[Opinião] Divergir é crime
Durante o período medieval, a Igreja era detentora do poder espiritual e do poder temporal. Assim, “controlava” a fé das pessoas e as opções políticas. Havia um discurso visando justificar o crescimento dos hereges no seio da igreja, em que se responsabilizava as ideias dos filósofos gregos, embora a Patrística e a Escolástica tão bem procuraram unir fé e razão em uma perspectiva platônica e aristotélica respectivamente. Destacando-se Agostinho e Tomás de Aquino. Com o passar do tempo, a igreja criou a chamada Santa Inquisição, que em seu nascedouro visava corrigir os possíveis equívocos doutrinários. Assim diz Umberto Eco em sua obra O Nome da Rosa. Entretanto, mudou de proposta. Bastava divergir do que era defendido pela cúpula religiosa, para ser alcançado pelas penalidades impostas pela inquisição.
A revolução Francesa deixou um legado na história ocidental. Provavelmente, o maior deles seja a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, sendo o mesmo confeccionado pela Assembleia Constituinte francesa, no ano de 1789. O art. 10, diz o seguinte: “Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo as opiniões religiosas desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela Lei”. Acontece que a defesa do Estado laico embora seja legítima, muitos confundem com ateísmo, bastando alguém emitir qualquer opinião que seja antagônica ao que se professa, para virar motivo de ações judiciais. O fato é que muitos se apresentam como paladinos da liberdade, mas só daquela que convém. O artigo 11 do mesmo tratado expressa da seguinte maneira: “A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem; todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos dessa liberdade, nos termos previstos na Lei”. Como abusos da liberdade é algo subjetivo, fica à revelia de quem a interpreta.
O quadro do Brasil atual se assemelha ao período medieval. Divergir é crime e como não mais existe a fogueira, colocam os divergentes no gelo.
Hely Ferreira é cientista político e escreve no Blog da Folha às quintas-feiras.


