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Mulher de Bruce Willis escreve sobre como a doença do ator mudou o Natal da família

"Ainda há conexão. Ainda há amor. Ainda há alegria possível. E, se este período estiver pesado para você, saiba que não está sozinho"

Emma Heming e Bruce Willis, que foi diagnosticado em 2023 com demência frontotemporal - Reprodução/Redes Sociais

Em texto publicado nesta terça-feira (23) em seu site oficial e divulgado também nas redes sociais, Emma Heming Willis, mulher do ator Bruce Willis, relatou como a demência do marido alterou a rotina e as tradições da família durante as festas de fim de ano, marcadas hoje por adaptações, luto e tentativas de preservar momentos de afeto.

As festas de fim de ano têm o poder de funcionar como um espelho. Elas refletem quem fomos, quem somos e aquilo que imaginávamos que esse período seria. Quando você cuida de alguém com demência, esse reflexo pode se tornar especialmente doloroso. Tradições que antes pareciam quase automáticas passam a exigir planejamento — muito planejamento. Momentos que traziam uma alegria simples chegam agora entrelaçados a um sentimento de luto. Eu sei disso porque estou vivendo isso. Ainda assim, há significado. Há acolhimento. Há alegria possível. Aprendi que as festas não desaparecem quando a demência entra na sua vida. Elas mudam.

Antes de qualquer coisa, é importante dizer: é permitido sentir luto. O luto não pertence apenas à morte. Ele também nasce da mudança e da perda ambígua tão familiar para quem cuida. Ele surge quando nos damos conta de que as coisas não vão mais acontecer como antes, quando percebemos a ausência de rotinas, conversas ou papéis que eram tão naturais que jamais imaginamos que um dia terminariam.

Para mim, o fim de ano carrega lembranças de Bruce no centro de tudo. Ele amava essa época — a energia, o tempo em família, as tradições. Era ele quem fazia as panquecas, quem chamava as crianças para sair na neve, quem atravessava a casa com aquela presença firme enquanto o dia se desenrolava. Havia conforto em saber exatamente como tudo aconteceria, especialmente porque eu sou uma pessoa de hábitos. A demência não apaga essas memórias. Mas cria uma distância entre o que foi e o que é agora. E essa distância pode doer.

 

O luto nas festas aparece de formas inesperadas. Pode surgir ao tirar as decorações do armário, ao embrulhar presentes ou ao ouvir uma música conhecida. Pode surpreender no meio de uma sala cheia de gente ou naquele instante silencioso em que todos já foram dormir.

Às vezes, me pego reclamando, de forma quase afetuosa, do nome de Bruce enquanto luto com as luzes de Natal ou assumo tarefas que antes eram dele. Não por raiva — nunca isso —, mas porque sinto falta da maneira como ele conduzia esse período. Ele me ensinou bem, é verdade, mas ainda assim posso me sentir incomodada por mais esse lembrete de como tudo mudou.

Se você sente essa mistura de tristeza e irritação, saiba que não está vivendo as festas da forma errada. Está apenas reagindo, com honestidade, a uma perda real. É possível sentir saudade do que foi e, ao mesmo tempo, estar presente no que é.

Uma das partes mais difíceis do fim de ano para quem cuida é a pressão — externa e interna — para que tudo pareça “normal”. Somos cercados por imagens do que as festas deveriam ser: casas impecáveis, reuniões leves, famílias sorrindo em fotos cuidadosamente produzidas. Mesmo sabendo que essas imagens são recortes idealizados, elas ainda criam uma sensação de fracasso quando nossa realidade não corresponde. Quando a demência faz parte da família, o “normal” se torna um alvo em constante movimento.

Durante muito tempo, tentei manter as festas exatamente como eram, como se isso pudesse nos proteger do que estava acontecendo. Hoje entendo que flexibilidade não é desistência. É adaptação. É escolher a compaixão e a realidade no lugar da perfeição. O sentido não está no tamanho da celebração nem no brilho do dia. Está na presença.

Existe um medo silencioso que muitos cuidadores carregam: o de que, ao criar novas memórias, estejam abandonando as antigas. Mas novas memórias não apagam o que veio antes nem diminuem a história compartilhada. Elas apenas reconhecem que a vida segue por um caminho diferente agora.

Há a ideia equivocada de que, se as festas não são mais como antes, elas se tornam vazias. Não se tornam. O significado não depende de tudo permanecer igual. Ele nasce da conexão. Neste fim de ano, nossa família ainda vai trocar presentes e sentar junta à mesa no café da manhã. Só que, em vez de Bruce preparar nossas panquecas favoritas, serei eu. A receita continua sendo segredo da família. Vamos assistir a um filme. Haverá risadas e abraços. E quase certamente haverá lágrimas, porque é possível viver o luto e ainda assim abrir espaço para a alegria. A alegria não anula a tristeza. A tristeza não anula a alegria. Elas coexistem.

Ao atravessar este período, espero que você leve consigo algumas verdades. Você não está falhando porque as coisas estão diferentes. Está se adaptando. Você não deve explicações a ninguém sobre como escolhe celebrar — ou não celebrar. Simplificar é permitido; menos também pode ser mais. O luto não é sinal de ingratidão. É sinal de amor. E a alegria não precisa ser barulhenta para ser real.

No meu livro, “The Unexpected Journey”, a pesquisadora Pauline Boss fala sobre o pensamento do “ambos/e”. É possível lamentar o que as festas já foram e, ao mesmo tempo, abrir espaço para novas tradições. É assim que sigo em frente. Seguro a dor do que a demência nos tirou enquanto enfeitamos a árvore e a gratidão por ainda estarmos juntos celebrando. Seguro a memória de Bruce como o homem que um dia sustentou esse período para nossa família e a realidade de quem ele é hoje, com o mesmo amor. Seguro lágrimas e risadas no mesmo fôlego, muitas vezes no mesmo instante.

Não há como negar que as festas são diferentes agora. Mas diferente não significa vazio. Não significa quebrado. Não significa sem sentido. Ainda há conexão. Ainda há amor. Ainda há alegria possível. E, se este período estiver pesado para você, saiba que não está sozinho. Você não está fazendo nada errado. Não existe uma única forma “certa” de atravessar as festas quando a demência faz parte da sua vida. Existe apenas o seu jeito. E ele é suficiente.