Crítica: 'Paraíso perdido' é melodrama colorido e intenso

Novo filme da cineasta Monique Gardenberg, 'Paraíso perdido' estreia nesta-quinta-feira. O longa conta com atuações de Erasmo Carlos e Seu Jorge

Cena do filme 'Paraíso perdido', de Monique Gardenberg - Fabio Braga/Divulgação

A música parece fundamental para "Paraíso perdido", novo filme de Monique Gardenberg. Não apenas as canções que aparecem durante a narrativa, cantadas pelos personagens ou como trilha sonora, mas a própria essência da música enquanto instrumento de investigação emocional. O filme entra em cartaz nesta quinta-feira (31) no circuito nacional.

A história é sobre uma família que tem uma boate, Paraíso Perdido. José (Erasmo Carlos) é o patriarca e contrata o policial Odair (Lee Taylor) para fazer a segurança de sua neta, Ímã (Jaloo), alvo de ataques homofóbicos. Aos poucos, a história dessa família se abre perdas pessoais, intimidades destruídas e a força de um passado misterioso e trágico.

As cores, a sexualidade e uma família em crise parecem aproximar "Paraíso perdido" dos filmes de Pedro Almodóvar e do gênero melodrama, um cinema que se expande a partir de emoções fortes, tragédias épicas e corações aflitos.

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É através de personagens marcantes e a maneira como reagem aos impulsos da vida que esse enredo se torna cada vez mais empolgante. "O saudoso Carlos Reichenbach me disse uma vez que notava uma característica em minha obra: que eu era apaixonada por meus personagens. Sou mesmo, tento defendê-los. E contei com atores estupendos para fazer isto", diz a diretora.

Cotação: Ótimo

"Quando escrevo, é a música que me conduz"

Como chegou a esse projeto? Há quanto tempo tinha em mente esse filme, o que te guiou durante a criação?
Tudo começou com a vontade de voltar a escrever, fazer um filme autoral. E daí logo a pergunta: que história quero contar? Imediatamente tive vontade de mergulhar no repertório romântico popular. Coloquei 'Impossível acreditar que perdi você' para tocar e logo veio a imagem de uma mulher chorando e se maquiando diante do espelho, com teste positivo de gravidez nas mãos. Assim nascia Celeste (Julia Konrad). Em seguida, imaginei outra mulher, agora muito forte, indo se vingar de alguém que lhe fez mal, nascia Eva (Hermila Guedes). Uma terceira acordava de um coma com o rosto coberto por ataduras, era Nádia (Malu Galli). Tudo eu imaginava ao som da canção de Marcio Greyck. E, finalmente, pensei que uma quarta mulher poderia estar cantando essa música numa boate e que, portanto, a voz que ouviríamos desde o início seria dela, e ela já não seria uma mulher, mas um homem vestido de mulher. Nascia Ímã (Jaloo). Continuei ouvindo muita música, e as cenas foram vindo, fui criando os laços, origem e biografia dessas quatro criaturas. O Zeca Baleiro me auxiliou bastante na pesquisa musical. Juntos fomos criando a trilha de cada personagem. Fundamental para desenvolvê-los.

O que significa a música para você? Neste filme, além de ser fundamental na narrativa, você conta com cantores como Erasmo Carlos e Seu Jorge, como foi o trabalho com eles?
A música faz parte da minha história. Me envolvi com a música por acaso e muito cedo, com 18 anos, durante o tempo do Centro Acadêmico da Faculdade de Economia da URFRJ. Produzia shows na luta pela abertura política, ajudava a produzir os shows 1º de Maio, organizados por Chico Buarque. Durante umas férias, fui tour manager do Clube da Esquina 2, e aos 20 anos, em Angola, me tornei empresária de Djavan. A partir daí minha relação com a música nunca mais parou. Foi dirigindo shows, inclusive, que realizei meus primeiros trabalhos artísticos. E foi assistindo Marina Lima da mesa de luz, repetidas vezes, que comecei a imaginar histórias. De tal forma que agora, quando escrevo, é a música que me conduz. Não consigo escrever sem música, ela me transporta, me tira do mundo e me leva a um estado de delírio, similar ao sonho. No caso de 'Paraíso Perdido', ela não só embala como conduz a trama, ela é narrativa. Por isso a busca por cantores que pudessem atuar. Seu Jorge é um grande ator, já havia trabalhado com ele num clipe que dirigi de Gabriel O Pensador - 'A dança do desempregado'. E Erasmo já me fascinava desde os inesquecíveis filmes de ação de Roberto Farias.

O elenco é muito importante para o filme. Como foi o trabalho com os atores?
Fico sempre atenta ao tom. O tom é tudo pra mim. Discutimos o tom de cada cena. E nesse filme, com tantos músicos, o tom tomou muitas vezes até ares musicais, nos comunicávamos muitas vezes a partir de vocabulário da música, mesmo quando discutíamos as falas dos personagens. Ensaiamos todas as cenas durante a pré-produção, na busca pelo tom certo. E, assim, nessa convivência entre pessoas muito amorosas, foi se formando a família do 'Paraíso perdido'.