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Pequenas cidades mostram a força da Aprendizagem Criativa no Brasil

Experiências revelam que o futuro da educação brasileira está sendo construído longe das capitais

Para Verônica, as experiências revelam que o futuro da educação brasileira está sendo construído longe das capitaisPara Verônica, as experiências revelam que o futuro da educação brasileira está sendo construído longe das capitais - Divulgação

A Aprendizagem Criativa tem mostrado que a inovação educacional não depende de tecnologias sofisticadas, mas de pessoas criativas, de contextos significativos e de espaços de autoria. Fundamentada nos 4 Ps - Projetos, Paixão, Pares e Pensar Brincando - ela valoriza o aprender criando e incentiva a construção do conhecimento por meio de experiências reais e conectadas à comunidade. Em pequenas cidades, onde as relações sociais e educacionais são mais próximas, essa abordagem encontra terreno fértil para promover conexões verdadeiras entre escola e território, fortalecendo a educação pública e o protagonismo dos estudantes e educadores.

Inspirada nas ideias de Seymour Papert, com contribuições de Paulo Freir, a Aprendizagem Criativa estimula o diálogo entre saberes locais e escolares, promovendo uma educação como prática de liberdade e transformação social. Quando a escola reconhece que a maior transformação não está nos recursos tecnológicos, mas nas pessoas e nas conexões, ela passa a valorizar o que há de mais potente: a criatividade, o pertencimento e o trabalho coletivo.

Em Coruripe (AL), por exemplo, estudantes desenvolveram um sensor-robô com materiais reaproveitados para medir o nível da água, conectando o aprendizado a um problema real da comunidade. Já em Ribeirão das Neves (MG), a abordagem foi incorporada à rede pública de ensino, promovendo políticas que incentivam a autoria e a participação ativa dos alunos. Esses exemplos mostram que, mesmo em contextos de poucos recursos, a aprendizagem se torna mais significativa quando está ancorada no território e na vida real.

Desafios e potências da inovação nos territórios locais

As pequenas cidades enfrentam desafios importantes para avançar em práticas inovadoras. Entre eles estão a falta de formação docente continuada, a limitação de infraestrutura tecnológica e as estruturas escolares ainda marcadas pela rigidez e pelo tradicionalismo. O isolamento geográfico e a ausência de políticas públicas de formação sistemática também dificultam o avanço de propostas criativas e colaborativas. Além disso, mudar a cultura escolar e incorporar a experimentação, o erro e a curiosidade como parte natural do processo de aprendizagem ainda é um desafio em muitos municípios.

Por outro lado, as potências que emergem desses territórios são notáveis. O vínculo comunitário, o protagonismo dos professores e a riqueza cultural local tornam as escolas espaços de criação e pertencimento. Projetos inspirados na Aprendizagem Criativa envolvem famílias e comunidades na resolução de desafios locais, fortalecendo redes de cooperação e aprendizado mútuo. Quando há confiança e propósito, as escolas se transformam em laboratórios de esperança, onde o conhecimento é construído com significado.

Essas experiências concretizam as ideias de Freire, Papert e Resnick. Freire lembrava que é preciso ler o mundo antes de ler a palavra, reforçando o aprendizado a partir da realidade do estudante. Papert dizia que aprender é construir, destacando o valor do fazer para compreender. Resnick, por sua vez, defende que a curiosidade e a colaboração são motores da aprendizagem criativa. O interior mostra, assim, que a inovação educacional não é apenas técnica, mas também afetiva, contextual e relacional.

Diversas experiências em municípios brasileiros reforçam essa visão. Em Várzea Grande (MT), o Projeto Paixão mapeia os interesses dos alunos e envolve as famílias em atividades mão na massa, fortalecendo o sentimento de pertencimento e engajamento comunitário. Em Caruaru (PE), práticas como a produção de cordéis e o uso do barro em atividades de aprendizagem mostraram que a tecnologia cara não é condição para a criatividade.

Em Mata de São João (BA), a aproximação entre gestores e educadores estimulou uma cultura de corresponsabilidade e inovação. Em Branquinha (AL), atividades artísticas e analógicas ampliaram a autoria estudantil, mesmo com pouca infraestrutura digital. Em Jaguariúna e Vinhedo (SP), a formação entre pares e eventos de criação fortaleceram o trabalho coletivo e a autonomia docente.

Esses exemplos reúnem os 4 Ps da Aprendizagem Criativa: projetos significativos, paixão pelo aprender, colaboração entre pares e o prazer de pensar brincando. Os alunos passam a se ver como sujeitos transformadores do território, e a escola se torna um espaço vivo, que ensina pela experiência e pela criação. Essa rede de práticas gera um efeito multiplicador, inspirando outras escolas e municípios a desenvolverem suas próprias iniciativas e a transformarem a curiosidade e a colaboração em políticas de cidadania e aprendizagem.

Essas experiências revelam que o futuro da educação brasileira está sendo construído longe das capitais. Está nas mãos de professores, gestores e estudantes que, movidos pela curiosidade, pela colaboração e pelo amor ao que fazem, transformam a escola em um espaço de invenção, pertencimento e criação coletiva. É no encontro entre tradição e inovação, entre território e imaginação, que a educação se renova e aponta caminhos para um Brasil mais criativo e mais justo.

Verônica Gomes diretora de Implementação e Parcerias com redes de ensino do Instituto Escolas Criativas

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