Seg, 15 de Dezembro

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opinião

Soberania nacional?

Autoridades brasileiras reclamam contra tarifas impostas pelos Estados Unidos a produtos brasileiros, argumentando que um dos motivos alegados pelo Presidente americano para justificar o aumento - perseguição do STF ao ex-presidente Bolsonaro - representaria uma interferência à soberania nacional.

Em paralelo a esse “fato”, instalou-se no Brasil uma controvérsia sobre se poderia (ou não) o Executivo aumentar, por decreto autônomo, a alíquota do IOF, se o Congresso poderia sustá-lo, no exercício de seu poder político, e se o STF, pela Relatoria do Min. Moraes, teria a última palavra sobre o tema, no âmbito de ações ajuizadas por partidos políticos e pela Advocacia da União.
 
Nesse passo, depois de se ver frustrada uma heterodoxa tentativa de conciliação, entre Executivo e Legislativo, como se deveres-poderes públicos fossem disponíveis, a ponto de serem objeto de eventual acordo entre os Poderes da República, o Min. Relator decidiu a questão, mantendo, em parte, o Decreto do Executivo.

A decisão do Min. Moraes é equivocada, visto que o aumento da alíquota, por Decreto do Executivo, teve fins arrecadatórios, e não extrafiscais, pelo que, a dita alteração, nessas circunstâncias, somente poderia acontecer mediante a edição de lei específica pelo Congresso Nacional.
Além disso, a decisão do Min. Moraes é contrária à Constituição por invadir a competência regulatória do Congresso, que, nesse caso, tinha o dever-poder de sustar os efeitos do ilegal decreto, ante o seu evidente desvio de finalidade.
Mas esse não é propriamente o tema da reflexão que quero provocar.
A questão sobre a qual chamo atenção diz respeito à
soberania!

É que vozes que estão a reclamar sobre as escolhas comerciais de um país estrangeiro, que decidiu taxar o Brasil por discordar do que classifica como violações judiciais a princípios que lhe são caros, nada dizem ou, de alguma maneira, até patrocinam, a dura violação à soberania popular, que aconteceu nesse caso do IOF, consubstanciada no decreto ilegal, assim como na cassação da expressão e do livre exercício da representação parlamentar.

Não pode o Executivo dispor, por decreto, sobre matéria reservada à lei, muito menos pode um juiz, ou um burocrata de qualquer escalão, que jamais recebeu sequer um único voto na vida, sobrepor a sua vontade, visão de mundo ou posição política, às deliberações do poder parlamentar, eleito pela população para representar a sua vontade.
 
Dessa maneira, autoridades brasileiras, antes de “apontar o dedo” a estrangeiros que, no contexto de suas próprias decisões, escolhem sancionar o nosso país, ante os ecos dos atos autoritários que por aqui têm ocorrido, precisam, elas mesmas, aprender a respeitar a soberania popular, que resta vilipendiada sempre que uma autoridade exorbita o que lhe determina a lei como parcela de competência e dever legal.

Soberano é o povo, e é dele, unicamente dele, que emana toda forma de poder, que somente em seu nome pode ser exercido.

Fora disso, o que resta é a narrativa incoerente de gente que diz querer mudar o mundo, mas não se digna sequer a arrumar a própria cama.
 
 


* Sócio do GCTMA Advogados, procurador aposentado do estado de Pernambuco, conselheiro de Administração/IBGC.

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