Dosimetria

Projeto reduz à metade tempo na prisão de Bolsonaro e demais condenados na trama golpista

Se aprovado, dosimetria fará com que penas de militares sejam diminuídas e progressão para o semiaberto aconteça em menos de 2 anos

Ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 9 meses - Sergio Lima / AFP

Caso seja aprovado da forma como foi apresentado pelo deputado federal Paulinho da Força (Solidariedade-SP), o PL da Dosimetria poderá permitir reduzir o tempo dos condenados pela trama golpista em regime fechado quase a 1/3 do que estava previsto inicialmente.

Apesar dos congressistas ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro desejarem a anistia, a proposta funciona, na prática, para reduzir e acelerar a progressão de pena, isto é, a saída da prisão.

Com isso, por exemplo, o general Walter Braga Netto, que segundo a lei atual sairia da prisão em cerca de 5 anos e 7 meses, agora deixaria o cárcere em pouco menos de 2 anos. Militar com a menor pena entre os réus, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira poderia deixar a prisão 1 ano e 4 meses depois do cárcere.

O cálculo também poderia beneficiar de forma especial o deputado federal Alexandre Ramagem. Ramagem, que está foragido nos Estados Unidos, poderia ver sua pena total cair para menos de 8 anos e, com isso, poderia cumprir sua pena já inicialmente no regime semiaberto.

No entanto, de acordo com a professora de Direito da Fundação Getúlio Vargas Luísa Ferreira, isso dependeria de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

— A lei diz que quem tem a pena entre quatro e oito anos pode ir para o regime inicial semiaberto. Não é uma progressão imediata: nesse caso, a defesa pediria para o Supremo reanalisar a situação dele para ver se ele poderia ser aplicado o regime inicial semiaberto. Mas, dependeria de uma decisão judicial porque não é algo automático, a lei diz que apenas que pode — afirma a professora.

O tempo de progressão para os militares pode ser ainda menor porque o sistema carcerário também permite a chamada remição da pena, que consiste na redução da punição aplicada por meio de trabalho e leitura.

Ao analisar o pedido de ida para o semiaberto, o Supremo Tribunal Federal também avalia questões como o comportamento do réu no sistema penitenciário.

A legislação prevê a redução de um dia de pena para cada 3 dias trabalhados, de um dia de pena para cada 12 horas de estudo, seja ele presencial ou a distância, e redução de até 4 dias por livro lido, com a necessidade de apresentação de um resumo da obra.

Outras atividades complementares, como cursos profissionalizantes, também podem incidir na redução da pena.

Segundo Luisa Ferreira, professora da FGV, o relatório apresentado por Paulinho tem o efeito de beneficiar alguns dos chamados crimes de colarinho branco, porque são eles cuja regra mudou com a exceção aberta pelo texto.

— Em resumo, quem pratica crimes contra a administração pública e contra o Estado Democrático vai progredir antes de pena — afirma a profesora.

Entenda o cálculo
O cálculo feito pelo Globo leva em conta quase todos os possíveis atenuantes que favoreceriam os réus da trama golpista. O benefício aconteceria em razão de uma alteração nas regras de progressão de regime previstas na Lei de Execução Penal.

Bolsonaro e os integrantes da cúpula do seu governo foram condenados por cinco crimes: golpe de estado, abolição violenta do Estado Democrático de direito, organização criminosa, dano qualificado e deterioração do patrimônio público.

Pela lei atual, considerando o cálculo mais benéfico para os réus, Bolsonaro e os demais teriam que cumprir 25% da pena para os crimes de golpe de Estado, abolição violenta e organização criminosa e 16% para o crime de deterioração do patrimônio público para deixar a prisão. Essa diferença ocorre porque os três primeiros crimes foram cometidos com emprego de "violência ou grave ameaça".

A pena para o crime de dano qualificado já prevê detenção, e não é cumprida em regime fechado. Com a nova redação proposta por Paulinho, a progressão passa a ser de 16% para todos os crimes.

