Eduardo Bolsonaro mantém os direitos políticos se perder o mandato por faltas? Entenda
Abandono do cargo, contudo, pode ser enquadrado como quebra de decoro parlamentar, que acarreta inelegibilidade
O afastamento do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) termina no próximo domingo (20), totalizando 122 dias de licença. Caso o parlamentar abandone o mandato, ele perderá benefícios como foro privilegiado, auxílio-moradia e o salário de R$ 46.366,19 — maior remuneração do serviço público no país.
Eduardo anunciou a medida em março, e se mudou para os Estados Unidos com a alegação de que ele e seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, estariam sendo submetidos a uma perseguição no Brasil. Se o deputado licenciado não retomar suas funções, a ausência deixa de ser justificada e passa a contar como falta.
A licença de Eduardo não é prorrogável. Para não perder o mandato, um parlamentar não pode faltar mais de um terço das sessões da Câmara em um ano, conforme a Constituição Federal. Após isso, a perda do mandato passa a poder ser declarada pela Mesa Diretora da Câmara, com direito a ampla defesa.
O processo pode ocorrer por ofício, mediante provocação de qualquer parlamentar e, ainda, por pedido de algum partido representado no Congresso Nacional. Membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/SP, a advogada Izabelle Paes afirma que uma eventual cassação não faria com que Eduardo perdesse os direitos políticos de imediato.
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— A perda do mandato eletivo, seja por ausência injustificada às sessões (abandono de cargo), seja por quebra de decoro, não acarreta, por si só, a perda dos direitos políticos do parlamentar, que permanece apto a votar e exercer os demais atos da vida civil — afirma.
O Código de Ética da Câmara, contudo, prevê que deixar de realizar "intencionalmente os deveres fundamentais" do cargo e tentar fraudar o registro de presença são práticas que atentam contra o decoro parlamentar. Conforme a Lei da Ficha Limpa, a cassação por quebra de decoro proíbe futuras candidaturas por todo o resto do mandato e pelos oito anos seguintes.
Especialista em Direito Eleitoral pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), Marcos Jorge também ressalta que a perda do mandato decorrente do não retorno da licença por interesse particular, como é o caso de Eduardo, não impede sua capacidade de votar e ser votado.
— A suspensão ou cassação dos direitos políticos é uma sanção mais grave e ocorre em situações específicas, como por exemplo, em casos de condenação criminal transitada em julgado ou improbidade administrativa com imputação de suspensão dos direitos políticos — explica.
Aliados de Eduardo tem discutido com ele uma alternativa para não abrir mão do mandato, conforme informou a coluna da Malu Gaspar, na terça-feira. Interlocutores sustentam a tese de que o prazo de 120 dias não contabiliza os dias em que o Legislativo está de recesso.
A pausa começa nesta sexta-feira, dia 18, e termina no dia 1° de agosto. Por essa razão, a licença expiraria em 4 de agosto — e não no próximo domingo, dia 20, como previsto —, o que daria a Eduardo mais uns dias para definir o que fazer.
Segundo o Art. 15. da Constituição Federal, a perda ou suspensão de direitos políticos só se dará nos casos de:
Cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;
Incapacidade civil absoluta;
Condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
Recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa;
Improbidade administrativa.
O que diz Eduardo?
Quando se afastou, Eduardo também utilizou como argumento a possibilidade do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal ( STF), determinar a sua prisão. No entanto, ele não foi indiciado nem denunciado pela Procuradoria-Geral da República ( PGR) na investigação sobre a trama golpista, que apresentou o pedido de condenação de Bolsonaro e outros sete réus do "núcleo crucial" na segunda-feira.
O deputado afirmou, à época, que outra razão para a licença seria "buscar as devidas sanções para os violadores dos direitos humanos". Na quarta-feira passada, Donald Trump anunciou uma tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros alegando estar insatisfeito, principalmente, com a postura do Supremo e o julgamento de Bolsonaro.
Logo após o anúncio do presidente americano, Eduardo elogiou a medida. O deputado licenciado afirmou que o Congresso precisa aprovar uma "anistia ampla" aos envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro para que a questão seja solucionada.
Nesta segunda-feira, o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), enviou uma petição ao STF para pedir a apreensão do passaporte diplomático de Eduardo. No documento, o petista também pediu a prisão preventiva do parlamentar por conta da "articulação internacional contra o Estado de Direito".
Ao GLOBO, Eduardo afirmou, na segunda-feira, que não pretende abrir mão do próprio mandato e que é possível que ele seja a cassado "por faltas". Ele declarou, ainda, que está fora do país "por um motivo, com propósito", e não irá "colaborar com um sistema que quer me prejudicar".
Benefícios como deputado
Assim como o presidente da República, governadores, ministros e outros membros do poder público, Eduardo também conta com o chamado foro privilegiado (imunidade parlamentar), que estabelece que deputados federais podem ser julgados apenas pelo STF para "proteger os julgadores contra eventuais pressões que autoridades possam exercer nas instâncias inferiores", segundo a Câmara.
Em março deste ano, o Supremo estabeleceu que o foro privilegiado de um político fica mantido na Corte se o crime tiver sido cometido durante o exercício da função de parlamentar — mesmo em caso de de renúncia, não reeleição ou cassação. A condição só não é aplicada em caso de delitos praticados "antes da investidura no cargo ou dos que não possuam relação com o seu exercício".
Outro benefício é o princípio da inviolabilidade do mandato: "a partir da diplomação, o deputado passa a ser inviolável, civil e penalmente, por suas opiniões, palavras e votos, e só poderá ser preso em caso de flagrante de crime inafiançável, circunstância em que a Câmara, por maioria de votos, deverá decidir sobre a prisão em até 24 horas", diz o portal do Congresso.
Confira valores:
Salário de R$ 46.366,19 por mês;
R$ 133.170,54 por mês para pagar secretários parlamentares;
R$ 4.253,00 mensais como auxílio-moradia;
R$ 42.837,33 de cota parlamentar;
Imunidade parlamentar (foro privilegiado);
Inviolabilidade do mandato.

