Prédio-caixão é interditado em Paulista por "histórico de comprometimento estrutural"
Em 2008, nível de perigo da estrutura já tinha 'alto risco' de desabamento
O Edifício Primavera, localizado na rua Catende, bairro do Janga, em Paulista, Região Metropolitana do Recife, foi interditado, na última segunda-feira (12), após apresentar histórico de comprometimento estrutural.
A construção fica ao lado do Edifício Carajás, que também foi interditado na última sexta-feira (9). Os dois se encaixam na modalidade de prédios-caixão e têm mais de 40 anos de construção.
A vistoria técnica da Defesa Civil do Paulista no Edifício Primavera foi motivada após os problemas identificados no prédio vizinho. Durante a análise, a equipe detectou diversas patologias, como afundamento no piso externo, infiltrações, cerâmicas se desprendendo e comprometimento estrutural da caixa d’água.
O Primavera tem, ao todo, seis apartamentos e três pavimentos, sendo o térreo, 1º e 2º andar. Marcos Oliveira, de 59 anos, mora no térreo há quase 35 anos. Ele acionou a Defesa Civil do município, em 2021, após notar problemas estruturais no imóvel, que chegou a ser classificado com risco estrutural nível 2 e agora foi reclassificado para risco 3 (crítico), principalmente pela falta de manutenção ao longo dos anos.
O prédio também constava na amostragem feita pelo Instituto Técnico-Científico de Perícia (Itep) em 2008, já apontando alto risco.
"A gente faz algum conserto e o prédio já fica rachando. O piso da cozinha tinha começado a se soltar e isso nos preocupava. Agora, enquanto estamos nesse processo, estou dormindo na casa do meu irmão, na Iputinga [Zona Oeste do Recife]. Agora, vim no Janga para ir ao médico, mas vou lá [no prédio], ainda hoje. Quero saber como anda a nossa situação", afirmou ele.
Os moradores do imóvel precisam, conforme explicou Oliveira, retirar os móveis e demais materiais dos apartamentos, sendo um por vez.
"Vamos aguardar o laudo. Falei com meu advogado para darmos entrada no auxilio moradia para alugar outro imóvel e ver o que será feito", finalizou.
À Folha de Pernambuco, a moradora do Edifício Primavera Rosângela Avelar, de 61 anos, explicou como ficou sabendo da interdição e disse estar se organizando para deixar o local o mais rápido possível.
“Moro aqui há seis anos e fiquei sabendo da interdição através da televisão. Passo a maior parte do tempo na casa do meu filho, que tem câncer, mas meu marido fica o dia todo aqui em casa”, iniciou.
“Ainda não sei para onde vou, mas já estou organizando a mudança. Minha casa está toda deteriorada, com rachaduras nos quartos e no banheiro. É uma situação terrível”, acrescentou.
Eunice Deise, de 44 anos, vive o pesadelo pela segunda vez. Há mais ou menos um ano e meio, ela morava em um prédio do tipo caixão que também foi interditado e obrigou a moradora a sair do local. Agora, pela segunda vez, Eunice irá deixar sua casa para trás.
"Eu morava no Conjunto Beira-Mar, que foi interditado anos atrás. Não esperava passar por esse problema novamente. Ontem, eles vieram aqui e classificaram como risco 3, falando que, a qualquer momento, podia desabar”, relatou.
“Ainda hoje pretendo sair daqui, e não era nem para ter dormido no apartamento. Foi muito difícil pensar nisso a noite toda”, desabafou.
Problema crônico
Edifícios-caixão não possuem colunas e nem vigas. Foram construídos em forma de "parede sobre parede", sem sustentação. O histórico nos mostra que, de 1977 até 2023, houve um total de 18 desabamentos de imóveis desse tipo em Pernambuco, resultando em 54 vítimas fatais.
A última estrutura de prédio-caixão que ruiu no estado foi a do Edifício Kátia Melo, em Piedade, Jaboatão dos Guararapes, na última terça-feira (6). Não houve vítimas.
>> "Tenho medo que caia e atinja minha casa", diz vizinha do prédio que desabou em Jaboatão
Ainda tinham moradores
Três apartamentos estavam ocupados no momento da vistoria. Todos os moradores foram orientados a não permanecer no local e a organizar a retirada dos pertences de forma segura e sem tumulto. Um parecer técnico será entregue ainda esta semana, e poderá ser usado pelos proprietários para acionar os direitos junto à seguradora ou instituição financeira responsável pelos financiamentos.
Outra interdição
Na sexta-feira (9), o Edifício Carajás também foi interditado, após vistoria da Defesa Civil. A equipe já havia concedido um prazo de seis meses, em 2024, para que os reparos estruturais fossem realizados, o que não aconteceu.
A vistoria recente confirmou o agravamento das patologias, reforçando a necessidade da interdição.
A Prefeitura do Paulista reforça, por meio de nota, que “a responsabilidade pela manutenção é dos proprietários, por se tratar de imóveis privados, e alerta para a importância das vistorias periódicas a fim de evitar riscos à vida e preservar a integridade das edificações.”
Construção banida em PE
Há 20 anos, está proibida em Pernambuco essa técnica de construção. Isso porque foi constatado que o modelo não apresentava condições de durabilidade e resistência ao longo do tempo.
Esse tipo de imóvel se popularizou nos anos 1970, especialmente entre as classes de menor poder aquisitivo – devido ao baixo custo, sendo uma “solução” para um profundo déficit habitacional à época.
Só em 2023, foram registrados dois desabamentos com mortos: o Edifício Leme, em Olinda, que ruiu após interdição, chegando a vitimar fatalmente seis pessoas; e o bloco D-7 do Conjunto Beira Mar, em Paulista, que desabou parcialmente, provocando a morte de 14 pessoas.