Além disso, a lei prevê que, no caso dos crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, será aplicada uma lógica jurídica chamada de concurso formal.

Esse princípio prevê que, caso um indivíduo cometa, com uma só ação, dois crimes ou mais, ele só é punido pelo crime com a pena mais grave, acrescida de 1/6 até metade da pena.

Outra previsão, incluída no projeto por Paulinho, beneficia especificamente os militares e outros condenados na trama golpista: todos aqueles que não exerceram papel de liderança teriam sua pena pelos crimes de abolição do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado reduzidas em 2/3.

No julgamento, apenas Bolsonaro teve sua pena agravada por exercer papel de liderança na organização criminosa.

Bolsonaro, por exemplo, foi condenado a 6 anos e 6 meses pelo crime de abolição violenta e por 8 anos e 2 meses pelo crime de golpe de estado. Essa última pena, acrescida de 1/6, que seria o agravante mais baixo da pena, subiria para 9 anos e 6 meses.

Com isso, a pena total de Bolsonaro seria formada por esses dois crimes e, caso inalterada para os outros crimes, se somaria à pena de 7 anos e 7 meses por liderar organização criminosa, 2 anos e 6 meses por dano qualificado e 2 anos e 6 meses por deterioração de patrimînio tombado.

Com isso, a pena de Bolsonaro, que é de 27 anos e 3 meses, cairia para 22 anos e 1 mês.

Para a progressão de pena, a pena de dano qualificado não é levada em conta. Então, Bolsonaro precisaria cumprir 16% da pena de 19 anos e 7 meses, o que equivale a cerca de 3 anos e 3 meses.

De acordo com os cálculos do relator, Bolsonaro deverá ficar na prisão cerca de 2 anos e três meses, levando em consideração outros fatores que podem impulsionar a progressão de pena.

A mesma lógica se aplicaria a Braga Netto e aos outros condenados, com a redução, ainda, de até 2/3 da pena unificada dos crimes políticos de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado.

Jair Bolsonaro
Projeção de saída da prisão antes: 5 anos e 11 meses

Projeção de saída da prisão agora: 3 anos e 3 meses - segundo o relator, a redução poderia cair para até 2 anos e 3 meses

Pena total antes: 27 anos e 3 meses

Pena total agora: 22 anos e 1 mês

Braga Netto
Projeção de saída da prisão antes: 5 anos e 7 meses

Projeção de saída da prisão agora: 1 ano e 11 meses

Pena total antes: 26 anos

Pena total agora: 14 anos e 1 mês

Anderson Torres
Projeção de saída da prisão antes: 5 anos e 1 mês

Projeção de saída da prisão agora: 1 ano e 9 meses

Pena total antes: 24 anos

Pena total agora: 13 anos e 1 mês

Almir Garnier Santos
Projeção de saída da prisão antes: 5 anos e 1 mês

Projeção de saída da prisão agora: 1 ano e 9 meses

Pena total antes: 24 anos

Pena total agora: 13 anos e 1 mês

Augusto Heleno
Projeção de saída da prisão antes: 4 anos e 6 meses

Projeção de saída da prisão agora: 1 ano e 7 meses

Pena total antes: 21 anos

Pena total agora: 11 anos e 6 meses

Alexandre Ramagem
Projeção de saída da prisão antes: 4 anos

Projeção de saída da prisão agora: 1 ano e 3 meses; também poderia iniciar já no semiaberto devido ao tamanho da pena, mas com autorização do Supremo

Pena total antes: 16 anos e 1 mês

Pena total agora: 7 anos e 9 meses

Paulo Sérgio Nogueira
Projeção de saída da prisão antes: 3 anos e 4 meses

Projeção de saída da prisão agora: 1 ano e 10 meses

Pena total antes: 16 anos e 4 meses

Pena total agora: 1 ano e 4 meses