Qui, 18 de Dezembro

Logo Folha de Pernambuco
Política

"Lula precarizou a condição dos médicos", dispara Allan Garcês

Médico especializado em Ortopedia e Traumatologia, o deputado federal busca uma mudança que pode ser significativa para sua categoria: o exame de proficiência médica

Allan Garcês (D) foi o entrevistado da semana no podcast "Direto de Brasília"Allan Garcês (D) foi o entrevistado da semana no podcast "Direto de Brasília" - Foto: Reprodução/Youjtube Folha de Pernambuco

Médico especializado em Ortopedia e Traumatologia, o deputado federal Allan Garcês (PP-MA) cumpre o primeiro mandato em Brasília buscando uma mudança que pode ser significativa para sua categoria: o exame de proficiência médica. Elaborado nos moldes da avaliação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), colocaria o Conselho Federal de Medicina para avaliar os profissionais e conceder um certificado de atuação. O projeto de lei tramita na Câmara dos Deputados e, caso aprovado, poderá causar uma revolução na categoria.

Depois de mais de 30 anos como médico, o que o levou a entrar na política?
Às vezes o pessoal diz que a pessoa foi picada pela mosca azul. Eu trabalhei 30 anos na assistência como médico e estou na política há dois anos. Também sou professor da Universidade Federal do Maranhão e, certa vez, fiz um comentário para os alunos de que estava muito chateado com as condições de trabalho. Eles me incentivaram a fazer um movimento político. Acabamos reunindo cerca de 600 alunos da área da saúde e fizemos uma marcha. Naquele momento, acho que eu fui picado pela mosca azul e acabei gostando (risos). E agora me vejo hoje no cenário político como uma pessoa que pode fazer a diferença para o Maranhão, pode ajudar na saúde e na educação, e essa condição faz com que a gente acabe se envolvendo, a cada dia mais, com a política.

Como surgiu a iniciativa do exame de proficiência médica? Acredita que a qualidade dos médicos que se formam hoje é muito duvidosa?
Foi motivado pelo cenário atual que a gente está vivendo no Brasil. Nos últimos anos, foram abertas inúmeras escolas médicas, muitas sem as mínimas condições de oferecer um curso de formação médica, de capacitação para uma profissão extremamente importante. Com isso, vieram os profissionais mal formados, o que foi sendo detectado pelo Conselho Federal de Medicina. Então, reunido com o meu colega, o deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), elaboramos o projeto. Estava no momento. Acho que pode ser semelhante ao que acontece com a OAB.

Então teria os mesmos rigores do exame da Ordem?
Eles fazem uma rigorosidade mesmo. Na medicina também vai ser.

Fala-se muito que o Brasil não tem médicos suficientes, um exame desses não prejudicaria ainda mais o número de profissionais?
Esse exame que avalia o médico traz uma segurança maior. O médico só vai ganhar registro se passar no exame de proficiência. E o Conselho Federal de Medicina tem estudos sobre a formação precária de algumas escolas médicas. Só para ter uma ideia, no Brasil hoje nós temos 436 escolas médicas. A proporção de médicos está acima do que é preconizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que estabelece um médico para cada mil habitantes. No Brasil, estamos com 2,8, quase três médicos para cada mil pessoas; então temos uma quantidade médica que dá para dar um suporte para o nosso Brasil.

Então já seria suficiente?
O que existe no Brasil é uma má distribuição dos médicos. Tem muitos médicos concentrados em um determinado local, como no Sudeste e do Sul, e poucos médicos concentrados em outros locais, como na região Norte. O que tem que ter é uma forma de colocar esses médicos mais bem distribuídos no território nacional. E, mesmo assim, as escolas médicas continuam sendo abertas. Um detalhe importante é que, dessas 436 escolas médicas, cerca de 64% são escolas médicas de universidades privadas, particulares.

Então podemos dizer que mercantilizou o ensino da medicina?
Infelizmente é isso mesmo. Hoje, do jeito que está, a gente não pode garantir, mas, a partir do momento em que for instituído o exame, o médico vai ter que ter uma pontuação mínima para alcançar o seu registro no Conselho Federal. A gente acredita que, com isso, profissionais bem formados futuramente serão os mais capacitados para cuidar do nosso povo brasileiro. Nossa preocupação é com os egressos que estão saindo agora, depois dessa abertura desenfreada que aconteceu das escolas médicas.

