Jung, a Psicologia Analítica e o I Ching - do antigo Oriente ao velho Ocidente
Jung estudou o I-Ching por 30 anos e ficou convencido de que o ato de jogar as moedas (ou as varetas) com certos critérios adotados pela concepção chinesa torna-se possível o acesso à sincronicidade
Para o desenvolvimento da Psicologia Analítica (P.A) de Carl Gustav JUNG (1875-1961), o I Ching teve uma forte colaboração. Citarei e elucidarei três delas:
Jung, a Psicologia Analítica e o I Ching - do antigo Oriente ao velho Ocidente
Sincronicidade
O conceito de sincronicidade desenvolvido por Jung, até então entendido como causalidade pela perspectiva da física clássica, passa a ter uma perspectiva de espaço/tempo somente explicável pela física moderna que é inerente ao oráculo do I-Ching.
Arquétipo
O conceito de arquétipo da P.A. pode ser simbolizado por cada um dos 64 hexagramas como expressão de sua energia.
Tipos psicológicos
No estudo das transformações dos hexagramas, cada um deles apresenta quatro possibilidades, que são: Caminho do Sentimento, Caminho do Pensamento, Caminho Físico e Caminho Psíquico. Para a P.A. cada um de nós, temos quatro funções e duas atitudes – as funções são: Pensamento, Sentimento, Sensação e Intuição sendo que a combinação dessas com as duas atitudes (Introversão e Extroversão) resultará nos oito tipos psicológicos descritos por Jung.
Fazendo uma analogia teremos:
Introversão – Yin
Extroversão – Yang
Função Pensamento – Caminho do Pensamento
Função Sentimento – Caminho do Sentimento
Função Sensação – Caminho Físico
Função Intuição – Caminho Psíquico
O que seria a sincronicidade?
Jung estudou o I-Ching por 30 anos e ficou convencido de que o ato de jogar as moedas (ou as varetas) com certos critérios adotados pela concepção chinesa torna-se possível o acesso à sincronicidade.
Para simplificar vamos trazer um exemplo de sincronicidade:
Existia um paciente de Jung que, depois de varias sessões, não apresentava melhora. Finalmente em uma das sessões esse paciente reportou que havia sonhado com um escaravelho dourado, onde representava algo importante de seu processo, nesse exato instante ouviu-se na janela do consultório um ruído que ao ser verificado por Jung era um escaravelho dourado que batia na janela (muito raro naquela região). Jung o apanhou e mostrou ao paciente pronunciando: - Esta aqui teu escaravelho dourado. - A partir dessa sessão o paciente conseguiu superar o complexo.
Esse exemplo mostra que fatos, que desafiam a física clássica, tornam-se significativos ao observador se esse estiver atento e aberto a eles. Poderia se dizer que foi uma causalidade, mas ai não cabe aqui provar, mas sim levar ao leitor a ter curiosidade sobre o assunto.
É sabido que Jung utilizava o I-Ching para sessões de alguns pacientes. Ele mesmo fez um maravilhoso prefacio do livro I-Ching – O livro das Mutações, perguntando ao Oráculo sobre o prefacio que iria fazer sobre o livro. Esse prefácio nos trás exemplo e esclarecimento sobre a sincronicidade, mostrando que o Oráculo revela o que está oculto, inconsciente.
De acordo com a revista Super Interessante - edição 235 – jan/2007, certa vez Jung tratava um jovem com complexo de Édipo que pretendia casar com uma mulher que lhe lembrava profundamente a própria mãe. Ao consultar o I-Ching saiu o hexagrama “44 -Vir ao encontro” que diz: “A jovem é poderosa. Não se deve desposa-la.” Sendo sincronicidade ou causalidade a terapia funcionou.
Após os avanços da física por Albert Einstein, James Maxwell e Niels Borh a ciência traz uma nova concepção de causalidade e ai o I-Ching passa a fazer sentido.
O que seria Arquétipo?
A etimologia da palavra arquétipo vem do grego archétupon e do latim archetpum que significam: original, modelo, tipo primitivo. Arqué do grego arkhês – o que está na frente, começo, origem, principio.
Para a P.A. os arquétipos são potencialidades psíquicas. Assim como nascemos com potencialidades genéticas os arquétipos são padrões (inconscientes) que estruturam e coordenam o desenvolvimento da nossa consciência. Não herdamos conteúdos psíquicos, mas sim herdamos uma tendência a vivenciar a vida de determinadas maneiras.
Também chamados de imagens primordiais foi inicialmente observado por Platão, mas coube a Jung descobrir que esses não são difundidos pela linguagem, tradição ou cultura mas ressurgem espontaneamente em qualquer tempo ou lugar sem a influencia de uma transmissão externa.
