Vinte pessoas morrem perto de centro de distribuição de ajuda na Faixa de Gaza
Local é administrado por controversa fundação humanitária apoiada pelos EUA e Israel, cuja operação no enclave é questionada pelas Nações Unidas
Vinte pessoas morreram em um tumulto perto de um centro de distribuição de ajuda humanitária no sul da Faixa de Gaza, controlado por uma fundação apoiada por EUA e Israel, mas cujo trabalho no enclave é alvo de críticas de vários governos e das Nações Unidas.
De acordo com a Fundação Humanitária de Gaza (GHF, em inglês), “19 vítimas morreram pisoteadas e uma foi esfaqueada no meio de um tumulto caótico e perigoso”, provocado, segundo a organização, “por agitadores, dentro da multidão".
"Temos razões críveis para acreditar que elementos dentro da multidão - armados e vinculados ao Hamas - fomentaram deliberadamente o tumulto", acrescentou a organização em comunicado, que alegou ter identificado armas de fogo entre as milhares de pessoas que se aglomeravam diante do centro em Khan Younis.
O texto ainda afirma que um dos seguranças americanos que estavam no local foi ameaçado.
A GHF não apresentou evidências de suas alegações, que foram contestadas por autoridades locais e médicos que atenderam as primeiras vítimas. Segundo um profissional do Hospital Nasser, em Khan Younis, ouvido pela agência AFP, as vítimas encontraram o portão de entrada do centro de distribuição de ajuda fechado.
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— As forças de ocupação israelenses e os agentes de segurança privada do centro abriram fogo contra as pessoas, provocando um número elevado de mortos e feridos — disse o profissional do Hospital Nasser à AFP.
Em relato à rede al-Jazeera, um sobrevivente confirmou que o portão do centro de ajuda estava fechado, e acusou militares americanos, que atuam como seguranças dos locais mantidos pela GHF, de atirarem gás lacrimogêneo contra a multidão, “o que causou uma debandada e muitas pessoas morreram enquanto eram esmagadas”.
Uma outra testemunha, em relato à rede CNN, afirmou que algumas pessoas conseguiram abrir um portão lateral do centro de distribuição, mas que quando os seguranças perceberam, começaram a jogar spray de pimenta na multidão.
— As pessoas caíram umas sobre as outras e todos que estavam atrás pisaram nas pessoas da frente. As pessoas estavam sufocando e morrendo — afirmou o homem.
Em comunicado, o Ministério da Saúde de Gaza disse que ao menos 15 pessoas morreram pisoteadas e sufocadas pela multidão após o início do tumulto.
O incidente em Khan Younis é mais um em uma longa lista de tragédias e mortes envolvendo a distribuição de alimentos pela GHF, uma fundação que conta com financiamento americano, apoio (inclusive militar) israelense e seguranças vindos dos EUA.
Em meio ao bloqueio quase total à entrada de ajuda em Gaza, a GHF é uma das raras fontes de alimentos e insumos básicos a uma população faminta e, como declarou mais de uma vez a ONU e organização de defesa dos direitos humanos, à beira da catástrofe.
Contudo, desde o início da operação, em maio, cerca de 900 pessoas morreram em incidentes como o desta quarta-feira, em sua maioria perto dos centros da fundação, de acordo com números das Nações Unidas — no mês passado, o chefe da agência da ONU para os refugiados palestinos (Unrwa), disse que a GHF “é uma abominação que humilha e degrada pessoas desesperadas”, e que é “uma armadilha mortal que custa mais vidas do que salva”.
Ao todo, são apenas quatro centros responsáveis por atender cerca de 2 milhões de pessoas. Em comparação, o formato liderado anteriormente pela ONU e organizações humanitárias contava com mais de 400 pontos de distribuição.
— Este é um mecanismo para matar — disse ao jornal britânico Guardian o diretor-geral para os hospitais de Gaza, Mohammed Zaqqout. — Ninguém arriscaria a vida a menos que estivesse morrendo de fome e não se importasse em morrer tentando conseguir algo para comer. Este é o pior tipo de humilhação que um ser humano pode sofrer.
Em resposta, a GHF afirma que não tem responsabilidade sobre as mortes, e garante que opera de maneira independente para garantir a entrega segura e contínua de ajuda à população, de acordo com as leis internacionais.

