O quentão de São Pedro
Hoje é véspera de São Pedro. Amanhã acabam os festejos juninos. Estou triste, gosto demais. Sobretudo das lembranças de infância e juventude. Nasci na véspera de Santo Antonio e lá em casa, nesse dia, minha mãe sempre fazia uma fogueira. Repetida no dia de São João. Fogos lançados pelos adultos, com muito cuidado. Comprados nas barracas espalhadas pelas cidades nordestinas. Cadê elas? (melhor que nem existam; a índole das pessoas mudou muito, leitor). Sinto falta das quadrilhas, das (inocentes?) paqueras durante os ensaios.
Tão diferente do imediatismo sem romantismo (rimou!) de hoje. Em breve farão um aplicativo e o pessoal vai dançar com a tela. Vôtes! Melhor falar logo do quentão. Uma bebida tradicional brasileira, particularmente popular nas festas juninas, que tem como missão aquecer o corpo – e o coração – nas noites frias do inverno. Como o nome sugere, servida quente, por isso mesmo mais consumida no sul e sudeste do Brasil.
O quentão tem suas raízes em tradições portuguesas e europeias, a partir do vinho quente (ou “vinho quente com especiarias”) muito comum nas festas de inverno da Europa. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, trouxeram esse costume, que aqui foi adaptado conforme a cultura e os ingredientes locais. O vinho foi substituído por cachaça (mais barata, produzida localmente) e, ao invés de frutas secas, usaram ingredientes como açúcar caramelizado, gengibre, cravo da índia, canela e casca de laranja ou limão. Pode também ser finalizada com maçã (inspirada na sangria espanhola). A receita clássica começa com o açúcar sendo caramelizado com as especiarias e as cascas de frutas. Depois, adiciona-se a cachaça e a água, deixando tudo ferver para que os sabores se misturem. A maçã, quando usada, entra no final, dando um toque frutado e suave ao sabor marcante da bebida. Sem gelo, evidente!
Já o vinho quente, de origem romana – onde era chamado de “conditum paradoxum” – na Europa também conhecido por “mulled wine”, tem receita mais enxuta, geralmente sem gengibre e limão, que não casam bem com a bebida de Baco. Usam sumo de laranja, noz moscada, uvas-passas... as versões são bem variadas. Tem gente que evapora o álcool do vinho para servi-lo também às crianças. E aos abstêmios, que andam por aí. Nesse caso, há versões feitas com suco de uva ou até mesmo com chá de especiarias, mantendo o espírito da bebida, sem teor alcoólico. Na essência, é uma bebida popular, no Brasil, de origem caipira e por isso não encontrada nos meios sociais e restaurantes mais sofisticados. Pena! Mas pelo menos nossa caipirinha – cachaça com limão, nada de vodka, faz favor – é presente nos locais de A a Z.
Restando descobrir se São Pedro tomava quentão. Ou vinho quente. Se um dia eu conseguir acesso à biblioteca do Vaticano, vou pesquisar, amigo. E lhe digo. Mas vinho à temperatura ambiente, ele bebia bem. Com Jesus, inclusive. O que, pra mim, acaba com essa celeuma de vinho fazer mal à saúde. Cristo ia bem usar essa bebida como símbolo do seu sangue se ela fosse nociva... Portanto, tim, tim, brinde à vida.