Quem assistiu ao filme, Nise: O coração da Loucura lembrará que seus pacientes desenhavam figuras e mandalas que eram semelhantes a desenhos de culturas antigas sem nunca ter tidos acesso a esses.
Foi Nise que trouxe a P.A. para o Brasil, ela teve uma grande troca de conhecimentos com Jung. Temos o livro escrito por ela que dá uma excelente visão do que é a P.A. “Jung – Vida e Obra" - Ed Paz e Terra.
Encontramos expressões dos arquétipos nos mitos (por exemplo - A grande mãe), contos de fadas, hexagrama do I-Ching, cartas do Tarô, etc. Também eles podem aparecer em alguns sonhos. O livro O Caminho dos Sonhos de Marie-Louise Von Franz demonstra com maravilhosos exemplos a terapia através das imagens dos sonhos.
Energia de vida
Para falarmos de tipos psicológicos teremos que falar brevemente de energia de vida (ou libido).
Segundo Jung, instintos, desejos, vontade, afeto, atenção, rendimento do trabalho, etc. são as forças psíquicas que são geradas a partir de forças antagônicas que ele denominou natureza e espírito. Não é o objetivo aqui aprofundar nesse tema, mas apenas elucidar a existência dessa energia e saber que a forma que expressamos nossa energia de vida nos mostra a forma como atuamos no mundo. Para um aprofundamento do tema sugiro os livros A energia psíquica de Jung e o livro Vida & Obra Jung de Nise da Silveira.
Tipos Psicológicos
Atitudes: Extroversão / Introversão
Na extroversão existe um direcionamento de nossa energia de vida para o exterior, na direção do objeto ou situação enquanto que na introversão o caminho é contrario, ou seja, ocorre um recuo do sujeito mediante o objeto/situação, parecendo até ameaçador (segundo Nise). Essa atitude demonstra como lidamos com uma situação. Porém o que Jung observou é que em ambos os casos existem uma compensação da energia, na atitude extrovertida ocorre um fluxo de energia para o inconsciente e na atitude introvertida ocorre um fluxo de energia para o objeto/situação.
Funções: Pensamento/ Sentimento / Sensação / Intuição
Assim como percebemos o mundo através das atitudes as funções também afetam nossa percepção e interação com o mundo. Podemos fazer uma analogia a uma lente, onde tudo que vem do mundo e é sentido pelos nossos cinco sentidos passa por essa lente, e tudo que sai de nós para o mundo, também passa por essa lente.
Assim, algumas pessoas tem essa lente mais “calibrada” para a função pensamento (que poderá ser extrovertida ou introvertida), outras para o sentimento outras para sensação e outras para intuição.
As funções pensamento e sentimentos são chamadas de funções de ordenação, enquanto que as funções de sensação e intuição são chamadas de funções de percepções.
Apenas para exemplificar vamos comparar dois números: 8 e 13.
- Gosto mais de 8 do que do 13 – estamos usando a função Sentimento
- O 8 precede o 13 – estamos usando a função Pensamento
- Pressinto que irá dar o 13 no jogo e não o 8 – estamos usando a função Intuição
- Sinto que há uma estética no numero 8 enquanto que no 13 não há – estamos usando a função Sensação.
Normalmente haverá uma função mais desenvolvida em nós, mas isso não nos impede de usar as outras, apenas temos mais facilidade em usar uma delas. Existe um teste, que normalmente é aplicado para estudantes do ensino médio, que irá apontar qual é a função que ele tem mais desenvolvida apontando sua vocação e facilitando o caminho de sua carreira profissional.
Finalizando, Jung traz o seguinte comentários no livro I-Ching:
“Por que não ousar um dialogo com um antigo livro que se propõe como algo vivo?”
Referencias Bibliográficas:
WILHELM, Richard. I Ching O Livro das Mutações. São Paulo: Pensamento, 1995
SILVEIRA, Nise da. Vida & Obra Jung. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011
JUNG, C.G. ; WILHELM R. O Segredo da Flor de Ouro – Um Livro de vida Chinês. Rio de Janeiro: Petrópolis, 2001.
JUNG, C.G. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Rio de Janeiro: Petrópolis, 2000.
JUNG, C.G. Tipos Psicológicos. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.
JUNG, C.G. Sobre sonhos e Transformações. Rio de Janeiro: Vozes, 2014.
JUNG, C.G. A Energia Psíquica. Rio de Janeiro: Vozes, 2012.
FRANZ, Marie-Louise Von. O Caminho dos Sonhos. São Paulo : Cultrix, 2009
Revista Super Interessante – Edição 235 Jan/2007: Ed. Abril.
João Carlos Paretti – Facilitador Didata em Biodança, Consultor de I-Ching, Terapeuta Junguiano. Contato: (81) 99828.2249 Tim e WhatsApp - E-mail: jcparetti@hotmail.com
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