Sáb, 27 de Dezembro

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OPINIÃO

Sorridente, entre tanques e ditadores, Lula envergonha a diplomacia brasileira

Às vezes, uma imagem vale mais do que um acordo comercial, uma conferência de paz ou dez discursos na ONU. A de Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil, em pé na Praça Vermelha, cercado de tanques, mísseis e ditadores, é uma dessas imagens. Porque, determinadas as imagens sequer permitem desculpas — elas mostram escolhas. E a de Lula foi feita.

Enquanto o mundo assiste, perplexo, à destruição da Ucrânia, ao exílio de dissidentes russos, à repressão na Venezuela e aos julgamentos simulados em países onde a Constituição virou peça decorativa, Lula apareceu abraçando Vladimir Putin.

Naquele dia, ele parecia o embaixador honorário do cinismo.

Talvez a melhor forma de explicar o que vimos seja a seguinte: imagine que, em 1939, Getúlio Vargas tivesse ido pessoalmente a Berlim para assistir à parada militar das tropas nazistas, logo após a invasão da Tchecoslováquia — sob o pretexto de “autodefesa do povo germânico”. Seria uma afronta à ordem internacional.

Ou, para trazer a metáfora para tempos mais recentes, é como se, em 1995, o presidente Fernando Henrique Cardoso tivesse ido pessoalmente a Belgrado para assistir a uma parada militar ao lado de Slobodan Milošević — poucos dias depois do massacre de Srebrenica. Seria impensável. Mas foi exatamente isso que Lula fez, ao sorrir na Praça Vermelha ao lado de Putin enquanto a Ucrânia sangra.

Lula sabia o que estava fazendo. Isso não foi um tropeço. Foi uma afirmação. Em vez de se posicionar como um estadista de um país importante, ele escolheu ser mais um figurante entre autocratas do século XXI. E que turma estava lá! Nicolás Maduro, Teodoro Obiang, Abdel Fattah al-Sisi, Xi Jinping — todos com currículo robusto em repressão, aparelhamento do Estado e, claro, corrupção.

Sim, corrupção. Porque há um padrão: onde as liberdades são tolhidas, onde a imprensa é controlada, onde a alternância de poder é vista como fraqueza, ali também há uma elite que enriquece enquanto o povo empobrece. São regimes que se sustentam não apenas pelo medo, mas pela distribuição estratégica de favores, contratos e cargos. Um ambiente onde Lula parece cada vez mais confortável.

Aliás, muito longe de “o cara” como foi saudado por Barack Obama em 2009.

Ao longo de sua história, a exceção dos governos do PT, o Brasil tem buscado, com altos e baixos, uma inserção internacional que combine pragmatismo com valores: defesa da paz, soberania dos povos, respeito ao direito internacional. Foi assim na Assembleia Geral da ONU, foi assim nas negociações comerciais da OMC, foi assim quando a Força Expedicionária Brasileira lutou na Itália, ao lado dos Aliados, contra o fascismo. Não por acidente, mas por escolha.

Ao violar o artigo 4º da Constituição — aquele que consagra os princípios da política externa brasileira, como a solução pacífica dos conflitos e a prevalência dos direitos humanos e da autodeterminação dos povos — Lula não apenas traiu a letra da Carta, mas seu espírito. Ele não foi à Rússia para mediar nada. Foi para posar ao lado de tanques e mísseis. E, num mundo em que Putin monstruosamente ataca escolas, hospitais e cidades, esse gesto não é ambíguo. É eloquente.

A tragédia dessa história é dupla. Primeiro, porque o Brasil perde. Isola-se das democracias, mina sua credibilidade e reduz sua margem de manobra, principalmente, nessa era da incerteza. Segundo, porque o próprio Lula se apequena, ainda mais. Tinha a chance de ser um “moderador global” — preferiu o papel do figurante entusiasmado num teatro de autoritarismo e propaganda.

No fim das contas, cada gesto de um líder conta uma história. E a história que Lula contou na Praça Vermelha não foi a de um Brasil soberano e altivo. Foi a de um líder que, diante de um tirano criminoso, escolheu bajular. Talvez por oportunismo. Talvez por conveniência. Ou talvez porque, cercado de tanques e autocratas, ele finalmente se sentiu em casa.

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