Cordel, mais que um patrimônio
A poesia popular, contando de forma rimada 'causos' da vida cotidiana, enfrentou e ainda hoje enfrenta preconceitos. Mas, na verdade, carrega em si uma riqueza cultural sem tamanho.
Qualquer pessoa que entre em contato com um livreto de cordel, ao ler seus versos, geralmente é tomada pela sonoridade textual de seu enredo. Ou seria textualidade sonora? Quando lemos um verso, principalmente em voz alta, nosso cérebro fica um pouco dividido entre música e texto. Afinal, é música ou é texto? Já experimentou? Eu fiz essa tentativa e realmente é salutar. Digo isso porque, ao lermos um texto rimado, nosso cérebro é acionado em áreas diferentes, proporcionando estímulos que contribuem para a memória. Isso foi alvo de vários estudos científicos.
Mas voltemos à dualidade música/texto. Na semana passada, a literatura de cordel recebeu o título de patrimônio cultural do Brasil. Reconhecimento merecido, porém tardio, como geralmente é para as coisas da cultura nesse Brasil, só para não entrar na seara do descaso, cuja vítima mais recente foi o Museu Nacional do Rio de Janeiro.
Mas voltemos ao cordel, sobre o qual falamos mais um pouco hoje neste bate-papo e também no caderno de Arte. Esse gênero carrega duas principais tradições. Uma delas são os trovadores medievais, cujos relatos passaram a ser impressos na época da renascença, entre os séculos 15 e 16.
No Brasil, nos chegou no século 19, pelas mãos dos portugueses - a Europa já estava toda conquistada pelo movimento renascentista. A poesia popular, contando de forma rimada 'causos' da vida cotidiana, enfrentou e ainda hoje enfrenta preconceitos. Mas, na verdade, carrega em si uma riqueza cultural sem tamanho.
Os folhetos de cordel contêm ilustrações chamadas xilogravuras. É a segunda tradição que o cordel carrega. Ao falarmos delas, saímos da Europa e vamos até a Ásia Oriental buscar a sua origem. A xilogravura é a arte de reproduzir no papel uma imagem talhada em uma madeira matriz. Remonta ao século 6 e provavelmente foi criada pelos chineses. Ainda não há afirmações categóricas dos historiadores.
J.Borges, um artista que reúne as duas técnicas - o cordel e a xilogravura, é reconhecido no mundo inteiro. Pernambucano de Bezerros. Desbravador da literatura de cordel no Sertão, que ganhou o mundo. “Era o jornalismo nosso”, diz ele em entrevista nesta edição. E continua até hoje desbravador, lutando contra o preconceito, descreve o Nordeste para o mundo e já deu aulas sobre a xilogravura e o cordel para vários países. Cordel, trovadores, gravuras, poesia, música, história, passado, presente e futuro. Um gênero artístico multifacetado, com forte presença da cultura popular e, ainda, faz bem à saúde.
Tentei trazer a você, leitor
Um pouco de uma paixão
Que faz parte da história
Perpetua a nossa memória
E tem exemplos de dedicação
Muito mais teria a dizer
Mas lhe desejo, a essa altura
Que tenha uma ótima leitura!

