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Coluna Movimento Econômico

Transnordestina pode acirrar desigualdade no Nordeste

O alerta veio de especialistas durante o evento Conexões Trasnordestina, ocorrido nesta quarta-feira em Caruaru

O Conexões Transnordestina fez sua quinta edição em Caruaru para ouvir as demandas do polo de confecçõesO Conexões Transnordestina fez sua quinta edição em Caruaru para ouvir as demandas do polo de confecções - Foto: Elvis Alelula/Sudene

O debate Conexões Transnordestina, realizado nesta quarta-feira (15) em Caruaru, acendeu um alerta sério: o risco de que a principal ferrovia da região acentue – em vez de reduzir – as desigualdades entre os estados do Nordeste.

Com trechos desconectados e uma lógica de concessão que privilegia interesses pontuais, técnicos alertam para o perigo de que a construção de ferrovias no Nordeste, priorizando trechos isolados, amplie as diferenças entre os estados da própria região. O foco das críticas recai sobre a criação de novos eixos logísticos restritos ao Ceará e à Bahia.

No Ceará, a malha avança com forte aporte privado e já se aproxima de outros modais logísticos, como o Porto do Pecém. Na Bahia, a expansão ferroviária segue em ritmo acelerado, com investimentos robustos que preveem a ligação do Porto de Ilhéus ao Oceano Pacífico. O Piauí também começa a ganhar protagonismo, já que está integrado à ferrovia que termina no Ceará. Como já informado aqui – e vale lembrar –, no próximo dia 23 entra em operação o trecho entre Bela Vista (PI) e Iguatu (CE) da Ferrovia Transnordestina. Entre as cargas a serem transportadas estão gesso e gipsita.

Enquanto isso, Pernambuco segue em posição um pouco mais privilegiada do que Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte, pois aguarda para os próximos dias o anúncio do edital que permitirá a retomada das obras no trecho Salgueiro–Suape, paradas desde 2016. Mas, assim como esses três estados, o Leão do Norte ainda não tem previsão para ver um único trem circular por sua ferrovia, correndo risco de perder cargas preciosas do Polo Gesseiro do Araripe.

O que se observa nas últimas décadas é um desmonte expressivo da Malha Nordeste, como apontaram os especialistas Maurício Pina e Fernando Jordão no seminário Conexões Transnordestina, ocorrido nesta quarta-feira (15) em Caruaru. Foram cerca de 3 mil quilômetros retirados de operação pelas subsidiárias da CSN após a concessão do Governo Federal, deixando um vácuo de infraestrutura ferroviária que, por consequência, enfraqueceu os portos antes ligados à malha Nordeste em quatro estados.

O superintendente da Sudene, Francisco Alexandre, defendeu que a retomada do ramal Salgueiro–Suape é essencial para o desenvolvimento regional, mesmo que sua viabilidade econômica seja questionada por critérios financeiros tradicionais. Segundo ele, o modal ferroviário deve ser entendido como um investimento público estratégico, capaz de induzir crescimento e integrar cadeias produtivas, como a do gesso no Sertão e a do frango no Agreste. 

Francisco alertou que, sem articulação política, técnica e institucional, Pernambuco continuará em desvantagem frente a estados como Ceará e Bahia, que atuaram de forma unificada para garantir seus interesses. Ele ressaltou que o papel da Sudene é justamente articular, analisar e apoiar projetos estruturantes para o Nordeste, e conclamou parlamentares e empresários a se unirem em torno de uma estratégia comum para assegurar que a ferrovia contribua efetivamente para reduzir as desigualdades regionais.

O mesmo fez Ivania Porto, diretora da Associação Comercial e Industrial de Caruaru. Ela chamou atenção para a desconexão entre o debate técnico e a agenda política. Para Ivania, enquanto o conhecimento técnico estiver dissociado da pressão social e institucional, as decisões continuarão reféns de interesses distantes das reais demandas regionais. A diretora defendeu a articulação entre entidades empresariais e sociedade civil para transformar o debate sobre a Transnordestina em ação política concreta, com foco no desenvolvimento regional. Ela encontrou apoio em José Queiroz, ex-prefeito de Caruaru, no ex-senador Douglas Cintra e no prefeito de São Bento do Una, Alexandre Batité, presentes na plateia do evento.

O economista Wamberto Barbosa, diretor do Núcleo Gestor do Polo de Confecções de Pernambuco, lembrou que o ramal que passa por Caruaru teria carga garantida, já que a região responde por 70% de toda a produção de confecções do Estado, com nada menos que 800 milhões de peças confeccionadas por ano. Para ele, o modal ferroviário pode viabilizar não apenas o escoamento da produção, mas também a verticalização da cadeia têxtil em Pernambuco, hoje dependente de matéria-prima importada. Ele destacou ainda que o uso da ferrovia pode se tornar um diferencial competitivo para o polo diante das exigências internacionais de sustentabilidade e critérios ESG.
 

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