Julião das Máscaras faz sucesso com uma tradição familiar de mais de cem anos
Famoso dentro e fora de Pernambuco, o artista vende suas peças de papel machê em sua lojinha em Olinda
Peças de Julião fazem sucesso dentro e fora do Brasil - Rafael Furtado/Folha de Pernambuco
Cachorro, macaco, passarinho, abutre, onça, galo, jacaré, boi, cavalo. Os foliões de Olinda: Homem da Meia Noite, La Ursa, bruxa, pirata, arlequim. Mickey, Donald, Picapau, Cascão, Cebolinha e outros personagens midiáticos. A fauna de seu Julião se espalha pelas paredes da lojinha situada na avenida Joaquim Nabuco, 1234, no Guadalupe, em Olinda, é variada e multicolorida.
A semente do "Bazar Artístico Julião das Máscaras" foi plantada há mais de cem anos, pelo seu avô, Julião, que deixou de herança o talento e o apelido para seu filho, João Dias Vilela. Os dois eram nascidos e criados em Olinda, assim como João Dias Vilela Filho, o atual Julião. Ele começou a produzir seus trabalhos em 1972, quando tinha apenas doze anos e o Carnaval em Olinda era muito diferente. "A gente dormia na calçada e ninguém mexia, a brincadeira era jogar talco um no outro, e tomar bate-bate de maracujá e tamarindo", relembra.
Fauna de Julião das Máscaras é variada, colorida e tirada de sua imaginação - Crédito: Rafael Furtado/Folha de Pernambuco
O pai de Julião era um artista respeitado, que confeccionou os primeiros bonecos gigantes da Mulher do Dia e do Menino da Tarde. Mas ele prefere se dedicar às máscaras. "Só faço peças maiores por encomenda, porque toma muito tempo", explica.
Nesta época do ano, a correria é grande e acaba envolvendo a esposa, Jeane, e os filhos, Mateus e Joana. Todo mundo acaba colocando a mão na massa, porque entre setembro e fevereiro são confeccionadas mais de 500 peças. Prestes a completar 60 anos, ele diz que não sabe quantas máscaras produziu até hoje. "Não faço ideia. Se tentar contar, vou endoidar", ri.
Uma cabeça de La Ursa, que atualmente é uma das mais populares produzidas por Julião, leva cerca de dois dias até finalizar o processo minucioso de colagem do papel, recorte dos olhos e várias camadas de tinta (zarcão e tinta a óleo). Julião trabalha como instrutor de arte numa escola municipal há 30 anos e geralmente divide seu tempo entre as aulas e a loja, mas em época de férias, como o mês de janeiro, mergulha de cabeça na produção. Deu trabalho para conseguir marcar uma entrevista com ele, completamente envolvido com a compra de material e o atendimento às encomendas. "Às sete tomo café, trabalho até uma da tarde, almoço e volto pra trabalhar de novo", descreve.
La Ursa é uma das peças mais famosas de Julião das Máscaras - Crédito: Rafael Furtado/Folha de Pernambuco
Julião não faz segredo de sua arte. "Trabalho para mim e para o povo e não tenho medo de ser copiado, porque sou criativo. Todo ano invento coisas diferentes", afirma, enquanto segura duas luminárias de La Ursa, "um macho e uma fêmea", que adaptou para colocar na porta do ateliê. Da época do pai, ele continua fazendo uma La Ursa 'vintage', da forma como aprendeu com o avô Julião. As suas ele foi recriando, inserindo detalhes, experimentando cores. "O que faz mais diferença é a cor", ensina.
Abutres de bico pontudo custam a partir de R$ 25 - Crédito: Rafael Furtado/Folha de Pernambuco
Os preços de sua arte, que se espalha por galerias e coleções no Rio de Janeiro, na França e no Japão, começam a partir de R$ 25, com máscaras que tanto podem servir para brincar, como para decorar. "O 'troféu' (uma pequena estátua de papel machê) é R$ 30, e a cabeça de La Ursa varia de R$ 60 a 80", detalha Julião.
Todos os personagens vêm da imaginação do artista, que gosta de trabalhar de madrugada, pois "precisa de paz, principalmente se for inventar alguma coisa nova", e jamais pega uma encomenda se não tiver certeza de que conseguirá entregá-la a tempo. "Gosto de dinheiro, mas gosto mais de responsabilidade. Preciso zelar pelo meu nome. A gente tem que gostar e cuidar do que faz".