Essa abertura veio do governo Lula?
Exatamente. Ele precarizou a condição dos médicos, por conta de abrir de forma desenfreada e estimular esse mercado. Na sua maioria, os médicos costumam ser pessoas acolhedoras, atenciosas. Mas, como em toda profissão, existem os maus profissionais, que não dão atenção, não olham nem nos olhos do paciente. Com o exame de proficiência médica, a gente quer proteger, não a nossa categoria de médicos, mas o povo dos maus médicos formados.

E não há fiscalização para a abertura dessas faculdades de medicina?
Você colocou a questão do mercantilismo da profissão. A escola que abre em condição deficiente, talvez até sabendo que está deficiente, pode estar mostrando que o que mais importa não é a formação dos egressos, mas sim a condição de que eles podem pagar pelo curso. Infelizmente essa é a realidade. De 2015 a 2018, cerca de 99 escolas foram abertas. E, em 2023, sete mil médicos foram formados em escolas que têm avaliação um e dois, onde a maior nota é cinco. Olha que situação. Então a gente vê a necessidade de regular esse mercado, assim dizendo, colocando pessoas competentes, com formação de qualidade para cuidar da vida humana.

Um grande embate dessa categoria com os governos do PT foi a questão dos médicos cubanos que vieram para o Mais Médicos. Como avalia?
Eu estava no Ministério da Saúde no governo Bolsonaro, era diretor de Articulações Interfederativas, cuidava dos conselhos nacionais de secretários de Estado e municipais. Fiquei encarregado de desenvolver uma avaliação dos médicos cubanos. Bolsonaro fechou a porta para a entrada deles, diferentemente do governo Lula, que abriu e vieram 13 mil médicos cubanos para o Brasil. E o que a gente detectou é que realmente muitos também eram de baixa qualidade.

Não foi questão de preconceito?
O que a gente apurou também é que existia uma exploração dos médicos cubanos, um regime de semiescravidão. Eles ganhavam R$ 10 mil, mas ficavam com R$ 2 mil. Ou seja, R$ 8 mil iam para o governo cubano. Era uma forma do Brasil também incrementar a ditadura de Cuba.

Sobre essa questão das universidades, não seria mais eficiente fiscalizar essas unidades para que elas tivessem mais relevância na hora de formar os profissionais?
O Ministério da Educação (MEC) tem esse controle. Só que o MEC não está fazendo nada quando detecta que determinada escola está formando mal o egresso. O MEC tem três ferramentas, entre elas o Enade, que avalia as escolas médicas e cria um ranking, mas não tomou nenhuma atitude, nenhum tipo de sanção. Depois, o Enare, que avalia o aluno para a residência médica. E agora veio o Enamed, que avalia o aluno e foi criado depois que o nosso projeto de lei começou a tramitar na Câmara Federal. É como se o governo federal estivesse tomando alguma atitude para descredibilizar essa ferramenta que é do Conselho Federal de Medicina, que avalia o aluno.

Não seria por invasão de competências?
O MEC tem a prerrogativa de avaliar, de fechar e abrir cursos. A prerrogativa do Conselho Federal de Medicina é promover um médico bem formado, a qualificação desse médico, a qualidade desse médico na sua formação. Então ele se preocupa com a condição do médico enquanto profissional, poder exercer a sua profissão. O exame de proficiência médica é apenas para avaliar as competências, as técnicas, o conhecimento, a habilidade médica, não para avaliar o curso. O Conselho Federal de Medicina não vai propor o fechamento de curso com as notas dos médicos que não conseguirem passar no exame. Isso é prerrogativa do MEC. Então o MEC tem um raio-x das universidades, das escolas privadas que estão deficientes, mas não toma posição.

Um assunto muito sensível é o erro médico. Qual sua visão sobre esse tema?
Quando existe o erro médico, a primeira coisa é o nexo causal. Tem que se comprovar que realmente houve falha, e aí quem foi que deu a causa. Porque, às vezes, a causa é até do paciente. Um médico recomenda que ele tome um remédio de oito em oito horas, durante sete dias, e o paciente não segue, toma uma vez por dia, por três dias e suspende. E se for um antibiótico, ele pode estar favorecendo a proliferação bacteriana. Nesse cenário, quem foi o errado? O paciente, que, em vez de melhorar, piora e vai dizer que foi o médico que passou aquele remédio. Então, tem que ver com atenção e muita cautela. Deixando bem claro que não estou defendendo a classe médica, embora seja dela, mas que a gente tem que ver os dois lados.

Veja também

Newsletter