Ano Novo e o desafio de equilibrar metas e limites
Sonhar com objetivos alcançados é sentimento natural da humanidade, mas é preciso tomar cuidado para não negligenciar o aspecto mental nos momentos de adversidade
Ano novo, metas novas. Quem nunca se pegou estabelecendo objetivos para o ano que se aproxima? Seja se comprometendo a dedicar mais aos estudos, começar a praticar exercícios físicos ou trocar de carro, por exemplo. Mas não atingir as metas pré-estabelecidas também faz parte do processo de crescimento pessoal e é necessário estar atento para não negligenciar isso.
Antes de tudo, o desejo de crescimento ou de conquista é uma força quase que natural do ser humano e objeto de estudo da filosofia desde os tempos da Grécia Antiga até o mundo contemporâneo, sendo interpretado a partir de diversos pontos de vista.
Contudo, estabelecer metas, por mais que possam parecer simples, requer discernimento e pés no chão. É necessário pensar em objetivos que sejam factíveis, aqueles que são possíveis de alcançar. A intenção não é fazer juízo de valor se será mais fácil ou não a conquista, mas sim levar em consideração a viabilidade do plano.
Caminhos
A professora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Silvia Maciel, recorreu a um ensinamento do escritor Ariano Suassuna, no livro ‘Lições de Realismo Esperançoso’, para alertar onde é possível dar o ponto de partida para o estabelecimento de metas e a necessidade do equilíbrio de perspectivas.
“Para estabelecermos metas, entendo que precisamos ser realistas esperançosos. Não dá para projetar metas inalcançáveis. Isso é um otimismo tolo. Também não devemos cair no oposto de considerar que não conseguiremos nada e não pensar nos sonhos que queremos realizar. Isso é uma chatice pessimista. Para definir nossos objetivos, nós precisamos refletir em como será possível realizar”, argumentou.
Por sua vez, a psicóloga especialista em psicologia clínica, Chay Camarotti, acrescentou que as metas devem ser um caminho de orientação, apresentando flexibilidade e entendendo o momento de vida da pessoa.
“Primeiro, a gente precisa pensar essas metas como grandes orientadoras de um caminho, entender que elas precisam ser sustentáveis. A gente precisa compreender que as metas precisam ser flexíveis, não exageradas. Então, a flexibilidade, por exemplo, faz com que você, ao tomar a decisão de recuar numa meta, não classifique isso como desistência. Isso não significa que você seja fraco ou algo do tipo”.
Portanto, para delinear bem os objetivos de vida, é necessário refletir como será possível realizá-los, ter clareza de onde quer chegar e se perguntar previamente quais serão os passos necessários para se chegar naquilo que se quer.
Colocar mais pressão diante dos objetivos pode ser um fator causador de possíveis ansiedades. O ideal seria evitar novas exigências e pressão, afastando o “eu tenho que”, e se aproximando do “o que eu quero construir”, enxergando as possibilidades e não as determinações, que por vezes podem acarretar em decepções.
Frustração
Dentro das nossas trajetórias, os rumos traçados nem sempre poderão ser uma reta contínua, sem percalços, dúvidas ou medos. É preciso entender que imprevistos podem acontecer e que se sentir frustrado por ter o sonho adiado é completamente normal, como alerta Camarotti. A frustração faz parte do desenvolvimento, tendo em vista que as pessoas investem tempo, energia e afeto nas metas. Assim, é possível utilizar esse sentimento como lição para novas tentativas.
É importante estar atento também para não fazer dos objetivos uma medida de valor pessoal, balizando quem é a partir de sucessos ou insucessos. Em resumo, qualquer possível revés diz muito mais sobre o plano, sobre os contextos envolvidos, do que sobre o sujeito em si. “Quando a meta falha, a pessoa sente que foi uma falha dela, que ela foi insuficiente, incompetente, por exemplo. O foco fica muito mais nessa medida de valor pessoal do que na meta em si. Então, como hoje a gente vive nessa cultura da alta performance, as metas surgem com um excesso, geralmente de cobrança, e não de um cuidado de fato consigo”, alertou Camarotti.
Em contrapartida, Silvia Maciel ressalta a necessidade de compreender que não há controle de tudo e que é necessário ter serenidade em cada passo dado na vida, sempre com a noção que poderá ser necessário “voltar algumas casas” para poder seguir mais adiante.
Momentos
Segundo as especialistas, uma importante atitude diante do processo de se alcançar algo é de se perceber diante do momento. Questionar, vez ou outra, se aquela meta ainda faz sentido para quem você é atualmente. Compreender que os objetivos delimitados são influenciados pelos instantes vividos e que isso não fica atribuído à identidade como indivíduo.
“A gente precisa entender que o contexto importa. É preciso traçar metas que sejam consideradas importantes naquele momento da vida. Entender que elas podem e merecem ser revisitadas a cada fase da vida que a gente está passando. Então, entendemos que essa meta não está atribuída à identidade”, disse Chay.
Vínculos
Os relacionamentos carregados ao longo da trajetória também são parte fundamental para o êxito. Não viver isolado e aprender com as mais diferentes convivências para absorver exemplos que podem servir como bússolas.
“Precisamos entender que não vivemos sozinhos no mundo e que, por isso, é muito importante termos pessoas ao nosso lado para nos apoiar, nos aconselhar ou alertar ao longo da jornada”, alertou a professora Silva Maciel.