Museu em Amsterdã reúne taxidermia e arte com animais exóticos empalhados
Instalado em uma mansão do século XVII no Distrito dos Canais da cidade, o museu foi criado por dois artistas holandeses que se autodenominam Darwin, Sinke e Van Tongere
Krook recebeu um telefonema da Itália informando que houve uma confusão com um dos caixotes nos quais estava a réplica de um fóssil gigante para seu novo museu. A enorme cauda, a caixa torácica, o osso pélvico e os membros chegaram. Mas, ao abrir o quarto caixote, a equipe descobriu que estava vazio — salvo por algumas lascas de madeira espalhadas. O crânio do Tiranossauro rex havia desaparecido.
Esse foi um dos contratempos na criação do Art Zoo, um novo e ambicioso museu que abriu ao público no centro de Amsterdã, em junho. Instalado em uma mansão do século XVII no Distrito dos Canais da cidade, o museu reúne história natural e taxidermia contemporânea criada por dois artistas holandeses que se autodenominam Darwin, Sinke e Van Tongeren.
Krook, diretora do museu, disse que o Tiranossauro não foi seu único problema logístico. Ela também precisou descobrir como passar um gorila gigante, feito com 71 metros de jeans, pelas portas longas e estreitas do prédio.
"Este é um edifício tombado, então não é como se pudéssemos simplesmente quebrar uma porta para encaixar a peça",explicou. "Brinquei dizendo que me sentia numa consulta ao ginecologista, porque estamos sempre tentando descobrir como tirar o bebê ou, neste caso, colocá-lo para dentro", relembrou.
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O dinossauro e o gorila de jeans são apenas dois das mais de 200 obras extraordinárias que estão atualmente em exibição no Art Zoo. O museu foi criado por Ferry van Tongeren e Jaap Sinke — uma dupla de artistas oriunda do Haarlem, na Holanda —, mais conhecidos como Darwin, Sinke & Van Tongeren.
Van Tongeren e Sinke se formaram em arte, mas seguiram carreira na publicidade após a graduação. Em 2005, Van Tongeren vendeu sua agência com planos de se aposentar, mas acabou se juntando a Sinke para seguir um sonho. Os dois se tornaram o que chamam de artistas de "taxidermia fina" — técnica responsável por preservar animais mortos, transformando-os em obras de arte — e fundaram uma empresa que leva seus nomes, além do nome do teórico evolucionista Charles Darwin, sua grande fonte de inspiração.
Para o Art Zoo, eles reuniram algumas de suas obras de taxidermia já existentes, além de centenas de novas peças feitas especialmente para o museu. Eles também coletaram fósseis, conchas, gaiolas e vitrines, e montaram outros objetos curiosos para complementar os animais.
Na entrada da casa, um crocodilo de 5 metros de comprimento está suspenso no teto, amarrado por cordas vermelhas. Na antessala, aves tropicais com asas azuis e verdes vibrantes se agarram a dezenas de gaiolas antigas.
Em uma das paredes da sala de estar há uma coroa feita de serpentes letais entrelaçadas: jiboias, mambas-de-jameson e anacondas. Um leopardo se agacha dentro de uma fornalha antiga e filhotes de avestruz malhados fazem ninho em uma concha. A perna de um mamute se ergue, atuando como uma coluna próxima dali.
Esse museu eclético foi construído ao longo de, aproximadamente, dois anos. Peter van Duinen, diretor da Vrije Academie, uma instituição educacional que aluga o prédio, havia usado dois andares para exposições de arte temporárias, mas queria algo mais permanente. Ele trabalhou com Krook, sua esposa, para encontrar as pessoas certas para o projeto.
A mansão que abriga o museu é conhecida como Cromhouthuizen, em homenagem ao seu proprietário original, Jacob Cromhout, um comerciante e regente, ou seja, membro da classe dominante da cidade. Ela foi preservada por séculos em condições quase perfeitas, com seus pisos de mármore originais e pinturas barrocas no teto. Anteriormente, o espaço abrigava o Museu da Bíblia.
Sinke e van Tongeren buscam inspiração para seus trabalhos de taxidermia nas naturezas-mortas holandesas e flamengas do século XVII, que frequentemente incluíam animais exóticos retratados em poses dramáticas.
"Tudo gira em torno das poses", disse Van Tongeren em uma entrevista, acrescentando que gosta de fazer referência aos primeiros desenhos anatômicos de artistas como Andreas Vesalius e Leonardo da Vinci, que apresentavam seus objetos esfolados como se estivessem vivos, em movimento e às vezes até dançando.
Ele e Sinke também se inspiraram no conceito de gabinete de curiosidades — coleções artísticas de objetos exóticos, fósseis, conchas e animais mortos que eram populares entre artistas e cientistas da Europa da era do Iluminismo e que foram os precursores dos museus modernos.
Uma antiga cozinha, localizada no andar de baixo, foi transformada por Van Tongeren e Sinke em um espaço chamado "Oficina de Darwin". Ao redor de uma reprodução de papel machê do século XIX representando a musculatura de um gorila, há diversas imagens, como caranguejos gigantes, conchas salpicadas e lagartos saindo de frascos de vidro. O ambiente parece um laboratório científico, repleto de desenhos anatômicos e bustos de gesso com a cabeça de Darwin.
— Eles se concentram na ideia do "Gesamtkunstwerk" — conta Krook, referindo-se ao conceito em que tudo no espaço, incluindo a mobília e as obras de arte, forma um "único tableau vivant", ou seja, um quadro vivo. — Cada cômodo estabelece um diálogo entre a arquitetura e a arte, de modo que o todo se torna maior do que a soma das partes — explica a diretora.
Sinke afirmou que nenhum dos animais expostos no Zoo Art foi morto para fins de taxidermia. Como explica uma placa na entrada: "Todos morreram de causas naturais, sob os cuidados de zoológicos e criadores". Segundo o artista, mesmo as espécies extremamente raras em exibição — um tamanduá-bandeira, uma corujinha brasileira e um leopardo-persa — foram adquiridas como atropelamentos ou já encontradas mortas.
O esqueleto de girafa no átrio é real, assim como a perna de mamute na sala de estar, disse Van Duinen. Entretanto, a réplica do Tiranossauro rex foi feita a partir de um fóssil original de 66 milhões de anos — encontrado nas Black Hills, em Dakota do Sul, nos Estados Unidos —, que havia sido exibido por um tempo no Centro de Biodiversidade Naturalis, em Leiden, na Holanda, onde recebeu o nome de Stan.
Krook levou três meses para localizar a réplica desaparecida do crânio de Stan, mas finalmente, após várias ligações, ela a encontrou em um depósito no sul da Holanda. Van Tongeren dirigiu até lá para buscá-la e levou a peça final do Tiranossauro para Amsterdã, utilizando sua própria van.

