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Murucututu é a mistura da arte de Amanda Melo da Mota e Cristiano Lenhardt

Mostra está em cartaz na Amparo 60 até 17 de outubro

Murucututu é o nome da exposição de Amanda Melo da Mota e Cristiano Lenhardt que está em cartaz na Amparo 60. São cerca de 28 obras, algumas produzidas em conjunto, nos últimos meses, e outras de seus projetos e pesquisas individuais que, ao longo do processo, se colocaram em diálogo.

Amanda e Cristiano viveram a efervescência da arte contemporânea no Recife, no início dos anos 2000. Tornaram-se amigos desde aquele período e, ainda que morando em cidades diferentes, mantiveram um profícuo canal de diálogo e de apoio artístico e espiritual. Entre suas poéticas e caminhos sempre houve importantes pontos de intersecção, mas eles nunca haviam realizado uma exposição conjunta, com trabalhos feitos também em conjunto. Foi justamente pela observação da relevância e da densidade dessa troca entre os dois que a galerista Lúcia Costa Santos propôs uma mostra que celebrasse esse encontro.

Segundo a dupla, as obras e toda a base para concepção da exposição nasceram antes mesmo dela estar prevista. No final da pandemia da Covid-19, Amanda visitou seu amigo no Mundo Bicho, ateliê e casa de Cristiano Lenhardt, situado no município de São Lourenço da Mata. Um sítio encravado numa vasta área de mata atlântica, um ambiente rico e provocador. Nessa temporada de Amanda na casa do amigo, eles ouviram um canto grave que vinha da mata, depois descobriram que aquilo que ressoava era do Murucututu, uma coruja cujo habitat é a mata atlântica. Aquele canto foi compreendido como um chamado, como uma convocação para que os dois criassem juntos. Assim eles foram desenvolvendo alguns experimentos.

Rito a Rito

Nesse processo, eles realizaram um exercício, chamado por Cristiano, de Rito a Rito. Nele, a proposta é desenhar/pintar em conjunto. Assim, os dois abriram uma grande tela no chão e começaram a trabalhar livremente tendo como material uma terra avermelhada encontrada na região. E, quando o convite da exposição chegou, foi dessa tela nascida desse exercício de alguns anos antes que os artistas escolheram partir. “Foi algo muito orgânico e fluido vivermos esta experiência. Depois dessa primeira pintura veio um desenho em carvão com exercício de desenho cego e os outros trabalhos foram surgindo”, lembra Amanda.

Num segundo encontro, Cristiano visitou a casa de Amanda em São Paulo, onde também funciona seu ateliê, e que estava em plena reforma. Nesse novo ambiente eles seguiram com mais alguns exercícios e planejaram aquilo que fariam no retorno de Amanda ao Mundo Bicho.  

“Decidimos que iríamos trabalhar com a cerâmica, com o barro, com esse solo sagrado. Começamos a produzir juntos com essa matéria-prima, deixamos secar e posteriormente levamos ao fogo. Mas a queima não deu muito certo, as peças explodiram, terminamos com uma série de estilhaços. E fomos pensando em como trabalhar com esse material”, explica Cristiano.

A partir dessas lascas nasceram espécies de esculturas, enigmas trazidos pela beleza das formas, numa conexão com a matéria, como a materialidade, com os significados ali forjados.

“Foi um processo intenso, intuitivo e muito divertido. A gente ficou se divertindo com as coisas que davam errado e aproveitando e imaginando soluções, lidando com nossas emoções e expectativas”, conta Cristiano.

As cerâmicas também se transformaram em molduras para alguns desenhos, reafirmando a importância dos ciclos e da ideia de circularidade para os artistas. Ao mesmo tempo em que nasciam as obras a quatro mãos, eram desveladas aproximações com seus projetos individuais recentes.  Ao colocá-los em diálogo, juntos, num processo de apoio, de compartilhamento de ideias, de visões de mundo, ganharam mais potência e mostraram que toda a produção não era aleatória.

A pausa para esse estar junto fez os dois bordarem, repetirem um gesto incansáveis vezes como mantras, como rezas, vendo nascer desses pontos obras têxteis.  Do diálogo com Amanda, Cristiano encontrou o caminho para uma espécie de manta acolchoada que havia feito, mas que ainda não visualizava como obra.

“Eu fiz uma promessa. O que eu pedi foi realizado e a promessa era usar roupas amarelas durante 6 meses. Fiz isso. Depois peguei todas essas roupas e fiz uma espécie de colcha de retalhos. Eu não via uma obra ali, para mim faltava corpo. Conversando com Amanda, decidi começar a bordar. Trouxe para esse material os pontos, os furos, algo tão presente no meu trabalho”, lembra Cristiano.

 

 

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