Banco Master: o choque que reforça o papel do Fundo Garantidor de Crédito
A liquidação do Banco Master, decretada pelo Banco Central, provocou um abalo profundo no sistema financeiro nacional. A instituição, até então considerada uma alternativa rentável para investidores de renda fixa, saiu oficialmente do sistema financeiro após o BCB constatar sua incapacidade de honrar compromissos financeiros, especialmente com investidores de CDBs prestes a vencer.
Até então controlado por Daniel Vorcaro, o Master viveu uma trajetória que, à primeira vista, parecia de sucesso relativamente rápido. A instituição ganhou destaque oferecendo taxas de retorno agressivas, entre 130% e 150% do CDI, atraindo uma grande base de investidores em busca de rendimentos superiores aos dos grandes bancos.
No entanto, os bastidores revelavam um modelo de negócios altamente arriscado. O banco investia pesadamente em ativos de baixa liquidez e difícil precificação, como precatórios e créditos judiciais, e se tornava cada vez mais dependente de novas captações para honrar compromissos antigos.
O cenário desmoronou de vez quando Vorcaro, outros sócios e executivos foram presos sob suspeita de envolvimento em fraudes na venda de títulos de crédito falsos, ao passo que a liquidação extrajudicial foi inevitável. A liquidação decretada pelo Banco Central significou, na prática, sua retirada definitiva do sistema financeiro nacional.
Mais do que um episódio isolado, o caso simboliza os riscos de má gestão e de supervisão insuficiente em um ambiente de expansão acelerada de instituições financeiras no país. O escândalo também levanta uma importante questão: o sistema de fiscalização do Banco Central está preparado para monitorar um número crescente de bancos, fintechs e instituições de pagamento?
O colapso trouxe à tona a relevância de um pilar essencial da segurança financeira brasileira, o Fundo Garantidor de Crédito. É o FGC que garante a proteção dos investidores e o ressarcimento de valores em aplicações de até R$ 250 mil por CPF, com teto global de R$ 1 milhão a cada quatro anos.
Criado em 1995 e financiado pelos próprios bancos, o FGC é a principal âncora de segurança do investidor de varejo. Na liquidação, o fundo atua após a lista de credores ser homologada pelo liquidante nomeado pelo BCB.
A liquidação do Banco Master representa a maior já registrada no país, com R$ 34,4 bilhões em depósitos elegíveis. Embora o FGC disponha de R$ 121 bilhões em caixa, a operação pode consumir parcela expressiva desses recursos, exigindo eventual aumento das contribuições feitas pelas instituições financeiras.
E é aqui que surge um ponto crítico: esses custos tendem a ser repassados ao consumidor por meio do spread bancário, que já embute inadimplência, carga regulatória e tributos. Quanto maior a pressão sobre o FGC, maior o risco de encarecimento das operações de crédito, reduzindo a competitividade do ambiente de investimentos no país.
Casos como o do Master mostram que a atuação preventiva do regulador é essencial. Evitar novas liquidações mitiga riscos sistêmicos, preserva a capacidade do FGC e impede que o custo seja absorvido pela sociedade. Especialistas alertam que a velocidade de expansão do sistema financeiro supera a capacidade de fiscalização tradicional. O próprio BCB reconhece estar modernizando sua supervisão com ferramentas de análise de dados e inteligência artificial, mas o caso Master evidencia que o reforço deve ser célere.
O episódio confirma que, diante do crescimento acelerado de instituições financeiras, a supervisão deve ser robusta e autônoma, condição indispensável para manter a estabilidade, proteger investidores e sustentar a competitividade do mercado brasileiro.
A lição deixada pelo Banco Master é clara: estabilidade financeira é um bem público. Preservá-la exige equilíbrio entre inovação, liberdade de mercado e regulação firme. E o FGC cumpre papel decisivo nesse tripé, não apenas como instrumento de ressarcimento, mas como guardião da confiança que sustenta o investimento no Brasil.
----------------------------
Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião do jornal. Os textos para este espaço devem ser enviados para o e-mail [email protected] e passam por uma curadoria antes da aprovação para publicação.
*Fundador do Melo Bandeira Advogados e membro da Comissão de Direito Bancário da OAB/PE
