela cidade, o que foi recusado por Araújo.
O MPF adotou integralmente a tese sustentada pela defesa do sindicalista. Segundo o órgão, não há justa causa para o prosseguimento da ação penal, já que a publicação dos outdoors representa crítica política legítima, amparada pela liberdade de expressão.
— Araújo exerceu seu legítimo direito de crítica sobre um fato verdadeiro e de interesse público. Não há crime em cobrar transparência e compromisso de quem ocupa a presidência da Câmara dos Deputados — afirma Olímpio Rocha, advogado de defesa do sindicalista.
'Toda a imprensa fez críticas', diz MPF
A defesa de Motta alegou que os dez outdoors espalhados pelo sindicato a partir do dia 5 de outubro em Campina Grande, no seu estado natal, continham mensagem "difamatória e falsa" por ligá-lo à defesa de criminosos. O painel publicitário ficou exposto por 15 dias e colocava sua imagem como sendo a favor da proposta que gerou uma onda de protestos pelo país.
Com o rosto de Motta, o outdoor estampava o recado: "eles votaram sim para proteger políticos que cometem crimes, o povo não vai esquecer disso". Também constavam os nomes dos deputados federais da Paraíba Aguinaldo Ribeiro (PP), Cabo Gilberto Silva (PL), Murilo Galdino (Republicanos), Damião Feliciano (União), Gervásio Maia (PSB), Mersinho Lucena (PP), Wellington Roberto (PL), Wilson Santiago (Republicanos) e Romero Rodrigues (Podemos), este também ex-prefeito de Campina Grande.
A PEC da Blindagem foi aprovada pela Câmara em setembro, com apoio de Motta, mas foi rejeitada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado dias depois. Ela estabelecia, dentre outras coisas, que deputados e senadores só respondessem a processos criminais com autorização prévia de suas respectivas Casas Legislativas.
"As críticas dirigidas à PEC não foram exclusivas do querelado ou do sindicato. Pelo contrário, toda a imprensa nacional fez severas e contundentes críticas ao projeto", diz o MPF. "A diferença qualitativa da crítica feita ao querelante (cuja imagem foi publicizada) em relação à crítica feita aos demais parlamentares (cujas imagens não foram divulgadas) parece justificada pelo fato de que o querelante é o atual Presidente da Câmara".
Ainda de acordo com o Ministério Público, a atuação do sindicato configura "legítimo exercício do direito de crítica à atuação de parlamentares paraibano", uma vez que os parlamentares estão sujeitos a "pressões e opiniões desfavoráveis às suas atuações, ainda que possam ser consideradas duras, deselegantes, mal educadas, ou mesmo, injustas".
Uso da Advocacia da Câmara
Durante a audiência em novembro, a defesa de Motta apresentou uma proposta de acordo para que o sindicato publicasse novos outdoors com um "pedido de desculpas" pelas críticas ao deputado. A sugestão foi recusada pelo sindicalista, que afirmou não ser o responsável pela contratação dos material, já que a ação foi feita pela própria organização.
— Araújo sequer é parte legítima para figurar como réu, posto que os outdoors foram contratados pelo sindicato, pessoa jurídica, não por ele, pessoa física — afirmou Rocha.
Rocha também questionou o fato da representação de Motta ser feita pela Advocacia da Câmara por "utilizar a estrutura jurídica da Casa para patrocinar uma ação penal privada". Por conta disso, sindicatos e cidadãos da Paraíba encaminharam uma petição à Procuradoria-Geral da República (PGR).
A representação contra Motta alega que a conduta do deputado ao usar a Advocacia da Câmara para processar o sindicalista “pode configurar peculato-desvio (art. 312 do Código Penal), além de violar os princípios da moralidade, impessoalidade e legalidade previstos no art. 37 da Constituição Federal.” Além do envio à PGR, uma segunda petição foi destinada à Mesa Diretora da Câmara.
O que diz a defesa
Na queixa-crime, a defesa do presidente da Câmara afirma que o parlamentar foi alvo da insurgência, já que não pretendia "proteger o crime", mas dispor sobre as prerrogativas parlamentares. Outro ponto questionado foi o fato dos outdoors terem sido veiculados após o arquivamento no Senado, o que "revela que a intenção nunca foi participar do debate político, mas sim atacar a imagem de Hugo Motta, da Câmara dos Deputados e de seus membros".
"O que se verifica, no caso em tela, não é o exercício legítimo da crítica política ou da informação, mas sim o abuso de direito, configurado pela intenção deliberada de ofender e difamar. A conduta de Araújo transcende os limites da opinião para ingressar no campo do ilícito penal, ao imputar falsamente fatos difamatórios e ofensivos à reputação de Motta", diz outro trecho. "As ofensas criminosas, além de macularem a honra e a imagem, extrapolam o campo do debate de ideias e podem até colocar em risco a integridade física do Parlamentar, sobretudo em um ambiente de acentuada tensão política".