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Os impactos para o contribuinte com as mudanças no IR 2026

Atualização da faixa de isenção beneficia 10 milhões de brasileiros e reduz descontos na folha de pagamento

Para Barreto, quem é remunerado via distribuição de lucros sentirá mais os efeitos da nova taxaçãoPara Barreto, quem é remunerado via distribuição de lucros sentirá mais os efeitos da nova taxação - Foto: Vinicius Lins/Folha de Pernambuco

Com a ampliação da faixa de isenção, a partir de 1º de janeiro, cerca de 10 milhões de contribuintes deixarão de pagar Imposto de Renda (IR). A medida, implementada pelo governo Lula para aliviar a carga sobre quem recebe menos de R$ 5 mil, também gera economia para salários de até R$ 7 mil, com redução gradual das alíquotas.

Até o fim deste ano, as pessoas que recebiam menos de R$ 3.076,00 (cerca de dois salários mínimos) não pagavam o imposto. De acordo com o contador Matheus Barreto, essa atualização de tabela significa a correção de parte da defasagem inflacionária acumulada por anos, beneficiando os contribuintes que antes pagavam imposto mesmo com rendas relativamente baixas. “Na prática, isso aumenta a renda líquida disponível, melhorando o poder de compra.”

Dados da Confirp Contabilidade apontam que quem ganha R$ 5 mil por mês terá uma economia de R$ 312,89 no IR descontado em folha. Ao longo de um ano, o número representa R$ 4.067,57 a menos desembolsados com o tributo. Essa mudança atinge diretamente famílias que recebem até cinco salários mínimos, parcela na qual se concentra grande parte da classe média brasileira e que agora não precisará pagar o tributo em cima de seus ganhos. 

Por outro lado, o contador tributarista e professor universitário André Charone alerta que não pagar pelo imposto não significa não declarar.

“A pessoa pode não pagar imposto, mas ainda assim ser obrigada a declarar, seja por patrimônio, movimentações bancárias, investimentos ou outras regras da Receita. Isso não muda automaticamente com a nova isenção”, pontuou. A nova regra só passa a valer a partir de janeiro de 2026, com reflexos na declaração entregue no ínicio de 2027.

Cofres
Historicamente, quem recebia até R$ 5 mil vinha arcando com uma carga desproporcional, enquanto pessoas com a renda mais alta pagavam menos IR, especialmente por meio de isenções sobre lucros e dividendos. Agora, mudou. Isso porque o governo federal estima renúncia de cerca de R$ 25 bilhões por ano com a ampliação da isenção.

Para equilibrar as contas, outra forma de tributação sobre altas rendas será implementada, o que altera o cenário de quem recebe rendimentos isentos por meio de empresas, fundos exclusivos ou estruturas jurídicas alternativas. 

Com esse objetivo, entra em vigor, em 2026, o Imposto de Renda Mínimo (IRPFM), garantindo que os contribuintes mais ricos paguem pelo menos uma alíquota efetiva mínima. Contribuintes com renda mensal acima de R$ 50 mil estarão sujeitos a uma cobrança complementar na declaração anual para atingir uma tributação efetiva gradual, que chega a 10% sobre a renda total para quem ganha acima de R$ 100 mil por mês. 

“Mesmo que parte dos rendimentos seja isenta ou tributada na fonte, no ajuste anual essas pessoas terão que recolher a diferença até atingir a alíquota mínima estabelecida, tentando reduzir as distorções entre as altas rendas e a classe assalariada”, explicou Matheus.

Para Bruno Pereira, que é encarregado contábil e recebe entre R$ 4 mil e R$ 5 mil  - a depender do mês -, o ganho com a mudança poderá ser observado mais a longo prazo. “O valor descontado em folha não era tão alto, embora ainda seja relevante. Então, essa mudança permitirá economizar um pouco mais ou até quitar alguma dívida ao longo do tempo”, disse.

Bruno Pereira: mudança permitirá economizar ou até quitar alguma dívida ao longo do tempo. Foto: Vinicius Lins/Folha de Pernambuco.

Economia
No cálculo realizado com o salário base de Bruno, a economia por mês fica em torno de R$ 140, que, para ele, não é suficiente para impactar de forma significativa logo de cara, mas deve melhorar o orçamento no conjunto de descontos ao longo do ano. “Isso significa que sobrará um pouco mais do salário para economizar ou quitar alguma conta.” De acordo com ele, esse momento é de “otimismo, mas também de cautela”.

Para Barreto, o governo aposta que a arrecadação obtida sobre as altas rendas será suficiente para equilibrar a conta nos cofres públicos após a perda da arrecadação. Caso ainda assim haja algum desequilíbrio, o contador lembra que “o próprio texto legal prevê ajustes”, como mecanismos de compensação aos estados e municípios por meio de transferências adicionais financiadas pela arrecadação extra das novas taxações.

Na prática, a medida afeta diretamente categorias que estruturaram sua renda a partir da distribuição de lucros, e não de salário. Como exemplo, estão os empresários, investidores com grandes participações e profissionais liberais que trabalham como pessoa jurídica. Barreto destaca que “profissionais que costumavam remunerar-se principalmente via distribuição de lucros, em vez de salário convencional, sentirão mais diretamente os efeitos da nova taxação”. 

Durante anos, médicos, dentistas, advogados, engenheiros e consultores receberam um pró-labore reduzido e retiraram a maior parte da remuneração como lucro, esse isento de IR. 

Nesse quesito, algumas estratégias já são discutidas para mitigar o impacto. Uma delas é aumentar o pró-labore, reduzindo o lucro sujeito à alíquota de 10%. Embora isso implique um pagamento maior ao Insituto Nacional de Seguro Social (INSS), pode ser vantajoso em casos de lucros muito elevados, lembra Matheus. 

Saída
Outra saída é fracionar a distribuição de dividendos ao longo do ano para não ultrapassar o limite de R$ 50 mil mensais isentos. O contador, porém, alerta que esse tipo de manobra tem alcance limitado.

“Na declaração anual de ajuste, o fisco verificará o total, e se a soma dos impostos pagos for inferior à alíquota mínima efetiva, o contribuinte terá que pagar a diferença.” Isso quer dizer que profissionais que recebem acima de R$ 600 mil anuais não escaparão do “imposto mínimo” de 10%, mesmo dividindo artificialmente os valores.

Barreto também chama atenção para um efeito colateral estrutural da regra: o limite fixo de R$ 50 mil por mês funciona como uma armadilha progressiva. No início, atinge apenas quem tem rendimentos muito altos; mas, por não ser reajustado, tende a alcançar uma parcela maior da classe média alta ao longo dos anos. 
Isso prejudica a previsibilidade tributária e pode desestimular a criação ou manutenção de pequenas e médias empresas — justamente o grupo que mais emprega no país.

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Essa distorção, segundo Barreto, reduz a previsibilidade tributária e desestimula a formalização ou a constituição de empresas de pequeno e médio porte no longo prazo.

Ao mesmo tempo, a taxação não atinge plenamente os contribuintes que concentram riqueza no exterior. Barreto ressalta que muitos super-ricos utilizam mecanismos sofisticados para evitar a incidência das novas regras. “Muitos deles usam offshores, holdings, fundos exclusivos e outras estruturas para não distribuir dividendos diretamente, ou para distribuí-los fora do Brasil”. 

Parte desses recursos também migra para paraísos fiscais, onde há regras mais flexíveis. Como a nova legislação mira sobretudo a distribuição formal de lucros, grande parte dessas estruturas permanece fora do alcance do Fisco.

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