Sáb, 27 de Dezembro

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OPINIÃO

Humanidades e Letras

Entre as mais reputadas láureas da área cultural, os Prêmios Princesa de Astúrias, da Fundação Princesa de Astúrias, visam reconhecer o mérito de pessoas e entidades do mundo por trabalhos que resultem no engrandecimento da ciência, da cultura e do humanismo, nas seguintes categorias: Artes, Ciências Sociais, Comunicação e Humanidades, Concórdia, Cooperação Internacional, Desportos, Investigação Científica e Técnica e Letras.

Em relação à edição de 2025, vamos aqui ressaltar as mensagens que ecoaram de forma bastante positiva, em diversos lugares e meios das sociedades, dos discursos de dois galardoados com os Prêmios Princesa de Astúrias, em categorias diferentes, no dia da entrega da premiação, o último 24 de outubro, na cidade de Oviedo, no Teatro Campoamor, local em que o evento sempre ocorre. Em Comunicação e Humanidades, o filósofo, professor, pensador e escritor sul-coreano-alemão Byung-Chul Han (Seul, 1959). E em Letras, o linguista, escritor e dramaturgo catalão Eduardo Mendonza (Barcelona, 1943); vale salientar que este, anteriormente, foi agraciado com os destacados prêmios de literatura Planeta e Kafka.

O pensador Byung Chul-Han (o primeiro convocado na sessão para receber o prêmio), que também é um estudioso do legado do filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976), de significativa influência no século XX, é o autor, entre outros, do livro Sociedade do Cansaço (editora Vozes, 2015), sobre a condição humana no século XXI (impactos da autoexploração, exacerbação e tecnologia). De sua fala, resumimos:

- [...] Eu sou filósofo. Assim, internalizei essa definição socrática da filosofia. Meus textos de crítica social causaram irritação, semearam nervosismo e insegurança, mas, ao mesmo tempo, despertaram muitas pessoas. Com meu ensaio Sociedade do Cansaço, tratei de cumprir a função de filósofo, advertindo a sociedade e agitando a sua consciência para despertar.

- [...] Não vivemos mais em uma sociedade disciplinar em que tudo é regulado por proibições e mandatos, mas sim em uma sociedade de performance, que supostamente é livre e onde o que conta, presumivelmente, são as capacidades.

- [...] Você se imagina livre, mas, na verdade, o que você faz é explorar-se, voluntariamente, com entusiasmo, até colapsar.

- [...] Isso é uma ilusão de liberdade. A autoexploração é muito mais eficaz do que a exploração pelos outros, porque cria uma sensação enganosa de liberdade.

- [...] O smartphone não é um produto nosso; nós é que somos produto do smartphone. Muitas vezes os seres humanos acabam convertidos em escravos de suas próprias criações. As redes sociais também poderiam ser um meio para o amor e a amizade, mas o que predomina nelas são o ódio, as notícias falsas e a agressividade. Não nos socializam, ao contrário, nos isolam, nos tornam agressivos e nos roubam a empatia.

- [...] Não sou contra a Inteligência Artificial (IA). Pode ser muito útil se usada para fins bons e humanos. Mas também com a IA existe o enorme risco de que os seres humanos acabem se tornando escravos de sua própria criação. A IA pode ser usada para guiar, controlar e manipular pessoas. Portanto, a tarefa urgente da política seria controlar e regular o desenvolvimento tecnológico de forma soberana, em vez de simplesmente acompanhá-lo. A tecnologia sem controle político e técnicas sem ética podem assumir uma forma monstruosa e escravizar as pessoas.

- [...] Ultimamente, tenho pensado muito sobre a crescente perda de respeito na nossa sociedade. [...] Não existe vínculo social mais forte do que o respeito.

- [...] O mundo se assemelha a um gigantesco armazém, onde tudo se torna consumível. O fluxo infinito (infinite scrolling) promete informações ilimitadas. As redes sociais facilitam uma comunicação sem fronteiras. Graças à digitalização, estamos interconectados, mas ficamos sem relações e laços genuínos. A esfera social está em erosão. Perdemos toda empatia, toda atenção ao próximo. Os arroubos de autenticidade e criatividade nos fazem acreditar que desfrutamos de uma liberdade individual cada vez maior.

- [...] Algo não está certo em nossa sociedade. [...] É certo que irritei as pessoas. Mas, felizmente, não me condenaram à morte, e hoje sou honrado com a concessão deste belíssimo prêmio. Agradeço de coração. Muitíssimo obrigado.

Seguindo a cerimônia, o escritor Eduardo Mendoza, um sujeito espirituoso, aspecto que alinha à sua escrita, em seu singular discurso de agradecimento, expressou:

- Este prêmio não foi apenas uma surpresa, uma honra, uma alegria, mas também um incentivo para mim, porque, se eu não me olhar no espelho, ainda me considero uma jovem promessa da narrativa espanhola.

- A última coisa que se perde não é a esperança, mas a vaidade.

- Mas sei que não me premiaram, pois não mereço grande coisa, mas sim a minha obra literária, e uma obra literária é a soma de muitos fatores.

- Tive a sorte de nascer e crescer rodeado de livros e pessoas que liam para mim em voz alta, que colocaram à minha disposição uma ampla biblioteca, estimularam-me e guiaram-me.

- Na escola, recebi uma educação rígida, tediosa e opressiva. Tenazmente me incutiram as virtudes do trabalho, da economia e da seriedade, graças às quais me tornei preguiçoso, malgastador e um pouco gozador - três coisas ruins, em si mesmas, mas boas para escrever romances.

- Cresci em Barcelona, uma cidade de porte médio, quente e ensolarada, tranquila, trabalhadora e conservadora, berço de santos da infância e avós encantadores. Também uma cidade portuária, pervertida e canalha. Pesquisando em bibliotecas e arquivos, descobri que Barcelona tem um passado interessante, turbulento e criminoso, do qual me apropriei para escrever meus romances. As cidades, como os romances, pertencem a todos e a ninguém.

- O resto devo aos amigos, aos professores e às pessoas que me querem: minha esposa, meus filhos, minha família, meus editores, meus agentes, são tantos para nomeá-los […].

- Do que sobra, o mérito é meu. Já está bom de modéstia. Alguém me chamou de provedor de felicidade. É o melhor elogio que recebi em minha vida e gostaria que fosse isso, mesmo que ocorresse em doses homeopáticas. Mas se alguma felicidade eu dei aos meus leitores, eles me retribuíram em maior grau com sua lealdade, sua cumplicidade e seu carinho.

- Além disso, o tempo me fez valorizar, sobre todas as coisas, o respeito. E se alguma coisa me ensinaram, foi que tudo é relativo. Ou talvez não.

- Meu espaço de hora terminou. [...] expresso, mais uma vez, sinceramente comovido, minha gratidão.

Com o privilégio de termos transitado do Segundo Milênio (d.C.) e do Século XX para o Terceiro Milênio (d.C.) e o Século XXI; e, agora, cumprindo o primeiro quarto (¼) deste atual milênio e século, seguem os nossos desejos de Boas Festas a todas as pessoas. Que tenham um Ano Novo, 2026, e um novo segundo quarto de século, repletos de humanidades e letras, sucessos e paz!

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*ADMINISTRADOR DE EMPRESAS (UFPE), DA ASOCIACIÓN DE CERVANTISTAS (ES), DA ASOCIACIÓN INTERNACIONAL DE LECTORES Y COLECCIONISTAS DE DON QUIJOTE (MX), AUTOR DO LIVRO “SONHO IMPOSSÍVEL - O RECIFE E CERVANTES” (2024)

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