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Monitorado pela "Abin paralela", servidor do Ibama comandava operações contra garimpo

Hugo Ferreira Netto Loss acredita que a espionagem foi feita para levantar informações sobre as ações ambientais que planejava contra garimpeiros e madeireiros na região amazônica.

AbinAbin - Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Um dos alvos monitorados pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) paralela, o servidor do Ibama Hugo Ferreira Netto Loss chefiava ações de combate ao garimpo e ao desmatamento, que, segundo ele, estavam "na contramão dos interesses políticos de Jair Bolsonaro".

A Polícia Federal realiza nesta quinta-feira a 4ª fase da Operação “Última Milha”, contra o suposto esquema de arapongagem realizado pela Abin durante a gestão do ex-presidente.

Em entrevista ao GLOBO, Loss acredita que a espionagem se deva a uma suposta tentativa do então governo de obter informações privilegiadas sobre as ações contra garimpeiros e madeireiros ilegais comandadas por ele.

À época, ele foi exonerado do cargo de coordenador de Operações de Fiscalização do órgão ambiental e deixado na "geladeira".

"Existia uma política ambiental desastrosa por parte do governo Bolsonaro, em ataques repetidos e voltados para a desestruturação dos órgãos de controle ambiental, por exemplo. Talvez isso justifique o interesse pela minha vida pessoal, como uma forma de saberem mais sobre as operações que vinha conduzindo ", pondera o fiscal do Ibama.

Segundo a PF, a justificativa para a utilização do aparato de inteligência estatal contra Loss e outros servidores do Ibama é de que eles estariam "dando trabalho" à gestão, justamente por "cumprirem seus deveres no combate aos crimes ambientais, inclusive em operações da própria Polícia Federal".

"As ações clandestinas realizadas contra os servidores do Ibama, portanto, reforçam a premissa do direcionamento dos recursos humanos e materiais da Abin, inclusive do sistema FirstMile para atacar opositores do núcleo político", diz um trecho do documento divulgado nesta quarta-feira a pedido do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.

Em fevereiro deste ano, sob a gestão da ministra Marina Silva, Loss foi reconduzido ao cargo. O analista ambiental também disse que pedirá reparação dos danos.

"Fiquei 414 dias impedido de ir para a Amazônia após as ações de combate ao garimpo e grilagem em terras indígenas. Tomarei as medidas cabíveis para a reparação das ações de assédio executadas por integrantes do governo Bolsonaro ", afirmou.

Ação contra o garimpo
Servidor de carreira do Ibama, Loss coordenou uma ação contra garimpos em terras indígenas no sul do Pará. Durante as operações, fiscais do órgão ambiental destruíram maquinários utilizados pelos criminosos, incluindo a queima de equipamentos que não puderam ser retirados das áreas de reserva.

Apesar de previsto na legislação, o procedimento dos fiscais de queimar os equipamentos, contudo, era motivo recorrente de reclamação de Bolsonaro. Após uma ação em novembro de 2019, também no sul do Pará, o então presidente chegou a sugerir a um grupo de garimpeiros que tomaria providências caso a prática continuasse.

"Quem é o cara do Ibama que está fazendo isso no estado lá? Se me derem as informações, eu tenho como... — disse ele sem concluir a frase aos garimpeiros que o abordaram na entrada do Palácio da Alvorada."

"Abin paralela"
A Polícia Federal realiza nesta quinta-feira a 4ª fase da Operação Última Milha, que busca desarticular uma organização criminosa voltada ao monitoramento ilegal de autoridades públicas e à produção de notícias falsas, utilizando-se de sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Foram expedidos cinco mandados de prisão preventiva e sete mandados de busca e apreensão pelo Supremo Tribunal Federal, nas cidades de Brasília/DF, Curitiba/PR, Juiz de Fora/MG, Salvador/BA e São Paulo/SP. Até o momento, quatro pessoas foram presas e uma ainda não foi localizada.

O uso do programa espião FirstMile foi revelado pelo GLOBO.

Entre os alvos da ação, estão ex-servidores cedidos para Abin e influenciadores digitais que trabalhavam no chamado "gabinete do ódio" do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Quatro prisões já foram efetuadas: Giancarlo Gomes Rodrigues; Matheus Sposito, que foi assessor da Secretaria de Comunicação Social (Secom) na gestão passada; Marcelo de Araújo Bormevet; e Richards Dyer Pozzer.

Nesta fase, as investigações revelaram que membros dos três poderes e jornalistas foram alvos de ações do grupo, incluindo a criação de perfis falsos e a divulgação de informações sabidamente falsas. A organização criminosa também acessou ilegalmente computadores, aparelhos de telefonia e infraestrutura de telecomunicações para monitorar pessoas e agentes públicos.

"Os investigados podem responder, na medida de suas responsabilidades, pelos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, interceptação clandestina de comunicações e invasão de dispositivo informático alheio", informou a PF, em nota.

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