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Como o bloqueio dos EUA impacta o petróleo da Venezuela?

Trump mobilizou no Caribe navios, aviões e milhares de soldados, o que afirmou se tratar de uma ação contra o narcotráfico

Dos quase 1.400 navios sob sanções americanas em todo o mundo, cerca de 600 são petroleiros, e poderiam ser afetados pelo "bloqueio total" - Miguel J Rodriguez Carrillo / AFP

O bloqueio dos Estados Unidos a navios petroleiros que entrarem ou saírem da Venezuela vai se traduzir em uma queda das exportações de até 50%, apontam especialistas.

O presidente americano ordenou "um bloqueio total e completo" dos petroleiros sancionados, em uma escalada de sua ofensiva contra o esquerdista Nicolás Maduro, cujo governo o republicano Donald Trump não reconhece.

Trump mobilizou no Caribe navios, aviões e milhares de soldados, o que afirmou se tratar de uma ação contra o narcotráfico. Mas Maduro insiste em que os Estados Unidos buscam sua saída do poder.

O que disse Trump?
O presidente americano acusou Maduro de usar o petróleo para financiar "o narcoterrorismo, assassinato, sequestro e tráfico de pessoas". Antes, havia chamado o líder venezuelano de chefão das drogas. Já Caracas considera o "bloqueio militar naval" uma tentativa de "roubar as riquezas" do país.

"Essa medida não tem precedentes na Venezuela, e estamos diante de um cenário inédito no mercado petrolífero", comentou Francisco Monaldi, economista do Instituto Baker no Texas.

Os preços do petróleo subiram após o anúncio. Em novembro, o barril de óleo bruto venezuelano foi negociado a US$ 47,51, o preço mais baixo em quase dois anos, segundo a Opep.

O petróleo da Venezuela já estava sob um embargo imposto por Trump em 2019, durante seu primeiro mandato. O governo Maduro foi forçado a vender óleo bruto no mercado paralelo com grandes descontos.

O governo seguinte, do democrata Joe Biden, abriu exceções para que grandes empresas petrolíferas pudessem operar na Venezuela em condições especiais.

Quantos navios impacta? 
Dos quase 1.400 navios sob sanções americanas em todo o mundo, cerca de 600 são petroleiros, e poderiam ser afetados pelo "bloqueio total", segundo uma análise feita pela AFP de dados do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros dos Estados Unidos e da Organização Marítima Internacional.

Desses 600 navios, 23 estão incluídos em dois programas de sanções dirigidos explicitamente contra a Venezuela: 11 foram adicionados por Trump em seu primeiro mandato, seis por Biden e outros seis foram sancionados na semana passada, em meio à crise entre Washington e Caracas.

Navios não sancionados podem arriscar continuar transportando petróleo venezuelano, mas o medo de perder a carga aumentará os descontos sobre o preço do barril, que, antes da ordem de Trump, giravam em torno de 35%, disse Monaldi.

A estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA) afirmou hoje que as exportações "ocorrem normalmente" e que os navios "continuam navegando com total segurança, suporte técnico e garantias operacionais".

No último dia 10, militares americanos apreenderam um navio que transportava petróleo procedente da Venezuela. O Skipper era uma embarcação com bandeira falsa, do tipo que costuma ser usado em operações no mercado paralelo.

Produção e exportação vão cair?
A Venezuela produz cerca de 1 milhão de barris diários de petróleo bruto, destinados principalmente à exportação. Monaldi calcula que as exportações vão cair quase pela metade, "a depender de o quão frequentes forem as apreensões de navios sancionados que viajam principalmente para a Ásia. Será uma queda dramática."

Até ontem, a estatal PDVSA "não havia conseguido abastecer navios, após a operação contra o Skipper", informou à AFP uma fonte parlamentar. "Isso vai criar um problema sério, porque tem no máximo 15 dias de capacidade de armazenamento."

"Acumular estoques custa caro, e o mais provável é que interrompam a produção, que poderá ser reduzida em cerca de 400 mil barris diários", estimou Monaldi.

A produção da Venezuela caiu ao mínimo histórico após as sanções, que se somaram a anos de corrupção e desinvestimento na indústria local. O petróleo é a principal fonte de receitas do país, e analistas esperam um impacto na economia.

Como ficam China e Chevron?
A ordem de Trump ainda não afetou as remessas da Chevron para os Estados Unidos, indicaram especialistas.

"A licença concedida à Chevron em julho permite que ela fique com 50% da produção das joint-ventures com a PDVSA", ressaltou Oswaldo Felizzola, pesquisador do setor de energia. Já a consultoria Capital Economics apontou "muita incerteza", em relatório divulgado hoje.

O maior impacto é sentido pela China, para onde 80% do petróleo bruto venezuelano é transportado por meio desses navios. A redução dos envios para a Ásia coloca em risco o equivalente a US$ 8,5 bilhões (R$ 47 bilhões) de receita anual da Venezuela, destacou o economista Asdrúbal Oliveros, em entrevista no rádio.

Mas o golpe será curto, afirmou Oswaldo Felizzola: "A China sempre tem um plano B, e poderia enviar seus próprios navios para buscar o petróleo."