Diversão

Famoso ficcionista britânico se aventura pelo mundo da arte

Em 'Mantendo um olho aberto', Julian Barnes dedica cada um dos 17 capítulos a pintores dos séculos 18 a 20

Com suas esculturas gigantes, Claes Oldenburg integra a pop art - Divulgação

No livro "Mantendo um olho aberto", o famoso ficcionista britânico Julian Barnes faz as vezes de crítico de arte. Cada um dos 17 capítulos é dedicado a um artista, no qual o autor mergulha em contextos abissais e particulares, revelando detalhes que ajudam a compreender persona artística, obra, movimento e arte. 

Não se pode dizer que é um olhar de uma pessoa comum. Mas foge do academicismo, o que deixa margem para outros entendimentos. Com essa percepção, ele faz um longo percurso pela história da arte, revisitando artistas do século 18 ao 20, começando pelo pintor do Romantismo francês Théodore Géricault, passando pelo xilogravurista suíço Félix Vallotton, até chegar à pop art das esculturas gigantescas do norte-americano Claes Oldenburg.

Expoente do movimento ao lado de Andy Warhol e Roy Lichteinstein, precursor de Jeff Koons, Oldenburg ficou conhecido por suas reproduções em larga escala de comidas estilo fast-food, a exemplo de sanduíches e sorvetes. Só de olhar, sem nem mesmo tocar, é possível "sentir" suas obras de náilon. "Com Oldenburg você não precisa saber muito sobre arte pra saber do que você gosta nela. O saboroso acabamento de suas primeiras esculturas de comidas é resultado das coberturas feitas com ferramentas genuínas de decorar bolos", define o autor.

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Há, também, a subversão em mudar o material do objeto, como o "Ventilador macio gigante", feito de plástico. Em suas primeiras obras, parece ter sido mais vanguardista, vasculhando o lixo, valorizando o descartável, dando sequência ao ready-made de Marcel Duchamp. Mas a mera ampliação de um objeto faz dele uma obra de arte? Um aspirador de pó com o dobro do tamanho é só isso? Se o efeito de uma obra é fazer rir, já é provocador.

Muito antes de surgir a arte pop e seus ícones midiáticos, o grande realista Gustave Courbet, no século 19, fazia uso da publicidade para se autopromover (ainda que seu talento fosse suficiente). Barnes revela que ele fazia a própria assessoria de imprensa, divulgando notas em jornais quando uma de suas pinturas era vendida por muito dinheiro. Courbet também planejou o primeiro centro de exposição permanente dedicado a um único artista - ele mesmo.

Tão intrigantes são as obras do surrealista belga bem mais conhecido do público minimamente iniciado em arte, René Magritte. Seus quadros seguem uma linha diferente de outros de seus pares do movimento. Geralmente, o surrealismo coloca objetos ou pessoas em lugares onde elas não costumam estar, ou em situações com as quais não possuem qualquer relação usual no mundo 'real'.

Magritte faz uma contraposição mais sutil. Na obra "Perspicácia" (1936), em lugar de um pássaro, um ovo gigante aparece dentro de uma gaiola, ocupando-a inteiramente, de tal maneira que não se sabe como o ovo entrou lá. Já em "A clarividência", Magritte pinta um pássaro de asas abertas, mas olha para um ovo. Ele era o que o autor chama 'um pintor de ideias'. "Qualquer ideia que não chegue a ser brilhante parece, na tela, mais exposta do que um esboço 'estético' nem-tão-brilhante", disse Barnes.

O cubismo precedeu o surrealismo, e pretendia trazer uma personalidade anônima para a pintura, sem assinatura e sem ego. A história e um dos representantes egocêntricos desse movimento, Pablo Picasso, mostrou que o objetivo não se concretizou. A história às vezes é injusta, e Braques, outro expoente do cubismo, não recebeu tantos holofotes quanto seu rival Picasso. O autor ressalta o fato de que as pinturas de Braques se caracterizaram pelos relevos cubistas sem perspectiva, misturando paisagens terrenas de natureza com geometria.

Seguindo de trás para frente, no fauvismo a arte tomou um banho de cores quentes influenciada pelo impressionismo. Por dar mais valor ao colorismo do que à forma, o movimento foi criticado pelos cubistas clássicos. Ser colorista também não era um adjetivo que soava elogioso ao francês e representante do romantismo, Eugéne Delacroix.

Disse o artista certa vez, como revela trecho do livro: "um belo desenho é mais belo quando acompanhado de uma cor tediosa, e que a função principal da cor é distrair a atenção da qualidade mais sublime, que pode passar bem facilmente sem qualquer prestígio que a cor possa dar".

As naturezas-mortas que Barnes ressalta são mais vivas do que as pessoas graças a Cézanne. A escritora Virginia Woolf observou que, quanto mais você contempla fixamente as maçãs do pintor pós-impressionista, mais pesadas elas parecem se tornar.

Nas experiências pessoais de Barnes, frequentando exposições mundo afora, a observação de que grandes exposições com mais de 300 obras não são produtivas, pois ninguém consegue passar nem dois minutos contemplando cada obra. Para tanto, seriam necessárias dez horas! Muito melhor, ele diz, são as pequenas mostras. Assim se conhece um artista.

Serviço:
Livro "Mantendo um olho aberto"
Autor: Julan Barnes, 264 páginas
Editora: Anfiteatro/Rocco
Preço médio: R$ 44,90