França: Bordeaux vs Bourgogne
Você deve saber que essas são as duas regiões viníferas mais importantes da França. Quiçá do mundo. Os mais famosos e caros vinhos deste planeta se originam de lá. Mas por quê? Se eu fosse Chicó responderia: “não sei, só sei que é assim”. Mas não sou preguiçoso, amigo. Acho que tradição histórica, experiência agrícola e industrial acumulada e terroir (misto de geografia, solo e clima) explicam. Exclusividades destas regiões? Não, claro. Porém, poucas – ou nenhuma – aliam tão bem esses fatores. Leitor, já escrevi aqui sobre Bordeaux e Bourgogne. Não leu? Faz tempo, mas se pedir, podemos enviar uma cópia. Hoje, a ideia é comparar uma com outra.
Começando pela geografia. A região vinícola de Bordeaux se situa no sudoeste da França. Predominantemente plana, é enorme, com 300.000 hectares de vinhedos. Já a Bourgogne (Borgonha), montanhosa, está localizada no leste, ao norte do Vale do Rhône, com 75.000 hectares de vinhedos. E o terroir? Bordeaux, pela influência atlântica, tem invernos amenos, verões quentes e chuvas fortes durante a primavera. A Bourgogne, de clima continental, tem verões quentes, porém o inverno é mais frio, com granizo e muita chuva. O solo tem características diferentes, mas não vou encher sua paciência com detalhes agrícolas, senão você deixa de ler o texto! A produção de Bordeaux é cinco vezes maior que Bourgogne. Bordeaux, por sua maior extensão, se divide em várias subregiões, que dão nome e prestígio às garrafas, como Médoc, Margaux, Pauillac, Saint-Émilion, Pomerol, etc. As diferentes classificações, sobre as quais já lhe falei, muito complexas, se estratificam prioritariamente em tipos e níveis de “crus”. Em Bourgogne, são apenas cinco subregiões, acrescida de Beaujolais (em geral listada à parte). E a classificação, além dos regionais e das denominações de vilas (Pommard, Beaune, Vosne-Romanée, Chablis, Montrachet, etc), diferencia apenas Grand Cru (top de linha) de Premier Cru.
A viticultura é o maior diferencial. Bordeaux é a terra dos cortes (“assemblage”), a mixagem de uvas. São cinco principais variedades – Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, Malbec (ou Côt) e Petit Verdot – para os tintos e três – Semillon, Sauvignon Blanc e Muscadelle – para os brancos. Sim,
Bordeaux também produz bons brancos – destaque para o famoso Sauternes, adocicado – embora os tintos prevaleçam fortemente. Já Bourgogne é o reino do monovarietal (uma única casta usada). Pinot Noir é a uva tinta dos grandes vinhos da região e Gamay, a casta dos Beaujolais. Para os brancos, sem dúvida os melhores do mundo, impera a Chardonnay. Eventualmente a Aligoté e raramente a Pinot Gris são usadas, também como monovarietal. Os tintos borgonheses se destacam, mas com uma distância pequena para os brancos, em contraste com Bordeaux. Essas diferenças climáticas e de castas resultam em produtos distintos.
Nos tintos, Bordeaux produz vinhos mais densos, possantes, tânicos, apimentados, com especiarias e fruta vermelha. Enquanto Bourgogne fornece maior elegância e refinamento, corpo mais leve, toques florais e frutados, com menor teor alcoólico. Qual o melhor? Pim, pam, pum... Depende do ambiente do dia, da hora, da companhia, da comida... Sabe de uma coisa, beba os dois. Começando com um branco da Bourgogne, se possível um Puligny-Montrachet. Estará na cabeceira do mundo. Mas faça isso antes dos efeitos da briga de Lula e Trump destruirem nosso bolso. Tim, tim, brinde à vida.



