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Dia do Cacau: chocolate é o dono da festa

Na riqueza gastronômica em que o chocolate se desenvolveu ao longo dos séculos, ele chega no Dia Nacional do Cacau, em 26 de março, com a força de um veterano à mesa.

Chocolate em pó é  facilidade  a mão do  cozinheiroChocolate em pó é facilidade a mão do cozinheiro - Foto: Ed Machado/Folha de Pernambuco

O bom chocólatra sabe que 26 de março reforça o pretexto para consumir um dos produtos mais democráticos e sedutores do mundo. Mas antes de dar a primeira mordida num chocolate, nesse Dia Nacional do Cacau, perceba que ele já não é o mesmo daquele período de sobremesas reconfortantes da casa da vovó. Ganhou versões, passou pelo raio gourmetizador e até despertou algumas polêmicas nutricionais. Um case perfeito da culinária mundial, que acumula versatilidade desde os povos antigos.

Origem do fascínio
Embora a história do chocolate tenha muitos enigmas, sua origem remete à civilização olmeca, no México, onde se iniciaram os vestígios de plantações do cacau, que vão da América Central até a região tropical da América do Sul, ainda em 1.200 a.C. Logo, as sementes do fruto foram aproveitadas pelos maias na produção de uma bebida considerada sagrada, feita ainda com adição de baunilha e pimenta.

Em um dos seus livros, o confeiteiro francês Pierre Hermé lembra que os astecas, esses guerreiros nômades que se instalaram no alto do México, se tornaram consumidores fanáticos. “Mas só os nobres tinham o direito de se regalar com a luxuosa bebida chamada por eles de tlaquetzalli, ou coisa preciosa”, diz um trecho. O cacau era uma mercadoria rara naquela região, então qualquer produto em sua volta tinha extremo valor comercial. Só a partir do domínio da Espanha sobre os maias, a fruta foi introduzida na Europa até que, ainda segundo os livros, os suíços fizeram as primeiras receitas com o uso do leite, originando o chocolate encontrado hoje no mercado.

Derivado do cacau
Pouca gente saberia descrever o sabor do produto responsável por tudo isso. Nas feiras recifenses ele não é alimento dos mais populares. Daqueles em que se abre a casca amarelada para aproveitar a polpa branca e carnuda, levemente ácida, sobre suas tantas sementes. Ainda assim, o cacaueiro segue muito bem adaptado, obrigado, ao clima quente e ao solo úmido baiano, mais precisamente o de Ilhéus, seguido pelo Pará. Este último, aliás, é considerado o maior produtor nacional, com uma produção estimada em mais de 100 mil toneladas, no ano passado, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

No Brasil, o período de colheita vai de abril a julho. É quando o fruto sai maduro e suas sementes e polpas passam por um processo de fermentação até serem finalmente expostas ao sol e, em seguida, levadas para a torrefação, assim como acontece com os grãos de café. Na Bahia estão instaladas inúmeras fábricas, principalmente de famílias tradicionais, que mantêm a essência do processo artesanal.

Ingrediente perfeito
Nas prateleiras do mercado, ele chega arrebatador. “Preparado cuidadosamente, o chocolate é alimento salutar e agradável”, resume o gastrônomo Brillat Savarin, em seu livro “Fisiologia do Gosto”, ainda em 1825. Quando descamba para as cozinhas da atualidade, surgem versões em calda, recheios, coberturas e ganaches que mostram a versatilidade de quem já não é o mesmo doce de antigamente.

Tentação é ver chocolate nas várias camadas de um bolo

Tentação é ver chocolate nas várias camadas de um bolo. Este é da pâtissière Anna Corinna   - Crédito: Ed Machado/Folha de Pernambuco

Segundo a pâtissière Anna Corinna, o consumidor passou a apreciar e estudar mais o produto. “As pessoas estão criteriosas e não querem mais encontrar aquela gordura hidrogenada na composição. Cada vez mais, elas procuram a presença do cacau de olho nas questões de saudabilidade”, afirma. Quando o nível de conhecimento aumenta, a complexidade das técnicas se faz presente. “Antigamente, era comum derreter o chocolate, como num processo de banho-maria, e fazer o bombom. Mas ele precisa passar pela etapa de temperagem, que é o modo correto de esquentar e esfriar para ter um resultado de qualidade”, completa, apontando para as espátulas sobre um balcão de pedra, onde manuseia todo o líquido que cobrirá um bolo feito sob encomenda.

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Contexto para criar ainda barras, bombons, recheios e trufas. Essa última é a mais desafiadora, ainda segundo a chef pâtissière. “Ela faz uma alusão às trufas de colheita, então precisa ser recheada com a cremosidade da ganache, que tradicionalmente leva creme de leite fresco. Muita gente já começa errado daí, sem falar no estudo milimétrico da quantidade de gordura desse leite e da manteiga, que pode pesar no resultado final”, destaca.

No Brasil, o paladar está acostumado ao sabor doce, mas, no México, onde é creditada a sua origem, é comum ele aparecer em pratos salgados. Nesse caso, o chocolate utilizado é mais amargo e tem, no mínimo, 70% de cacau. A dica dos cozinheiros nesse tipo de receita agridoce é preparar um caldo que recai sobre carnes vermelhas mais gordurosas, como um lombo de porco. Os franceses até gostam de utilizá-lo no preparo de risotos e massas servidos na hora do almoço.

Sabia que...

*Estudos apontam que o consumo de chocolate amargo ajuda a prevenir câncer do intestino, além de fazer bem ao coração

*Chocolate e vinho é uma harmonização difícil. Mas muitos sommeliers seguem a linha de que a versão amarga pede um vinho tinto, encorpado e com teor de açúcar mais elevado. Se você pensou num vinho do Porto, acertou!

*O chocolate branco é feito com a manteiga do cacau misturada com leite e açúcar. Muitos nem consideram este um chocolate de verdade

*A Suíça é um dos maiores consumidores mundiais. Por lá, cada cidadão consome a média de 10kg do produto por ano

*As famosas nibs são as sementes de cacau depois do processo de fermentação, secagem e torra. Por terem menos etapa de processamento, possuem sabor mais intenso

* Que os ovos de Páscoa representam fertilidade e renascimento, todo mundo já sabe. É tradição das antigas civilizações que só ganhou o sabor doce do chocolate por volta do século 20, quando as sensações de prazer e bem-estar foram associadas ao ato de presentear alguém com um doce

Call me Ruby

Das variações no mercado, o chocolate rosa tem chamado atenção. Batizado de Ruby, ele foi patenteado pela empresa suíça Barry Callebaut, que classifica o produto na quarta geração, após as versões ao leite, branco e amargo. Sem abrir os detalhes, a empresa afirma apenas que não se trata de uma adição de corante, mas, sim, de uma variação da semente do cacau encontrada em países como Brasil, Equador e Costa do Marfim. Resulta num sabor ácido e levemente frutado. 

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